Diário da Região
HISTÓRIA DE VIDA

O poder da inclusão

Maria Fernanda nasceu com paralisia cerebral, mas isso não a impediu de viver intensamente, estudar e levar informação sobre inclusão

por Jéssica Reis
Publicado em 19/01/2022 às 19:27Atualizado em 24/01/2022 às 09:25
"O corpo foi feito para se movimentar, quando ele fica parado começa ater perda da massa muscular, então precisa-se do movimento para ter o mínimo de massa muscular para o corpo funcionar perfeitamente",diz Ulisses Berardo, treinador da Maria Fernanda (Guilherme Baffi)
"O corpo foi feito para se movimentar, quando ele fica parado começa ater perda da massa muscular, então precisa-se do movimento para ter o mínimo de massa muscular para o corpo funcionar perfeitamente",diz Ulisses Berardo, treinador da Maria Fernanda (Guilherme Baffi)
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O que você faz para mudar o mundo? Não precisa ser o mundo todo, pode ser o seu bairro, sua cidade? A Maria Fernanda Zavanella, de 38 anos, faz muito. A Fer, como gosta de ser chamada, é formada em Letras e Pedagogia, tem Pós-graduação em Educação Inclusiva, é palestrante e autora de 4 livros. Seu maior sonho: conseguir um trabalho que dê a ela mais autonomia, segurança e independência. Com o apoio da mãe, Sueli Zavanella, a Fer vai alcançar esse e muitos outros sonhos.

Se você está buscando um pouco de inspiração, aqui está: a Fer é a inspiração em pessoa. Determinada e alegre (ela diz que sua marca é a alegria), ela leva informação de qualidade sobre a inclusão por meio de suas redes sociais e do projeto “Incluir Transforma”, em parceria com Renata Sbrogio. Ninguém melhor do que a Fer para falar sobre sua história de vida.

A seguir Maria Fernanda compartilha um pouco sobre sonhos, projetos e desafios num mundo onde a inclusão ainda encontra tanto preconceito e resistência da sociedade em ver a pessoa e não apenas a deficiência.

Quem é a Maria Fernanda?

“A Maria Fernanda é uma mulher muito feliz, muito alegre, a minha marca é a alegria, a determinação, a perseverança, a leveza, a poesia, porque eu também sou escritora. A Maria Fernanda que nasceu com paralisia cerebral, porque nasci de 6 meses e meio em um parto prematuro e a paralisia cerebral comprometeu os membros superiores e inferiores, mas isso não impediu a Maria Fernanda de brincar, de estudar. Sou escritora com 4 livros publicados. Não impediu a Maria Fernanda de fazer duas faculdades de Letras, Pedagogia, Pós-Graduação em Educação Inclusiva e ser palestrante. Minha deficiência não me impediu em nada. A barreira está onde a gente coloca, essa é a Maria Fernanda. Maria Fernanda que gosta de ser chamada de Fer, que eu acho mais informal. E que teve o apoio de uma mãe maravilhosa, que acredita em mim.”

O dia a dia da Fer

“Meu dia a dia é muito satisfatório. Eu sou uma pessoa que gosta de acordar e fazer as coisas. Eu cuido do meu projeto que é o 'Inclusão Transforma'. À tarde eu tenho terapia com a psicóloga, 3 vezes por semana eu faço exercício na academia (boxe, funcional), faço uma consulta com uma coach, adoro ler, adoro ser feliz. Esse é o meu dia a dia. E, principalmente, também correr atrás de trabalho, a pessoa com deficiência ela encontra muita barreira no mercado de trabalho. Então, eu estou em busca de trabalho, para poder ter uma autonomia e independência ainda maior.”

Desafios na vida

“O grande desafio que nós temos, tanto eu quanto qualquer pessoa com deficiência, é desmistificar a deficiência. Todo mundo acha que a deficiência é algo que já é categorizado. A deficiência não categoriza nada. A deficiência é apenas uma característica, assim como o loiro, o ruivo, é apenas uma característica, não é o que determina. O branco, o preto, e o meu grande desafio no momento é no mercado de trabalho porque as pessoas querem aquela pessoa que tem menos deficiência possível, um dedinho quebrado, por exemplo. Então, eu vou em algum lugar, na entrevista de emprego e falam ‘não posso te contratar porque não tem elevador, não posso te contratar porque você tem um pouco de dificuldade na fala’, então barreiras que as pessoas colocam para a pessoa com deficiência.

Então, o maior desafio está em abrir a inclusão para essa cidade que não é inclusiva no mercado de trabalho. Conseguir um trabalho que realmente me dê autonomia e que me dê uma segurança, ter a minha independência. Todo mundo quer comprar, sair, quer namorar, casar e o deficiente não é diferente de outra pessoa. A inclusão só vai ser feita quando se naturalizar a pessoa com deficiência na escola, na faculdade, no mercado de trabalho, no boxe. Quando a gente encontrar o deficiente em todos as áreas da sociedade e não excluído dentro de casa ou fazendo apenas suas terapias, isso que é a grande dificuldade, abrir e quebrar essas barreiras.

Porque na verdade isso não é nem barreira, é a barreira que a sociedade coloca, mas a barreira está onde você coloca, se você tira a barreira, se você dá acesso para o cego andar tranquilamente, sem ter perigo de cair. Se você constrói rampa, para a pessoa entrar tranquilamente e fazer um trabalho humano e cooperativo com qualquer empresa você tira a barreira da pessoa com deficiência. Então a barreira está onde a sociedade coloca, onde você coloca.”

O que é inclusão para você?

“A minha missão aqui não é fazer uma inclusão para mim, é fazer uma inclusão para todos, então para a escola ser mais inclusiva, as faculdades, a sociedade ser mais inclusiva. É a inclusão de todos, para todos e com todos. A inclusão é muito mais do que rampa, a inclusão tem que ter a conscientização e atitude. Eu falo que a gente tem que mexer com 3 coisas na inclusão: conscientização, conhecimento e atitude. Conscientizar para mostrar o quanto a inclusão é importante, todo mundo ganha, todo mundo se beneficia. Conhecimento mostrando para as pessoas como é que se faz a inclusão. E atitude para poder colocar em prática. Não adianta nada ficar falando e não colocar a inclusão em prática.

A inclusão para mim é de todos, das crianças, dos negros, todos terem acesso a sociedade e a tudo o que todo mundo precisa. A barreira maior está dentro da gente, ela não está fora. Eu não diria nem que é preconceito, eu diria que é falta de conhecimento mesmo, de não saber fazer a inclusão. E a inclusão é você aprender a lidar com a diversidade e chamar todo mundo para fazer parte, chamar todo mundo para dançar. Inclusão é tudo de bom!”

Projeto ‘Inclusão transforma’

“Eu tenho junto com a Renata Sbrogio um projeto de inclusão que chama ‘Inclusão Transforma’, que dá assessoria para empresas, escolas sobre como incluir o deficiente, seja na escola, onde ele precisar. A gente dá assessoria, palestras. Dentro desse projeto a gente tem o curso da inclusão ‘da teria a prática’, que ensina, conta um pouco da história da inclusão, porque a gente não sabe o que é inclusão, não sabe o básico. Então nosso projeto é ensinar as pessoas como incluir o deficiente na sociedade, na escola, no mercado de trabalho. Como lidar com ele, seja com a pessoa com Síndrome de Down, seja a pessoa cega, qualquer deficiência. Como incluir essa pessoa nas várias áreas da sociedade, porque a pessoa com deficiência deve estar onde ela quiser estar, tem que estar incluída.

Outra coisa muito importante, a gente faz essa distinção de pessoa com deficiência e pessoa sem deficiência, então em primeiro lugar nós somos pessoas. Porque o PCD, o 'p' vem antes do 'd', então, primeiro de tudo nós somos pessoas. Esse curso que está dentro do projeto ‘Inclusão transforma’ é para inclusão da pessoa com deficiência. Vai ensinar as professoras, as empresas, qualquer pessoa que quer saber sobre inclusão, esse curso é muito bom porque ensina como incluir, nós falamos sobre a teoria da inclusão e a inclusão em prática, porque a inclusão na teoria só fica no papel. A gente tem que fazer uma inclusão que transforma e ter uma inclusão na prática. Por isso que o projeto chama 'Inclusão Transforma’ e chama ‘ABC da inclusão’ o curso, porque ensina passo a passo como incluir a pessoa com deficiência no convívio social.”

Sonho de vida

“Meu sonho é poder levar esse projeto ‘Inclusão Transforma’ para o Brasil inteiro, porque ele é on-line, então dá para acessar no mundo inteiro. Ter oportunidade no mercado de trabalho para poder trabalhar de fato e agora meu sonho, com certeza, também é ver todo mundo numa sociedade mais inclusiva, menos preconceituosa, e que tenha mais acolhimento e um torcer pelo outro. A gente já vive num mundo agressivo, de tantos conflitos que você não pode ter opinião divergente porque já é excluído, você já é cancelado das redes sociais. Não existe uma única verdade, existem várias verdades. O que existem são vários pontos de vista e isso é inclusão. Então é uma sociedade mais inclusiva, mais plural, em que cada um tem a sua opinião, mas que cada um se respeita na opinião que tem, na opinião do outro, uma sociedade para todos, sem distinção.”

Saiba mais

Curso ABC da Inclusão - Da teoria à prática

De 14 de fevereiro a 14 de março

Inscrições: inclusaotransforma.com.br

 

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@inclusaotransforma