O Leão ruge mais alto
A grande verdade é que o sucesso do Mirassol não nasce do acaso, da sorte ou de um lampejo isolado. Ele nasce de gestão

Já aviso ao leitor de pronto: não vamos falar da Receita Federal (ainda bem). Na verdade, vamos tratar de algo bem mais agradável.
O Campeonato Brasileiro de 2025 entrou para a história muito antes de sua última rodada. E o responsável por isso não foi nenhum gigante tradicional, mas sim o Mirassol Futebol Clube, o Leão do interior paulista, que decidiu desafiar a lógica do futebol brasileiro.
O clube, que no ano passado conquistou o acesso da Série B para a Série A, iniciou esta temporada com um objetivo simples, modesto e absolutamente compreensível: evitar o rebaixamento. Era o sonho realista de quem sabia que, para quem sobe, a queda imediata costuma ser frequente. Mas o Mirassol provou que esta lógica não resiste à competência.
O que se vê hoje, com algumas rodadas de antecedência, é o Leão classificado para a Copa Libertadores da América. Um feito estrondoso, especialmente quando se observa que clubes gigantes, com orçamentos incomparavelmente maiores, seguem tropeçando ano após ano.
Enquanto isso, o Leão, de uma cidade de pouco mais de 60 mil habitantes, se agiganta entre os primeiros colocados da elite nacional, atualmente ocupando a quarta colocação, e dá um exemplo que vai muito além do futebol.
A grande verdade é que o sucesso do Mirassol não nasce do acaso, da sorte ou de um lampejo isolado. Ele nasce de gestão. Nas campanhas recentes, o clube consolidou um modelo administrativo moderno, profissional e responsável. Investiu em estrutura, valorizou a base, escolheu treinadores com perfil compatível com seu projeto, manteve coerência nas contratações e, o mais importante, respeitou limites financeiros. Nada de apostas mirabolantes e nem de gastar o que não tem. O Leão cresceu com os pés (ou patas) no chão e agora colhe frutos que muitos clubes de massa só assistem de longe.
Ao mesmo tempo, o sucesso do Mirassol serve como advertência para outros clubes, inclusive para os aqui da nossa Rio Preto. A região, que respira futebol, convive há décadas com gestões instáveis, projetos interrompidos, dívidas acumuladas, brigas políticas e decisões atrapalhadas. O resultado: clubes praticamente desativados.
A maioria dos clubes nacionais gastam fortunas sem planejamento, trocam técnicos como quem troca de camisa e seguem presos a modelos ultrapassados que ignoram completamente conceitos básicos de governança e administração.
Enquanto isso, o Mirassol mostra que a força de um clube não está apenas na tradição, no tamanho da torcida ou no valor do patrocinador, mas, além disso, está na organização. O Leão ensina, de forma prática e irrefutável, que o profissionalismo supera o improviso, que o planejamento vence o imediatismo e que a gestão responsável pode transformar um clube pequeno em protagonista nacional.
Esse exemplo, aliás, não se limita ao esporte. O sucesso do Leão pode inlusive inspirar empresas privadas e até a Administração Pública. Em tempos de escassez de recursos, expectativas elevadas e necessidade de entregar resultados concretos, nada é mais valioso do que gestão séria, continuidade de projetos, análise técnica e capacidade de execução. Se um clube modesto do interior consegue isso em um ambiente tão complexo e competitivo quanto o futebol brasileiro, por que cidades maiores, governos municipais, entidades de classe e empresas não poderiam adotar princípios semelhantes?
O que o Leão do interior está fazendo é histórico e representa a vitória de um modelo que, em última análise, nos mostra o triunfo da boa gestão sobre o caos que tantos insistem em cultivar e que competência e seriedade são capazes de rugir mais alto.
Henry Atique
Advogado, Professor, ex-Presidente da OAB Rio Preto e Conselheiro Estadual da OAB/SP. henryatique@atiquemello.adv.br