Diário da Região
RADAR ECONÔMICO

PEC da jornada, as empresas e os empregos

O setor industrial tem alertado para os riscos de uma regra constitucional que amarra todas as empresas, sem considerar as particularidades de cada ramo; essa flexibilidade já existe e funciona

por Aldina Clarete D'Amico
Publicado em 30/09/2025 às 20:59Atualizado em 01/10/2025 às 11:30
Aldina D'Amico (Aldina D'Amico)
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A Proposta de Emenda à Constituição 8/25, em análise no Congresso, pretende reduzir a jornada de trabalho para 36 horas semanais e implantar a chamada semana de quatro dias. Embora apresentada como avanço social, a medida carece de realismo econômico e ignora as condições concretas do Brasil.

A promessa de mais qualidade de vida, defendida por seus autores, pode soar atraente, mas não se sustenta diante do impacto que provocaria sobre a produtividade e a competitividade. Não é possível criar empregos apenas repartindo horas. O que gera crescimento sustentável são investimentos, inovação e aumento de produtividade. Países que experimentaram jornadas mais curtas chegaram lá porque já possuem níveis de eficiência muito superiores aos nossos.

O setor industrial tem alertado para os riscos de uma regra constitucional que amarra todas as empresas, sem considerar as particularidades de cada ramo. A Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) lembram que mudanças de jornada devem ser tratadas por meio de negociação coletiva, respeitando os diferentes setores e a realidade de cada empresa. Essa flexibilidade já existe e funciona.

A aprovação da PEC traria custos adicionais para empresas, especialmente pequenas e médias, que teriam de contratar mais trabalhadores ou reduzir produção. Isso significaria perda de competitividade, menor capacidade de investimento e risco de fechamento de postos de trabalho. Exatamente o oposto do que se promete.

Não se trata de negar a importância do bem-estar dos trabalhadores, mas de reconhecer que políticas públicas precisam equilibrar direitos sociais com sustentabilidade econômica. Uma Constituição engessada, impondo jornada rígida a todo o país, não resolverá os desafios do emprego. Ao contrário, pode afastar investimentos e comprometer a geração de renda.

A indústria brasileira já enfrenta altos custos operacionais, infraestrutura deficiente, burocracia e insegurança jurídica. Imposições que não levem em conta essa realidade fragilizam ainda mais um setor que é historicamente responsável por boa parte da geração de empregos formais no país.

Além disso, é no chão de fábrica que os impactos dessa mudança seriam mais imediatos. Muitas atividades industriais operam com turnos contínuos, equipamentos caros e linhas de produção que não podem ser interrompidas sem perdas. A rigidez da proposta pode comprometer a produtividade e desorganizar rotinas que hoje funcionam bem por meio de acordos coletivos.

A discussão sobre redução de jornada é válida, mas deve considerar os diferentes contextos setoriais e regionais. O que funciona em ambientes digitais ou em setores com alto grau de automação pode ser impraticável em áreas intensivas em mão de obra. Uma regra única para todos, inserida na Constituição, ignora essa diversidade.

O diálogo é o melhor caminho. A modernização das relações de trabalho deve se basear em negociações equilibradas entre empregadores e empregados, com o Estado atuando como facilitador, e não como impositor. Transferir todo o ônus da mudança para o setor produtivo, em especial a indústria, é desproporcional e contraproducente.

A PEC 8/25 precisa ser amplamente debatida e combatida. O desafio é avançar em qualidade de vida sem desorganizar quem emprega e produz.

Aldina Clarete D'Amico

Diretora-titular do Ciesp Noroeste Paulista