Diário da Região
PAINEL DE IDEIAS

Grito de alerta

A carreira musical de Gonzaguinha ocorreu em um contexto de forte crítica social e política em suas letras, além de uma relação difícil e posterior reconciliação com seu pai, Luiz Gonzaga

por Toufic Anbar Neto
Publicado em 01/10/2025 às 03:38Atualizado em 01/10/2025 às 11:16
Toufic Anbar Neto (Toufic Anbar Neto)
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Gonzaguinha nasceu no Rio de Janeiro há 80 anos. Era filho de Luiz Gonzaga, o “Rei do Baião”. Quanto a isso, existe uma polêmica sobre ele ser filho biológico ou adotivo. Havia um boato sobre a esterilidade do seu pai. O fato é que a mãe de Gonzaguinha morreu de tuberculose quando ele tinha apenas dois anos. Ele também teve a doença. Foi criado pelos padrinhos até os 16 anos, quando então foi morar com Gonzagão. A relação entre pai e filho sempre foi conturbada. Eram brigas constantes envolvendo diferenças ideológicas e a mágoa pela demora de Gonzagão assumir de fato a paternidade. Helena, sua madrasta, não o aceitava. Acabou reconciliando-se com o pai.

Fez o curso de economia. Na época da faculdade, ficou amigo de Ivan Lins, Aldir Blanc e Dominguinhos. Casou-se três vezes e teve quatro filhos. A segunda esposa era Sandra Pera, irmã de Marília Pera e cantora do conjunto “As Frenéticas”.

O início de sua carreira foi muito tumultuado. Era um crítico ao regime militar. Ao se apresentar no programa Flávio Cavalcanti, foi chamado de terrorista pelos jurados. Ficou visado pelo DOPS, uma espécie de polícia política da época. Suas músicas eram frequentemente barradas pelo Departamento de Censura. Foram 54 em 72 composições, inclusive seu primeiro sucesso, “Comportamento Geral” (1971). Por sua postura agressiva, a mídia o apelidou “Cantor rancor”.

Com a abertura política, em meados da década de 1970, ampliou seu repertório, compondo canções que agradavam mais ao público. Suas músicas mais tocadas foram “Começaria Tudo Outra Vez”, “Explode Coração”, “Espere por Mim Morena”, “Grito de Alerta”, “Sangrando”, “Eu Apenas Queria que Você Soubesse” e “Lindo Lago do Amor”. Várias músicas de Gonzaguinha foram temas de novelas brasileiras. Foi gravado por artistas como Elis Regina, Simone, Fagner, Alcione, Joanna, Zizi Possi, Gal Costa e Maria Bethânia, que lançou “Grito de Alerta” (1979).

Seu maior sucesso foi “O Que É o que É” (1982). Esta canção é um convite à celebração otimista da vida, que valoriza a simplicidade, o aprendizado contínuo e a aceitação das imperfeições, especialmente por meio da visão infantil. Apesar de reconhecer as contradições e dificuldades da existência, a canção exalta a força do indivíduo em construir sua própria felicidade e a resistência para superar as adversidades, transformando-a em um hino de esperança e alegria.

Gonzaguinha gostava de dirigir em alta velocidade. Morreu num acidente automobilístico no sul do Paraná. A carreira musical de Gonzaguinha ocorreu em um contexto de forte crítica social e política em suas letras, além de uma relação difícil e posterior reconciliação com seu pai, Luiz Gonzaga. Deixou clássicos que eternizaram sua presença na história da MPB e continuam ecoando como um grito de alerta.

TOUFIC ANBAR NETO

Médico-cirurgião, diretor da Faceres, escritor e membro da Academia Rio-pretense de Letras e Cultura (Arlec). Escreve quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras