O Dilema do Prisioneiro
A opção racional não é, necessariamente, aquela que oferece o prêmio mais atraente

Em situações marcadas pela incerteza, recorrer apenas à intuição é insuficiente. Para ampliar nossa capacidade de antecipar os desfechos mais prováveis, lançamos mão de recursos teóricos que organizam o raciocínio e impõem disciplina à tomada de decisão. Entre esses recursos estão os chamados modelos racionais: simplificações da realidade que não pretendem capturar toda a complexidade do mundo, mas ajudam a identificar padrões lógicos de comportamento.
Um desses instrumentos é a teoria dos jogos. Desenvolvida ao longo do século XX, ela busca compreender decisões estratégicas em contextos complexos nos quais o resultado de cada escolha depende não apenas da ação individual, mas também da ação de outros. Seu uso se espalhou da matemática e da economia para áreas como ciência política, relações internacionais e até biologia evolutiva.
Entre os modelos mais conhecidos dessa tradição está o chamado Dilema do Prisioneiro. Em sua formulação clássica, dois prisioneiros enfrentam duas alternativas possíveis, que geram quatro combinações de resultados, dependendo das escolhas feitas por cada um. O ponto central está na tensão entre a decisão racional individual e o resultado coletivo ou ideal. Para fins ilustrativos, proponho uma releitura atual, embora totalmente descomprometida de rigor científico.
Imagine, então, um prisioneiro que não poderá participar de uma grande corrida prestes a acontecer. Ele precisa decidir se envia seu filho para competir em seu lugar. O adversário é um piloto extremamente experiente, atual tricampeão e bastante conhecido por seus métodos transacionais de conquistar o apoio da torcida. Se o prisioneiro enviar o filho e ele vencer, ficará apenas um ano na prisão. No entanto, caso o filho perca, o prisioneiro apodrecerá na cadeia, sem perspectiva de liberdade.
Se, por outro lado, o prisioneiro optar por não enviar o filho e permitir que sua equipe corra com outro piloto, uma vitória resultará (também) em apenas um ano de prisão. Já a derrota, nesse caso, levará a uma pena dosada em três anos, conforme previamente acordado com os organizadores do Grande Prêmio.
Diante desse quadro, a escolha racional é clara: o prisioneiro não deve enviar o filho. Eis o dilema: a opção racional não é, necessariamente, aquela que oferece o prêmio mais atraente, mas sim a que reduz o risco de uma perda extrema. É justamente essa tensão — entre desejo e prudência — que torna o Dilema do Prisioneiro um dos modelos mais duradouros e instrutivos para pensar decisões em ambientes de incerteza.
Fernando Cosenza Araujo
Bacharel em Relações Internacionais pela UnB, Mestre e Doutor em Administração Pública pela FGV-SP.