A hipnose pelo pêndulo
As influências de Ferrajoli, Zaffaroni e Jacobs: um olhar pelas Ciências Policiais luso-brasileiras

No próximo dia 22 de outubro estaremos em solo lusitano e, a convite do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna (ISCPSI), instituição de ensino superior público universitário, integrado na Polícia de Segurança Pública (PSP), apresentaremos uma palestra jurídico-penal sob o tema “As influências de Ferrajoli, Zaffaroni e Jacobs: um olhar pelas Ciências Policiais luso-brasileiras”.
A ideia é apresentar uma comunicação científica em que sejam apontadas as confluências entre as Ciências Policiais e as Ciências Jurídicas, numa perspectiva das normas e práxis de Portugal e Brasil, com foco no pensamento de três teóricos: Ferrajoli, Zaffaroni e Jakobs.
O italiano Luigi Ferrajoli, professor da Universidade de Camerino, onde foi diretor da "Facoltà di giurisprudenza" (Faculdade de Direito), é considerado um dos grandes teóricos do chamado Garantismo Penal. O ex-ministro da Suprema Corte Argentina e magistrado da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Eugenio Raúl Zaffaroni, professor emérito e diretor do Departamento de Direito Penal e criminologia na Universidade de Buenos Aires, é o teórico do Abolicionismo Penal. Finalmente, o alemão Günther Jakobs, com larga carreira acadêmica na Universidade de Bonn, onde se aposentou, notabilizou-se por sua teoria conhecida como Direito Penal do Inimigo.
Essas três teorias podem ser vistas como num pêndulo, cujo balançar leva a um dos extremos – o Abolicionismo Penal de Zaffaroni – com a proposta de substituição do aparelho carcerário por ações diversas daquelas da “a lógica do castigo”, da vingança e da crueldade. Essa proposta – um tanto quanto utópica – parte da ideia de que o sistema penal é marcado pelo que chamam de “seleção criminalizante”, que levaria o aparato estatal a somente apurar “obras ilícitas toscas”, definidas como aqueles crimes praticados por indivíduos marcados pelo estereótipo da pessoa suspeita, enquanto uma elite, por suas relações escusas com os operadores do sistema, ficaria inatingível e impune, exceto em situações excepcionais (“criminalización por retiro de cobertura”).
Balançando esse pêndulo para o extremo oposto, se chega à ideia de um Direito Penal do Inimigo. Mas poucos que se referem ao pensamento de Jakobs fazem a leitura de suas obras e preferem apontá-la como negação do Estado de Direito, quando, na verdade, seu conceito de “direito de exceção” busca responder à pergunta: “é possível travar a guerra contra o terror com os instrumentos de um direito penal de Estado de Direito?”. Portanto seu foco é voltado àqueles que praticam o terrorismo enquanto, aos demais criminosos, Jakobs fala de “Direito Penal dos Cidadãos”.
No ponto central desse movimento pendular parece estar o Garantismo Penal. Ferrajoli propõe a inserção, no texto constitucional, de normas que, superiores ao direito penal, limitem o poder coercitivo do Estado e seu arbítrio, dando máxima efetividade aos direitos e garantias fundamentais.
Pode parecer que sejam só teorias do mundo acadêmico, mas recentemente nosso Supremo Tribunal adotou o Abolicionismo, ao descriminalizar a posse de drogas para consumo, justificando essa decisão com o conceito de racismo estrutural; quando a filha de Glória Peres foi assinada por Guilherme de Pádua, ao estilo Direito Penal do Inimigo, o congresso incluiu o homicídio qualificado entre os crimes hediondos; quando, em 2015, o Conselho Nacional de Justiça criou a Audiência de Custódia, a base teórica foi o Garantismo.
No atual debate da PEC da Segurança, não faltarão discursos distorcendo essas teorias, buscando hipnotizar as bases dos extremos ideológicos por reels, shorts e tiktoks.
Azor Lopes da Silva Júnior
Advogado, professor de direito e coronel da Polícia Militar