Diário da Região
ARTIGO

Ancestralidade - voz que mora em nós

Compreender a ancestralidade é reconhecer que não somos obra isolada

por Gilson Ribeiro
Publicado em 18/06/2025 às 18:58Atualizado em 18/06/2025 às 23:25
Gilson Ribeiro (Divulgação)
Gilson Ribeiro (Divulgação)
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Há algo em nós que antecede nossos passos, um sussurro que nos acompanha desde o primeiro choro, uma força invisível que pulsa desde em nossas decisões mais simples e em nossos sonhos mais ousados. Esse algo se chama ancestralidade — e é ela quem caminha conosco mesmo quando achamos estar sozinhos.

Ancestralidade não é apenas passado, é presente pulsante, moldado por séculos de histórias vividas por aqueles que vieram antes de nós.

Essa herança invisível vai além dos sobrenomes e das tradições familiares; está no talento inexplicável, na intuição certeira, na força que surge do nada quando tudo parece desabar, é como se, nos momentos mais importantes, uma multidão silenciosa nos empurrasse para frente, dizendo: "continue, por nós."

Compreender a ancestralidade é reconhecer que não somos obra isolada, e sim somos continuação, somos elo de uma corrente longa, que começou muito antes de nós e seguirá muito depois.

Vivemos em um tempo que se valoriza a rapidez e o novo, mas há uma sabedoria antiga, discreta, que nos lembra do valor das raízes, da tradição, e são elas que nos sustentam mesmo nas tempestades. São essas raízes que explicam por que certos valores, como a honra, a coragem, o amor e a compaixão, nos tocam tão profundamente, afinal já estavam aqui antes de nós — e agora vivem através de nós.

Ancestralidade também é legado, não só o que recebemos, mas o que escolhemos deixar, é a consciência de que cada ação nossa será parte da bagagem dos que virão depois. Nossas palavras, nossos exemplos, nossos afetos e até nossos silêncios serão sementes plantadas nos corações futuros.

Por isso, viver com propósito é também um ato de gratidão; gratidão a quem lutou por nós, mesmo sem saber; gratidão a quem sonhou por nós, mesmo sem ver; gratidão a quem amou a vida o suficiente para nos entregar, como herança, a chance de continuar a história.

No fim, talvez não reste ouro, medalhas ou diplomas, mas que reste o mais precioso: a certeza de que fizemos parte da grande corrente da vida, e que fomos ponte entre o que foi e o que virá. E que a nossa existência, com todas as suas falhas e grandezas, alimentou mais um capítulo dessa narrativa eterna.

A ancestralidade não é peso, é impulso; não é prisão, é liberdade; não é passado, é origem, presença e destino; ancestralidade é tudo!

E quando, um dia, o ciclo se fechar e a vida nos devolver à terra, que também sejamos parte dessa força invisível que guia e protege, e que sejamos, nós também, voz silenciosa na consciência de alguém, empurrando-o com ternura para frente.

Porque, no fim, o mais belo legado é este: ser ancestral de alguém… “Continue, por nós”.

Gilson Ribeiro

Contador, cronista, poeta e membro da Academia Maçônica de Letras e Cultura do Noroeste Paulista