Diário da Região
PAINEL DE IDEIAS

Panetone

Aquela inovação significava a popularização de um produto praticamente inacessível para a maioria das pessoas. Esta foi uma lição que me acompanhou por toda a vida

por Toufic Anbar Neto
Publicado há 5 horasAtualizado há 1 hora
Toufic Anbar Neto (Toufic Anbar Neto)
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Meu pai era padeiro. Lembro-me nitidamente quando ele trouxe de São Paulo algumas caixas de frutas cristalizadas, formas de papel manteiga e essência de laranja. Ele queria inovar e fabricar panetones, algo surreal para a época. Na década de 1970, existia apenas o panetone Bauducco, que era um produto raro e muito caro em Andradina. Lembro-me de que a primeira tentativa fracassou. Os panetones, por algum motivo, não cresceram. Passado o susto e a frustração, nova tentativa, desta vez, exitosa. Foi um sucesso muito grande. Não podia ser diferente. Aquela inovação significava a popularização de um produto praticamente inacessível para a maioria das pessoas. Esta foi uma lição que me acompanhou por toda a vida.

Existem várias lendas sobre o surgimento do produto. A mais famosa fala de um padeiro chamado Toni que criou o “pane di Toni” acidentalmente, para salvar uma receita que tinha dado errado. O fato é que existem registros sobre a receita do panetone num manuscrito do ano 1470, na Biblioteca Ambrosiana de Milão. Mas era uma receita popular em todo o norte da Itália, fruto de uma tradição coletiva. Sua origem remonta aos pães doces medievais, acrescidos de passas e especiarias e servidos durante festividades, especialmente o Natal.

O panetone ganhou a mesa dos europeus e depois do mundo. Obviamente a Itália é o maior consumidor do produto no mundo. Por ano, são fabricadas mais de 40 mil toneladas de panetones em todo o país. O segundo maior consumidor é o Peru. Além da forte imigração italiana no começo do século 20, foi um item que rapidamente se incorporou nos hábitos alimentares locais. É consumido durante o ano todo, preferencialmente com uma xícara de chocolate quente, mesmo durante o verão. O terceiro maior consumidor é o Brasil. A Bauducco é o maior fabricante do mundo. Também é consumido durante o ano todo. Uma curiosidade é que o panetone com gotas ou lascas de chocolate, conhecido por chocotone é uma invenção brasileira, da supracitada fábrica e que fez o caminho de volta conquistando o paladar dos italianos.

Embora tenha quem confunda, o panetone não é um bolo. Ele é um tipo peculiar de pão doce. Atualmente sua receita varia muito. É fundamental o emulsificante que faz com que a água combine com a gordura. Mas existem características finais que não podem faltar: uma massa elástica, úmida e macia. Nada pior do que um panetone seco.

O panetone é sinônimo de celebração para muitos brasileiros. Na verdade, ele é muito mais do que um pão doce. Ele representa um ritual de partilha e alegria nas festas de fim de ano. Simboliza união, fartura e prosperidade. É com este pensamento que eu agradeço ao Diário da Região por mais um ano e aos queridos leitores que pacientemente me acompanham. Feliz Natal e um excelente Ano Novo.

TOUFIC ANBAR NETO

Médico-cirurgião, diretor da Faceres, escritor e membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura (Arlec). Escreve quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras