Vícios da política
Para uma parcela da população, o voto sempre foi visto como uma espécie de mercadoria

Mais de cinco séculos depois da “descoberta” do Brasil, temos a sensação de que falta muito ainda para alcançarmos um padrão de vida e cidadania que faça jus ao esforço e à esperança que alimentamos por todo esse período. O tempo passa, muitas coisas mudam, porém muitos dos velhos vícios da política teimam em continuar. Na chamada República Velha (1889-1930), esses vícios eram praticados de forma aberta e descarada, e, muitas das vezes, de forma legal. Hoje, os vícios são mascarados, mas permanecem aí, firmes e fortes. Os antigos coronéis parecem figuras apagadas dos livros de História. Parecem, mas não são, pois hoje em dia temos a triste figura dos “coronéis eletrônicos”, que são aqueles políticos que detêm o controle de rádios e canais de TV, para turbinar a sua carreira política, sem contar todo o aparato das redes sociais da internet, hoje disponíveis.
Para uma parcela da população, o voto sempre foi visto como uma espécie de mercadoria, cujo poder de barganha atinge seu valor máximo no período eleitoral. E aí vale todo tipo de troca, que sempre resultará em prejuízo para a democracia. O antigo coronel colocava-se, ele próprio, no lugar do Estado, prometendo tudo aquilo que o poder público não oferecia ao cidadão, como segurança, trabalho, terras, etc. Atualmente, o “novo coronel” milita nas falhas do Estado: promete tudo aquilo que a lei já assegura ao cidadão, tal como habitação, saúde, emprego, etc.
Em matéria de política, ocorre um paradoxo: algumas vezes o novo nem sempre é novo mesmo, pois existe o chamado “velho novo”, que é o candidato jovem de idade, mas que arrasta consigo todos os vícios da velha política. A princípio, parece fácil identificar esse tipo, mas não é tão simples, assim. Esse candidato se apresenta com um discurso moderno, inovador, ousado e diferenciado. No fundo, ele é um legítimo herdeiro das práticas da República Velha. Esse tipo de político sempre dirá que veio para atender aos anseios populares, para proteger e apoiar os mais pobres, etc. O que ele realmente pretende é: 1º) eternizar-se no poder, reelegendo a si próprio ou a seus correligionários; 2º) favorecer aos seus interesses privados, aos de seus parentes, compadres políticos e apoiadores da campanha; 3º) começar sua campanha politica para a reeleição no exato momento em que iniciar o seu mandato; 4º) engavetar aquele belo programa de governo, encomendado para ser exposto durante a campanha eleitoral. Afinal, campanha é campanha, e governo é governo; e 5º) afastar-se daqueles eleitores indesejáveis, que ele imagina que virão cobrar alguma coisa prometida durante a campanha. Afinal, em política, promessa nem sempre é dívida.
Aí está um quadro resumido da velha política brasileira, que, a despeito da evolução dos tempos, persiste até nossos dias, e, o que é pior, não parece dar mostras de que sairá de cena tão cedo. O Brasil somente começará a mudar no momento em todos perceberem que não haverá nenhum político salvador da Pátria, um messias que virá nos resgatar do atraso. Não, isso não ocorrerá, pois nós é que temos de ter a consciência de que o país é feito por nós mesmos, e que os políticos são “apenas” mandatários da vontade popular. Só assim cresceremos em todos os sentidos, depois de nos libertamos dos representantes da velha política.
João Francisco Neto, Advogado, doutor em Direito Econômico e Financeiro (USP) Monte Aprazível