Coronel diz que Marcondes 'presta um bom serviço' e segue secretário mesmo indiciado por injúria racial
A Polícia Civil de Rio Preto indiciou o vice-prefeito e secretário de Obras pelo crime de injúria racial contra um segurança do Palmeiras; caso foi após jogo em Mirassol, pelo Campeonato Paulista, no dia 23 de fevereiro

O prefeito de Rio Preto, Coronel Fábio Candido (PL), vai bancar seu vice, Fábio Marcondes (PL), no comando da Secretaria de Obras do município mesmo após ele ser indiciado pela Polícia Civil por injúria racial.
Em entrevista coletiva à imprensa na tarde desta quinta-feira, 31, pouco mais de uma hora após a decisão do indiciamento se tornar pública, o prefeito declarou que “ele (Marcondes) continua tralhando”.
“A gente tem conhecimento dessa apuração por parte da Polícia Civil. Ele (Marcondes) está prestando um bom serviço como vice-prefeito e secretário de Obras e dará continuidade aos trabalhos aqui, mesmo porque tem todo um caminhar de investigação ainda que tem de ser seguido”, afirmou Coronel.
“Portanto”, ainda segundo o prefeito, “não há mudança de posicionamento da Prefeitura por conta desse fato, que é um fato particular do vice-prefeito e secretário de Obras.”
A Polícia Civil de Rio Preto indiciou Marcondes pelo crime de injúria racial contra um segurança do Palmeiras, cometido após jogo em Mirassol, pelo Campeonato Paulista, no dia 23 de fevereiro.
O despacho, publicado no início da tarde desta quinta-feira, 31, foi assinado pelo delegado Renato Camacho, da Delegacia Seccional de Rio Preto.
Para Euro Bento Maciel Filho, advogado sócio do escritório Euro Filho e Tyles e um dos defensores de Adilson Antonio de Oliveira, “graças ao excelente trabalho desenvolvido pela Polícia Civil, as investigações confirmaram o que todos já sabiam, ou seja, que Adilson foi racialmente ofendido pelo vice-prefeito de São José do Rio Preto, que o chamou de “macaco velho” no dia dos fatos. Agora, com a conclusão do Inquérito, espero que o MPSP analise o caso com a seriedade de praxe e, então, ofereça denúncia em face do agressor”.
O caso
Marcondes virou alvo da Polícia por supostamente ter chamado o segurança de “macaco véio” durante tumulto após o jogo. Laudos periciais do instituto de criminalística atestaram que ele disse “paka vea” e não “macaco veo”. Por sua vez, laudos contratados pelo segurança insistem que o termo usado foi “macaco veio”.
Com base em vídeo da TV TEM, a suposta agressão verbal do vice-prefeito de Rio Preto ao segurança, que é negro, provocou escândalo nacional.
À época, sentindo-se incomodado pelo fato de o escândalo respingar na imagem do governo, Coronel Fábio afastou Marcondes da Secretaria de Obras por um mês. O vice voltou ao posto depois que o assunto perdeu tração, em especial, nas redes sociais.
Confira abaixo íntegra do texto divulgado pelo advogado de Fábio Marcondes, Edlênio Xavier Barreto
“A defesa de Fábio Ferreira Dias Marcondes manifesta-se com extrema preocupação diante do recente indiciamento promovido pela autoridade policial, que se ampara exclusivamente em relatório produzido por ferramentas de inteligência artificial externas (Gemini e Perplexity), não homologadas como meio pericial, elaborado no mesmo dia de sua própria requisição, assim como o relatório que levou ao indiciamento.
Importa destacar que foi o próprio delegado de polícia quem, por duas vezes, requisitou perícia oficial ao Instituto de Criminalística, apresentando quesitos técnicos detalhados. Ambas as perícias oficiais, elaboradas por órgão imparcial e tecnicamente habilitado, concluíram de forma categórica que a palavra 'macaco' não foi pronunciada pelo investigado. Como tais conclusões não atenderam à convicção pessoal do delegado, optou-se por substituir a análise oficial por um relatório de inteligência artificial não validada, prática que causa perplexidade e preocupa quanto ao respeito ao devido processo legal.
O uso de soluções automatizadas para formar juízo sobre fatos gravíssimos — sem validação técnica oficial, sem controle de parâmetros e sem contraditório — traz à memória a recente notícia de que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu procedimento para investigar um magistrado que utilizou uma tese inventada pelo ChatGPT em decisão judicial (Conjur, 12/11/2023). Se a utilização de inteligência artificial não verificada preocupa quando adotada por magistrados, com ainda mais razão causa estranhamento quando serve de fundamento para imputação criminal de injúria racial.
Desde o início da investigação, ficou evidente que a narrativa original da suposta vítima sofreu alterações significativas ao longo do tempo: o Boletim de Ocorrência registrava uma expressão diversa daquela posteriormente atribuída ao investigado, enquanto testemunhas ligadas à própria vítima passaram a mencionar outro termo apenas após a ampla divulgação de um vídeo com legendas sugestivas. Essa inconsistência foi confirmada pela colheita de depoimentos: nenhuma das 11 testemunhas presenciais e imparciais — incluindo policiais militares, profissionais de imprensa e testemunhas independentes — confirmou a existência de ofensa de cunho racial.
A defesa reafirma que Fábio Marcondes já prestou todos os esclarecimentos necessários e nega categoricamente ter proferido qualquer expressão de cunho racial. O ato de indiciamento, assim fundamentado, suscita séria preocupação quanto ao respeito ao devido processo legal e à necessária imparcialidade que deve orientar qualquer persecução penal.
A legalidade, a técnica e o devido processo legal não são opções: são obrigações."
(Colaboraram Marco Antonio dos Santos e Maria Elena Covre)