Diário da Região
Painel de ideias

O criador de histórias

O filme, protagonizado por Mauro Souza, filho do Maurício, é realmente muito bom e deveria ser visto por todas as pessoas que acreditam nos sonhos

por José Luís Rey
Publicado há 2 horas
José Luís Rey (Divulgação)
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José Luís Rey (Divulgação)
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Desde que me conheço por gente, sou um leitor de histórias em quadrinhos, certamente um hábito favorecido pela circunstância de meu pai ser o dono da banca de revistas, na praça Ruy Barbosa. Eu lia todas – conhecia as identidades secretas (Batman era o Bruce Wayne, Dick Grayson era o Robin, Clark Kent o Superman, Barbara Gordon a Mulher Gato, Durango Kid escondia-se no rancheiro Steve Brand e por aí vai...), sabia o nome das namoradas dos heróis (Diana Palmer a do Fantasma e Lois Lane a do Supermman). E nutria tanta admiração pelos coadjuvantes, como o Guran, o Lotar, o índio Tonto e os fiéis mordomos Bernardo e Alfred.

Sabia tudo sobre as histórias, inclusive que elas não eram bem vistas pelos meus professores do ensino fundamental. Cheguei a ouvir alguns deles alertando o meu pai:

- Luís, acho que essa mania não vai fazer bem para o menino. Essa coisa de viver lendo gibis não presta!

Fez bem, sim. Me aproximou do hábito da leitura das coisas que os professores chamavam de “sérias”.

Há uns 15 dias, me lembrei disso ao entrar no cinema para assistir à cinebiografia do Maurício de Souza, o pai da Mônica, da Magali, do Bidu, do Cascão, do Cebolinha, do Chico Bento e de tantos outros seres que povoavam minha imaginação... O filme, protagonizado por Mauro Souza, filho do Maurício, é realmente muito bom e deveria ser visto por todas as pessoas que acreditam nos sonhos. Logo ao entrar no cinema, suspeitei de que me identificaria com quase tudo o que passaria a ver em seguida.

O filme mostra um Maurício sonhador, resiliente e – tanto quanto eu fora no passado – um incorrigível leitor de histórias em quadrinhos e alguém perseguido pela má vontade da escola da época com o gênero (no filme, a coleção de gibis do menino foi queimada por implicância de um professor).

Mas, “Maurício de Souza, o filme” deixa outras lições úteis, como a percepção de uma brasilidade que nós, os leitores de calças curtas da época, não conseguíamos encontrar nos congêneres americanizados de então, como as aventuras de Bolinha e Luluzinha (criados em épocas diferentes por Marjorie Hendersn e John Sanley) e pela grande maioria das criações de Walt Disney.

A história de Maurício ainda mostra a preocupação do criador em fugir, ainda no início de sua carreira, de fórmulas que pudessem defini-lo como um autor misógino. Logo mostrou que não era, nem nunca foi!

A biografia de Maurício – por mais que a simplificação das resenhas induzam a crer numa trajetória livre de perrengues, houve momentos de problemas, especialmente quando a disposição do criador, ao reivindicar dos editores de jornais o pagamento de honorários mais justos, foi classificada como “atitude subversiva”, chegando a custar o confisco de oportunidades de trabalho.

Mas o filme mostra que a história terminou bem. Ou melhor, ainda não terminou e nem terminará tão logo, tantas são as perspectivas de sucesso do HQ brasileiro.

Viva o Maurício!

JOSÉ LUÍS REY

Jornalista em Rio Preto. Escreve quinzenalmente neste espaço aos domingos