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Deputados 'despejam' R$ 192 milhões do orçamento secreto na região de Rio Preto

Levantamento do Diário com base em dados encaminhados ao Supremo Tribunal Federal revela que 17 parlamentares destinaram recursos por emenda de relator, criticada por falta de transparência

por Guilherme Ramos, Vinícius Marques e Maria Elena Covre
Publicado em 18/06/2022 às 20:07Atualizado em 19/06/2022 às 07:56
Fachada do Congresso Nacional, em Brasília (Luis Macedo / Câmara dos Deputados)
Fachada do Congresso Nacional, em Brasília (Luis Macedo / Câmara dos Deputados)
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Deputados federais destinaram R$ 192,2 milhões por meio de emendas de relator (RP-9), o chamado orçamento secreto, para cidades da região de Rio Preto. Esse modelo foi instituído em 2019 para valer no orçamento do ano seguinte do governo federal do presidente Jair Bolsonaro (PL).

A indicação das emendas de relator é alvo de questionamentos no Supremo Tribunal Federal (STF), que cobra maior transparência do Congresso Nacional sobre o recursos. Os dados são referentes a emendas de 2020 e de 2021, que somaram R$ 36 bilhões nesse período. Para 2022, o valor previsto é de R$ 16 bilhões. Deputados de oposição afirmam que a estratégia é uma forma de o presidente garantir apoio de parlamentares para propostas de interesse do governo.

Levantamento do Diário sobre dados encaminhados ao STF revela que 17 deputados fizeram uso do questionado expediente para destinar recursos para prefeituras da região de Rio Preto. A maioria dos recursos é destinada à saúde. Ainda há indicação para obras de pavimentação, aquisição de máquinas agrícolas, compra de ambulâncias, instalação de academias de ginástica ou iluminação pública.

Mesmo nos dados encaminhados ao STF existem indicações com termos genéricos, como as que mencionam portarias do Ministério da Saúde que visam garantir recursos a municípios. Não há dados disponíveis de indicações deste ano.

Deputados do PL, sigla do presidente Bolsonaro, são os que mais indicaram valores para prefeituras daqui. E o campeão dessas emendas de relator é o deputado federal Capitão Augusto, vice-presidente nacional do PL. Ele totaliza R$ 134,1 milhões em indicações para a região. Em seguida está o deputado federal Marcos Pereira, aliado de Bolsonaro e presidente nacional do Republicanos, com R$ 27,4 milhões. Terceiro com maior número de recursos indicados é o parlamentar olimpiense Geninho Zuliani (União Brasil), com R$ 9,4 milhões.

Quadro regional

Geninho Zuliani indicou, valendo-se do expediente do orçamento secreto, R$ 9,4 milhões de emendas de relator para cidades da região. A lista inclui recursos, por exemplo, para Fernandópolis (R$ 502 mil), Novo Horizonte (R$ 407,6 mil), e Tabapuã (R$ 301 mil). Nesses casos, os recursos foram vinculados ao Ministério da Saúde. O valor de Geninho é ainda maior e chega a R$ 15 milhões, contabilizando cidades que não são da região como Santo André e Adamantina.

Outro parlamentar da região, o deputado federal Luiz Carlos Motta (PL) apresentou R$ 1,4 milhão de emendas do orçamento secreto para 13 cidades da área de influência de Rio Preto. A relação inclui recursos para as prefeituras de José Bonifácio (R$ 250 mil), Ubarana (R$ 250 mil) e Catiguá (R$ 250 mil). Considerando todos os municípios do Estado de São Paulo, o total de emendas de Motta chega a R$ 6 milhões a serem gastos com infraestrutura urbana dos municípios, saúde e recursos para a educação.

Não há na relação pesquisada nas ações do Supremo indicações de emendas de relator de Fausto Pinato (PP), também da região. Questionado pela reportagem, o parlamentar não respondeu se fez indicações por meio desse tipo de emenda. Outro parlamentar da região, Eleuses Paiva (PSD), tomou posse neste ano e não aparece nas indicações que estão no Supremo.

Cidades que mais receberam indicações

Barretos  R$ 50,4 milhões

Fernandópolis R$ 12 milhões

Jales R$ 9,4 milhões

Rio Preto R$ 7,8 milhões

Jaci R$ 3,6 milhões

Novo Horizonte R$ 3,3 milhões

Santa Rita d’Oeste R$ 3,3 milhões

Pindorama R$ 3,3 milhões

Nhandeara R$ 3,2 milhões

José Bonifácio R$ 2,8 milhões

Deputados citam critérios técnicos

Deputados da região de Rio Preto dizem que as indicações atendem à lei em vigor e que utilizam critérios técnicos. Também negam acordo com o governo federal para votar mediante liberação de recursos.

“A possibilidade do uso das emendas como relator existe e é válida para todos os deputados, tendo como objetivo justamente auxiliar os municípios. Esclarecemos que as indicações de emendas para municípios paulistas, totalizando R$ 9,4 milhões, foram feitas mediante critérios seletivos visando impacto social e econômico, bem como o desenvolvimento das cidades", afirmou Geninho. “Vale ressaltar que não existe acordo para indicações ou liberações de emendas, muito menos em relação à votação. Cada voto é único e pessoal, de acordo com as convicções de cada parlamentar e orientações de seu partido”, disse o deputado do União Brasil.

Luiz Carlos Motta informou que a utilização de emendas RP9 segue a legislação vigente no País. “As emendas são destinadas para as cidades do Estado de São Paulo, beneficiando milhares de pessoas. Não há qualquer tipo de acordo para a liberação das emendas. Elas são definidas de acordo com as necessidades de cada município”, afirmou o parlamentar.

O Diário entrou em contato com o gabinete dos demais parlamentares, mas não obteve retorno.

Cidades

O levantamento mostra que Barretos foi a cidade que mais recebeu indicações de emendas de relator, um total de R$ 50,4 milhões. Fernandópolis é segunda cidade com maior volume de recursos desse tipo, totalizando R$ 12 milhões. 

Rio Preto

Para Rio Preto, as indicações dos deputados somam R$ 7,8 milhões. Segundo dados entregues ao Congresso pelo Supremo, o deputado federal Marcos Pereira totaliza R$ 4 milhões desse tipo de recurso, sendo R$ 3 milhões via Ministério da Saúde. Em outro caso, o deputado Capitão Augusto destinou R$ 668,5 mil para compra de máquinas agrícolas. Já Eduardo Bolsonaro destinou R$ 600 mil para a saúde. Geninho indicou R$ 200 mil ao Fundo Municipal de Assistência Social.

Veja os deputados que indicaram emendas do orçamento secreto para a região de Rio Preto

Veja o ranking de deputados que indicaram emendas do orçamento secreto para a região de Rio Preto

Capitão Augusto (PL)  -  R$ 134.173.586,03

Marcos Pereira (Republicanos)  -  R$ 27.472.650,00

Geninho Zuliani (UNIAO Brasil _SP)  -  R$ 9.490.566,96

General Peternelli (UNIAO_SP)  -  R$ 5.087.016,94

Carla Zambeli (PL)  -  R$ 3.210.000,00

Paulo Pereira da Silva (Solidariedade)  -  R$ 2.841.996,00

Edusardo Bolsonaro (PL)  -  R$ 2.600.000,00

Paulo Freire Costa (PL)  -  R$ 1.810.500,68

Luiz Carlos Motta (PL)  -  R$ 1.440.000,00

Luiz Philipe de Orleans e Bragança (PL)  -  R$ 937.256,00

Ricardo Izar (Republicanos)  -  R$ 875.000,00

Guiga Peixto (PSC_S)  -  PR$ 550.000,00

Marco Feliciano (PL)  -  R$ 500.000,00

Gilberto Nascimento (PSC)  -  R$ 400.000,00

Roberto Alves (Republicanos)  -  R$ 340.000,00

Celso Russomano (Republicanos)  -  R$ 300.000,00

Vanderlei Macris (PSDB)  -  R$ 191.000,00

TOTAL GERAL  -  R$ 192.219.572,61

Entenda o orçamento secreto

O que é

Em 2019, o então relator do Orçamento de 2020, o deputado Domingos Neto (PSD-CE) criou um novo tipo de emenda, chamado de emenda de relator-geral. Esta nova modalidade passou a ser identificada com o marcador de resultado primário (RP-9). A falta de transparência na aplicação de seus recursos e critérios de liberação foram questionados pela oposição no Supremo Tribunal Federal.

Ao contrário das emendas de relator (RP-9), os demais tipos de emendas são distribuídos de forma igual entre todos os parlamentares. As emendas de relator (RP-9) são distribuídas conforme a conveniência política do governo, que determina quanto cada parlamentar terá direito. A indicação do destino do dinheiro é feita pelos congressistas de modo informal.

Maior partido com emendas

O Partido Liberal (PL) se tornou a nova casa de Jair Bolsonaro e foi a agremiação dentre os 12 partidos do chamado ‘Centrão’ com o maior volume de indicações na região.

Supremo

Em novembro do ano passado, o STF suspendeu os repasses parlamentares feitos por meio de emendas de relator. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chegou a dizer que seria "inexequível" listar os parlamentares que solicitaram recursos. Posteriormente, o repasse foi autorizado e o Congresso tem informado ao Supremo mais detalhes sobre as indicações. Os recursos são usados para custear obras e políticas públicas aumentando capital político de quem faz a indicação

Fonte: Reportagem, Câmara dos Deputados, Portal Siga-Brasil e Senado e Agência Estado