Porque viajar tornou-se tão interessante

Viajar para relaxar, divertir, conhecer e entreter é um conceito amplamente popular hoje, mas nem sempre foi assim. “O mundo inteiro está viajando”, escreveu o escritor alemão Theodor Fontane (1819–1898) no seu ensaio “Modernes Reisen” (Viagens modernas, em tradução livre), há quase 150 anos. Ele estava certo. Em 2024, mais de 20 bilhões de pessoas deixaram seu país para passar férias no estrangeiro.
“Esse fenômeno de massa começou como o prazer seleto de poucos. O turismo, ou seja, viajar visando apreciar a viagem e nenhuma outra finalidade, começou durante o período do romantismo, no final do século XVIII”, explica o professor Hasso Spode, diretor do Arquivo Histórico de Turismo da Universidade Técnica de Berlim.
Foi quando poetas e artistas descobriram a beleza da natureza. Johann Wolfgang von Goethe (1749–1832) foi um grande influenciador das viagens, visitou a Itália e ficou fascinado pelo país desde sua primeira vez no país, no entanto, esse era um passatempo pelo qual poucos podiam pagar. A teoria de Goethe de que “uma pessoa inteligente recebe a melhor educação ao viajar” é tida como os primórdios do turismo moderno. Naquela época, apenas jovens membros da nobreza passavam um ano ou mais em um grand tour. O objetivo das viagens dos cavalheiros de então era educar e refinar os seus costumes sociais.
Relatos de Goethe em “Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister” e descrições de outros viajantes despertaram um anseio nas demais pessoas a também se aventurarem no exterior. Um número crescente de membros da classe média alta empreendeu um petit grand tour, que os levava para destinos até então pouco atraentes, como os Alpes e o mar.
Enquanto viajavam os europeus, dependiam, muitas vezes, da ajuda de estranhos para obter informações, algo que o então jovem editor Karl Baedeker (1801–1859) usou a seu favor. Ele comprou os direitos para a publicação de “Rheinreise von Mainz bis Köln, Handbuch für Schnellreisende” (Viagem pelo Reno de Mainz a Colônia, um guia viajantes rápidos, em tradução livre). Isso marcou o nascimento do guia de viagem moderno. Baedeker publicou muitos outros guias. Para divulgar sua publicação, fez muitas viagens e não poupava o que ele considerava serem dicas úteis. Seu conselho para a Suíça, por exemplo, era “nunca mais beber leite de vaca sem acrescentar conhaque ou rum”.
Muitos desses trabalhos acadêmicos podem ser encontrados no Arquivo Histórico em Turismo da Universidade Livre de Berlim. Além da literatura de viagem do século XVII, seus 70 mil materiais impressos incluem mapas, cartazes e coleções de fotos privadas.
Novos meios de transporte, como os barcos a vapor que começaram a passar pelo rio Reno em 1827, derrubaram o custo das viagens, tornando excursões e cruzeiros acessíveis para cerca de 10% da população.
O primeiro “pacote de férias” foi criado em 1841 pelo inglês Thomas Cook. Ele organizou uma viagem de trem para cerca de 500 ativistas abstêmios partindo de Leicester para Loughborough na Inglaterra. O objetivo do tour, era a participação num comício em uma comunidade abstêmia. O pacote “com tudo incluso”, (hoje conhecido como all inclusive) incluía música, sanduíches e chá, bem como palestras sobre os perigos do álcool.
Mas Cook não inventou as viagens organizadas, reforça Spode. Ele simplesmente expandiu a ideia de um concorrente e transformou em um modelo economicamente bem-sucedido. Isso incluía usar cartas de agradecimento de clientes famosos para gerar um efeito de marketing, comuns atualmente.
A partir da Revolução Industrial (início 1760), os meios de transportes, hotelaria, gastronomia e todo aparato de uma viagem impulsionaram o turismo como destaque em países que promovem de maneira sustentável a atividade turística. Atualmente é um dos grandes vetores da economia mundial, um setor que emprega e promove renda.
Viajar motivado pelo lazer, cultura, gastronomia, interesse específico, participação em eventos e demais motivações, não é mais uma atividade para os privilegiados da classe social mais elevada, tornou um alia do para reparação da saúde física e mental. Em tempo de estresse, correria, fuga da rotina, a restauração físico/mental em uma paisagem inusitada, só ou na companhia de quem gostamos, deveria ser receita médica.
Célia Gomes
É membro do Conselho Municipal de Turismo