Presente de Natal
“Querido Jesus, não precisa mandar brinquedos nem bombons. Traga mamãe para mim”

M.C., funcionária dos Correios, selecionava a correspondência da manhã com a mente voltada para o encontro de logo mais à noite. A véspera do Natal lhe surgia excitante. Desquitada do marido, deixara com ele o filhinho único e os ideais mais lindos de mulher. Dois anos depois, disposta a renovar seu caminho, aceitava obrigações para com outro homem, separado e sofrido quanto ela mesma. Formariam um lar feliz.
Absorta, revisava mecanicamente a correspondência da manhã, quando ocorreu o inusitado: um bilhete dobrado, letras desajeitadas, lhe caiu aos pés: “Para Jesus - no Céu”. E porque estivesse aberto, M.C. mergulhou-se, curiosa, na sua leitura a fim de se inteirar como agir.
“Querido Jesus. Tia Belinda disse que é o Senhor quem distribui presentes de Natal. Ela vai colocar esta carta no Correio, com o meu pedido. Queria que trouxesse minha mãe. O Senhor sabe. Ela nos deixou porque sofria demais. De noite, meu pai, ao chegar da rua, fechava a porta com força e xingava muito, porque havia tomado bebidas fortes. Dava pontapés nos móveis e batia na minha mãe. Ela chorava muito, abraçada comigo. Numa noite, ela saiu de casa e nunca mais voltou. Fiquei muito triste; papai também. Ele é bom, mas quando bebe diz que vai me deixar num asilo. Continuo na escola, mas estou doente. Quando é de noite, sinto frio e tenho muita tosse. Tia Belinda e dona Silvana cuidam de mim, mas não é como a minha mãe. Se o senhor falar com ela que estou doente, tomando remédios, sei que ela voltará. Querido Jesus, não precisa mandar brinquedos nem bombons. Traga mamãe para mim.”
Engasgada de emoção, M.C. leu a “assinatura” do filho! Caíra-lhe às mãos a missiva do filhinho de 8 anos! Recompunha o rosto, lavado em pranto, quando tocou o telefone. Atendendo, adiantou ao interlocutor: “Agradeço, mas sinto muito! Não me espere mais, perdoe-me! Tenho novos compromissos”.
E, à noite, demandou aflita o antigo lar. Recebida alegremente pelas senhoras que lhe chefiavam agora a casa, passou na sala de visitas pelo esposo, embriagado, que a cumprimentou surpreso. Rapidamente, alcançou o quarto do filhinho, com a ansiedade de quem reencontra um tesouro perdido. O pequeno, ao vê-la, ergueu-se do leito, exclamando feliz: “Ah! Mamãe! Jesus recebeu minha carta e trouxe a senhora?!” Ela, com o peito rebentando em lágrimas de ventura, respondeu: “Ah! meu filho... meu filho!”.
(O episódio, aqui resumidamente narrado, encontra-se na obra “Os dois maiores amores”, de Chico Xavier.)
Eurípides A. Silva
São José do Rio Preto