Higa, o repórter
O noroeste paulista – cercado pelas represas formadas pelas hidrelétricas implantadas nos rios Paraná, Grande e Tietê – também deve ao correspondente do ‘Estadão’ o slogan poético que adotou ainda nos anos 70: Região dos Grandes Lagos

Faz tempo que não tenho notícias a respeito do melhor, mais produtivo, mais rápido e mais preciso jornalista que eu conheci – Antonio Higa, repórter mesmo, daqueles que se embrenhavam na captura de uma informação e dela não desistiam antes de obtê-la. Como repórter do “Diário da Região” e de “A Notícia”, nos anos 1960 a 1980 e, principalmente, como correspondente de “O Estado de São Paulo”, de 1963 ao ano 2000, Higa foi uma das pessoas que mais influenciaram o universo político-administrativo de toda a região.
O município de Rubinéia, por exemplo, deve em boa parte a ele o fato de não ter sido simplesmente riscado do mapa, quando a formação do lago da hidrelétrica de Ilha Solteira condenou dois terços de seu território à submersão nas águas do Paranazão – aí incluída toda a área urbana e a maior parte de suas terras cultiváveis. Desde que a Cesp começou, em 1969, a desapropriar e demolir as casas e os estabelecimentos comerciais da cidade, Higa começou a registrar no “Estadão” os clamores da população e, em 1973, quando as águas começaram a encobrir as ruínas, já havia uma nova Rubinéia, erguida em área próxima. A cidade fora poupada da morte por afogamento, uma vitória dos líderes locais, como Alcides Silva, Rubens Messaro e Osmar Novaes, um desfecho feliz para as dezenas de escritores e poetas com cujos nomes Rubineia batizara suas ruas e praças, a comprovação da influência de um jornalista que, a muito custo, concordou em sair do anonimato para receber o título de Cidadão Honorário Rubineiense.
Me lembro que estive lá, acompanhando-o na merecida homenagem e pude testemunhar o sacrifício incalculável dele para romper a barreira de uma timidez doentia e aparecer sob os holofotes para receber os aplausos e os agradecimentos dos cidadãos que abarrotavam o acanhado plenário da Câmara Municipal.
O noroeste paulista – cercado pelas represas formadas pelas hidrelétricas implantadas nos rios Paraná, Grande e Tietê – também deve ao correspondente do “Estadão” o slogan poético que adotou ainda nos anos 70: Região dos Grandes Lagos.
Como repórter dos jornais e emissoras locais, Higa sempre foi um incômodo azougue para boa parte dos políticos rio-pretenses, entre eles os ex-prefeitos Lotf Bassitt e Adail Vettorazzo. Lotf costumava realizar com seus assessores e aliados reuniões secretíssimas para tratar de estratégias confidenciais e, no dia seguinte, ao receber o jornal, dava de cara com todos os segredos tornados públicos com riqueza de detalhes e minúcias.
Soube-se, muito tempo depois, que o autor da proeza era o Higa, que espionava tais encontros ora escondido num dos elevadores privativos que serviam o gabinete do prefeito, ora escamoteado entre as árvores da Chácara do Maquininha, onde algumas dessas reuniões avançavam noite a dentro. Nos anos 1970, serviu-se de um alter ego – Ariel de Deus – para fustigar os políticos com informações apimentadas que os irritavam e os levavam a processos judiciais contra o jornal.
Soube, pelo Laércio Sparapai, que Higa está mais sossegado. Aposentou-se, recolheu-se ao anonimato. Mas continua sendo uma figura imprescindível…
JOSÉ LUÍS REY, Jornalista em Rio Preto. Escreve quinzenalmente neste espaço aos domingos