Guerra nuclear, um cenário
EUA e Rússia mantêm ogivas em “gatilho leve”, prontas para disparar em minutos

É um dia normal em Washington, a capital dos Estados Unidos: moradores cuidam de suas vidas e turistas caminham pelos monumentos da cidade. Tudo muda num instante. Uma ogiva termonuclear de 1 megaton disparada pela Coreia do Norte explode, e em segundos a cidade é pulverizada, matando centenas de milhares de pessoas. O mundo entra numa nova era — possivelmente a última.
Esse não é um simples roteiro de ficção. É a descrição dramática que abre o livro Guerra Nuclear: um cenário, de Annie Jacobsen (Editora Rocco, 2025). Com o rigor de um documentário, baseado em dados, entrevistas e análises de especialistas, o livro detalha o que ocorreria nas horas iniciais de um ataque real. É um alerta urgente, não uma fantasia.
Em 2022, o secretário-geral da ONU, António Guterres, advertiu: “Estamos a um mal-entendido da aniquilação.” A frase pode soar hiperbólica, mas o livro demonstra como esse risco é real, já que o frágil equilíbrio que nos afasta do conflito nuclear é sustentado por um sistema de dissuasão envelhecido, conhecido como “garantia da destruição mútua”. O problema é que, desde o fim da Guerra Fria, surgiram novas potências nucleares, como a Coreia do Norte, cujo comportamento imprevisível enfraquece esse equilíbrio precário.
Lá, cidadãos podem ser punidos por algo tão trivial quanto não manter perfeitamente limpa o retrato do líder supremo que todos devem ter em casa. Ninguém sabe os limites da irracionalidade de um regime assim — ou o que pode motivar um ataque nuclear.
Enquanto isso, EUA e Rússia mantêm milhares de ogivas em “gatilho leve”, prontas para disparar em minutos. É como dançar num baile funk carregando nitroglicerina — um passo errado, um falso alarme, um pequeno esbarrão, basta para acabar com tudo.
A geopolítica global raramente foi tão barulhenta. Trump e Putin, cada um à sua maneira, têm alimentado instabilidade e incertezas. Em meio a esse ambiente turbulento, a ameaça nuclear deixa de ser um tema do passado e volta ao centro das preocupações.
Annie Jacobsen nos lembra, com precisão perturbadora, que o perigo não é hipotético — é iminente. Não há como fingir que a ameaça nuclear é assunto ultrapassado.
Fernando Cosenza Araujo
Bacharel em Relações Internacionais pela UnB, Mestre e Doutor em Administração Pública pela FGV-SP.