Diário da Região
EDITORIAL

Não nos calaremos

Um comandante policial que se sente no direito de atacar jornalistas por exercerem seu ofício está confundindo autoridade com autoritarismo, e isso não será tolerado

por Da Redação
Publicado em 30/04/2025 às 01:11Atualizado em 30/04/2025 às 10:19
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Em pleno século 21, em um Estado Democrático de Direito, é absolutamente inaceitável que um agente público armado, ocupando posto de comando em uma força policial, utilize a tribuna da Câmara Municipal - a Casa do Povo - para proferir ameaças diretas a um jornal e a uma jornalista. Mas foi exatamente isso que fez o tenente-coronel José Thomaz Costa Júnior, comandante do 9º Baep, ao declarar seu “repúdio” ao Diário da Região e à “repórter irresponsável” que “irá pagar por isso”, segundo suas próprias palavras, na sessão da Câmara de Rio Preto no dia 22 de abril.

No último dia 15, o perfil do 9º Baep divulgou um vídeo de 17 segundos, com uma simbologia perturbadora que incluía uma cruz em chamas, policiais perfilados, viaturas com sirenes ligadas e uma fumaça vermelha cortando o ar. A publicação foi apagada horas depois.

A repercussão, negativa e imediata, não surgiu por acaso. Especialistas em segurança pública, entidades de direitos humanos e o próprio Conselho Nacional de Direitos Humanos identificaram no vídeo semelhanças inegáveis com rituais da Ku Klux Klan, grupo supremacista que promoveu terror e violência racial nos Estados Unidos. Tanto é que o material foi encaminhado para investigação pelo Ministério Público, pela Ouvidoria da PM e até à Organização das Nações Unidas (ONU).

Ao invés de assumir a responsabilidade institucional pelo conteúdo com toques macabros, o tenente-coronel Costa Júnior preferiu mirar suas armas verbais contra quem noticiou os fatos, atacando os mensageiros. Na tribuna da Câmara, criticou o “quadro” de profissionais deste jornal, como se sua farda lhe conferisse a autoridade de julgar a imprensa.

Melhor faria se voltasse sua preocupação ao quadro do próprio batalhão, que julgou adequado encenar uma queima de cruzes, em um ritual que qualquer cidadão minimamente informado reconheceria como de péssimo gosto - e de possíveis implicações ideológicas gravíssimas. O tenente-coronel, que deveria zelar pela conduta de seus subordinados, demonstra mais preocupação em perseguir jornalistas do que em responder por um ato que mancha a imagem de uma instituição de 193 anos, que muito tem contribuído com a proteção da sociedade paulista.

A fala, repleta de termos como “militância política”, “narrativa falaciosa” e “irresponsabilidade”, destila uma tentativa de intimidação e cerceamento da liberdade de imprensa que remete aos tempos mais sombrios da ditadura militar. O Brasil, vale lembrar ao tenente-coronel, virou essa página há mais de 40 anos. A liberdade de expressão e o livre exercício da imprensa não são concessões do poder público - são garantias constitucionais.

A jornalista atacada apenas fez seu trabalho: relatou fatos. Os mesmos fatos reportados por veículos de peso nacional como Estadão, G1, UOL, CNN, R7, SBT News, Metrópoles e Ponte Jornalismo. Mas o tenente-coronel preferiu mirar seus ataques apenas no Diário da Região, jornal que há mais de sete décadas se mantém firme no compromisso com a informação e com a sociedade rio-pretense. Por que, então, direcionar suas ameaças apenas ao Diário? A resposta é óbvia: trata-se de uma tentativa de coagir jornalistas locais e tentar calar justamente quem está mais próximo, mais atento e mais comprometido com a comunidade local.

A retórica do tenente-coronel, digna dos tempos sombrios da ditadura, quando censores decidiam o que a imprensa poderia ou não publicar, revela um desprezo perigoso pela liberdade de expressão. É igualmente repugnante a atuação dos vereadores rio-pretenses, que apoiaram moção de “apoio” ao Baep, possivelmente endossando até mesmo a queima de cruzes (exceção feita a João Paulo Rillo, Pedro Roberto e Renato Pupo). A ignorância histórica - ou má-fé - sobre o significado de liberdade de expressão e os símbolos do ódio racial envergonha o Legislativo e mostra o despreparo moral e democrático da maioria esmagadora dos parlamentares, que endossaram o discurso ameaçador do tenente-coronel e são condescendentes com a escalada autoritária.

Uma democracia não se sustenta sem imprensa livre. Um comandante policial que se sente no direito de atacar jornalistas por exercerem seu ofício está perigosamente confundindo autoridade com autoritarismo. Está tentando intimidar, silenciar e constranger. E não será tolerado.

Este jornal não se curvará a ameaças. O Diário da Região reitera seu compromisso inabalável com a verdade, com os fatos e com os leitores. A liberdade de imprensa não está em negociação. E quem tenta intimidá-la, por mais alto que brade dos microfones do poder, ecoa não como autoridade legítima, mas como a voz de um passado que o Brasil jurou nunca mais repetir. A Costa Júnior, recomendamos que direcione sua energia para investigar por que seu batalhão acha aceitável encenar rituais macabros, em vez de atacar quem os expõe.

A história cobrará daqueles que, quando poderiam defender a liberdade, optaram por se calar ou aplaudir a censura. O Diário não se calará. Nunca.