Diário da Região

Em novo julgamento, TJ barra lei que obriga Bíblias em bibliotecas

Lei de Rio Preto que está em vigor desde 2004 havia sido declarada inconstitucional no ano passado; gestão do Coronel Fábio Candido entrou com novo recurso em maio deste ano para julgamento de 'retratação', mas não obteve sucesso

por Vinícius Marques
Publicado em 08/08/2025 às 22:20Atualizado em 09/08/2025 às 01:31
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Dois julgamentos no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e duas vezes considerada inconstitucional. Foi o que ocorreu com a lei de Rio Preto, em vigor desde 2004, que obriga nos acervos das bibliotecas públicas da cidade, sobretudo a Biblioteca Municipal, exemplares da Bíblia Sagrada.

A lei, considera inconstitucional no ano pelo TJ-SP, passou por um novo julgamento na última quarta-feira, 6, na mesma corte. Vinte e três desembargadores do Órgão Especial do TJ analisaram pedido feito pelo governo do coronel Fábio Candido (PL), por meio da Procuradoria-Geral do Município, que solicitou um juízo de retratação, que poderia mudar o entendimento do tribunal quanto à legalidade da norma.

No entanto, não foi o que ocorreu. O TJ manteve a decisão que declarou a lei inconstitucional.

Representação

A lei, aprovada na Câmara de Rio Preto em abril de 2004, foi sancionada pelo então prefeito Edinho Araújo (MDB). No ano passado, a regra teve legalidade questionada em ação da Procuradoria-Geral de Justiça, que recebeu uma representação colocando em xeque a legalidade da lei rio-pretense.

De acordo com o MP, "não compete ao Poder Legislativo municipal criar preferência por determinada religião – como o faz pela exigência da disponibilização de exemplares de Bíblia Sagrada nos acervos e Bibliotecas mantidos pelo Poder Público Municipal", apontou o MP.

Segundo a Procuradoria, a medida acaba "alijando outras crenças presentes tradicionalmente no tecido social brasileiro, justamente à vista da laicidade do Estado brasileiro". A Câmara de Rio Preto também defendeu a legalidade da norma.
Em outubro do ano passado, desembargadores do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou a lei inconstitucional. Na época, a Prefeitura recorreu para que o processo fosse levado ao Supremo Tribunal Federal, o que foi negado pelo tribunal.

Tema

No pedido apresentado em maio pela Prefeitura, o município solicitou que o caso fosse analisado novamente com base em decisão de fevereiro do Supremo Tribunal Federal , que autoriza a possibilidade de presença de símbolos religiosos em órgãos públicos.

O relator do novo julgamento, desembargador Álvaro Torres Júnior, apontou que não seria o caso de alterar a decisão anterior de que a lei de Rio Preto é inconstitucional. O magistrado incluiu, ainda, em seu voto, diferentes decisões que envolvem o tema, como lei de Sorocaba, também declarada inconstitucional.

O desembargador mencionou outra decisão sobre o tema. "É certo que a presença facultativa das Bíblias nas bibliotecas municipais não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade, tal como assentado no precedente do Supremo Tribunal Federal, mas a obrigatoriedade da sua presença, sim", consta no voto do relator.

Diferente

No final, o desembargador aponta a distinção entre o que fora decidido pelo STF e a pretensão do município. "Assim, a tese fixada no Tema nº 1086 (possibilidade de presença de símbolos religiosos em órgãos públicos) difere daquela que é objeto desta ação (obrigatoriedade de disponibilização de Bíblias em acervos e bibliotecas), não sendo, pois, o caso de retratação deste órgão julgador."

PGM avalia recurso

A Procuradoria-Geral do Município informou, nesta sexta-feira, 8, que "que vai analisar o teor da decisão para avaliar a possibilidade de recurso" quanto à inconstitucionalidade da lei que obriga exemplares de Bíblias nas bibliotecas públicas de Rio Preto.

No documento, apresentado recentemente, que ensejou o novo julgamento no tribunal, a Prefeitura voltou a defender a legalidade da lei municipal.

"A disponibilização de exemplares da Bíblia Sagrada em bibliotecas públicas municipais não configura ofensa à laicidade estatal, uma vez que a Bíblia é um livro que possui valor histórico e cultural, além de religioso, e sua presença em bibliotecas públicas permite o acesso à cultura e à informação, sem impor qualquer tipo de discriminação ou proselitismo religioso", argumentou.
Outras

Outra lei que prevê Bíblia em bibliotecas de Rio Preto também foi declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça no ano passado. Neste caso, a norma, de 2009, aprovada na Câmara, estabeleceu obrigatoriedade os exemplares em Braile nas bibliotecas públicas. A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral de Justiça também a partir de uma representação encaminhada ao MP.

Em outra situação recente, de teor semelhante, o Tribunal de Justiça suspendeu, em abril, lei de Rio Preto que obriga a oração do Pai Nosso uma vez por semana nas escolas. A norma, de autoria do presidente da Câmara, Luciano Julião (PL), foi questionada em ação da Atem (sindicato dos trabalhadores em educação).