Eles sofrem, sim
Já foi o tempo em que apenas a mulher demonstrava que sofria por amor

Algumas situações que já fizeram você passar várias noites em claro, chorando ao ouvir uma música que é pura "sofrência" ou simplesmente devorar uma barra de chocolate atrás da outra estão cada dia mais presentes no universo masculino. Mas você está enganado se pensa que só agora os homens passaram a sofrer por amor. Não é, não. Os especialistas em comportamento humano garantem que eles sempre sofreram quando o amor que sentiam ruía ou não era correspondido. O problema é que eles faziam de tudo para não demonstrar.
A razão era simples. Eles sempre foram massacrados de responsabilidades e estigmas de carregar o mundo nas costas e nem sempre deram conta de sua própria necessidade de amor e paixão. Por muito tempo os homens fingiram não ligar, reduziram o amor a conquistas, a disputas e a objetivos práticos, mas perceberam que isso já não funciona mais assim. E passaram a cantar isso em verso e prosa em todas as línguas: "Tô enrolando na rua/ Bebendo uma por uma/ Madrugada com o vidro fechado/ Chorando com tudo que toca no rádio/ Parei no sinaleiro/ Pra esperar o sinal vermelho/ Três batidas no meu vidro/ Quando vi era um bandido/ Falou, perdeu/ Eu disse, eu perdi mesmo/ Mas foi o grande amor da minha vida/ Só leva o carro e deixa as bebida", passaram a cantar Guilherme e Benuto.
"O sofrimento é o intervalo entre duas felicidades", disse o poeta Vinícius de Moraes. "E esse é o maior dos sofrimentos: não ter por quem sentir saudades, passar pela vida e não viver. O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido...", escreveu o poeta chileno Pablo Neruda.
O sonho do "viveram felizes para sempre" sempre esteve muito associado às mulheres ao longo do tempo, mas a realidade mostra uma outra história: são elas quem mais entram com o pedido de divórcio na Justiça. Segundo o IBGE, a diferença é grande. Os dados mais recentes disponíveis mostram que elas fizeram essa solicitação mais de 13 mil vezes em 2018, enquanto eles foram responsáveis por pouco mais de 5 mil pedidos.
Eles sofrem por amor, sim. "E o fazem de forma amarga, silenciosa e no escuro. Em geral, não demonstram nem reconhecem o sofrimento", afirma o psiquiatria e psicoterapeuta Luiz Cuschnir, coordenador do Gender Group do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e do Centro de Estudos da Identidade do Homem e da Mulher (Iden).
"De uma maneira geral, considera-se que o sexo feminino está mais ligado à questão das emoções tanto por expressar como por vivenciar por conta de um neurotransmissor relacionado ao apego, a ocitocina, encontrado em concentrações entre dez e 30 maiores nas mulheres em situações normais", diz Thiago de Almeida, psicólogo especialista em relacionamentos amorosos. Os homens, quando apaixonados, modificam a regulação interna dos neurotransmissores e hormônios. Há uma redução da testosterona, responsável pela libido, e aumento da ocitocina. E é aí justamente que tudo muda. "É um resultado psicológico provocado por essa alteração fisiológica e hormonal que cada um tem dentro de si", explica Almeida.
Eles sempre sofreram por amor, mas ultimamente aprenderam a demonstrar um pouquinho mais. "Todos sofrem, é inegável. Em algum momento da vida ele vai se apaixonar, vai sofrer as alterações hormonais e neuroquímicas, mas a manifestação desse sofrimento amoroso vai ser determinada tanto pela cultura como por sua própria história de vida. Se ele nasceu em uma família que cultivava essas questões das emoções ao invés de reprimir também vai influenciar", garante Almeida.