Barulho e velocidade
O James Bond da década de 1960 mataria o 007 atual de tédio. Você assiste a um filme de super-herói e não tem tempo nem de respirar. Assistir a um faroeste do John Wayne faria uma plateia de jovens dormir

Sempre gostei de cinema. Frequento desde criança. Eu ia todos os domingos na matinê do Cine Capri (Andradina). Além disso, sempre vi tudo o que passa na TV. Tenho percebido um fenômeno. Os filmes atuais estão mais rápidos. Tudo é frenético, barulhento, impactante, cheio de efeitos especiais. O James Bond da década de 1960 mataria o 007 atual de tédio. Você assiste a um filme de super-herói e não tem tempo nem de respirar. Assistir a um faroeste do John Wayne faria uma plateia de jovens dormir.
Embora não detenha o conhecimento técnico a respeito, tenho a impressão de que as músicas estão mais rápidas. Percebo isso quando comparo os sambas-enredo antigos e os atuais. Dizem que se a melodia for lenta, o pessoal samba mais devagar e estoura o tempo de desfile no sambódromo. Tenho a impressão de que se estivessem vivas, cantoras como Dalva de Oliveira, Maysa e Nara Leão teriam sérias dificuldades para vender algum disco. Têm artistas que gritam, não cantam. O conjunto faz tanto barulho que quase não dá para ouvir a voz do cantor. A coisa mais difícil do mundo é tentar cantar a música.
Assisti recentemente a um especial sobre copas do mundo de futebol. Quase dormi durante as reprises dos jogos da Copa de 1970. Dizem que há 20 anos, um jogador de futebol comum corria seis quilômetros por partida. Hoje são onze quilômetros, quase o dobro. O jogo é mais “pegado”. Não existem mais espaços para dribles e jogadas de efeito. Se o jogador parar em campo com a bola, “vão chegar junto”.
As brincadeiras de criança mudaram. Antes era quase tudo na rua. Bola de capotão, bola de gude ou birosca, peão, pipa ou papagaio. Usávamos dois neurônios para brincar. Hoje, os jogos eletrônicos estão nos videogames, nos computadores e até no celular. Barulhentos, cheios de luzes e sons. São necessários reflexos rápidos, agilidade nos dedos. Difícil até de assistir e entender.
Citei os exemplos acima para dizer que tudo sugere urgência. Dá a impressão de que o tempo encurtou e está passando mais rápido. Conduzimos nossas vidas de uma forma cada vez mais acelerada. O volume de informações e estímulos que recebemos em uma semana é mais do que receberíamos na década de 1960 inteira.
O constante bombardeio de estímulos visuais e auditivos captam a nossa atenção e a desfocam do tempo. Muita tecnologia prejudica a nossa relação com o tempo e interfere em diversos aspectos de nossas vidas. Mas o inimigo não é a tecnologia. Somos nós mesmos, quando não conseguimos ter um equilíbrio entre o tempo que ficamos conectados e o que passamos longe das telas. Por isso, estamos sempre correndo, tendo ou não motivos para isso.
Para quê tanta pressa? Corremos o risco de correr muito e deixarmos nossas almas para trás. Velozes e furiosos? Não! Lento e calmo por favor…
Toufic Anbar Neto, Médico cirurgião, diretor da Faceres, escritor e membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura (Arlec). Escreve quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras.