Diário da Região
PREÇO SALGADO

Com aumento no preço da carne, rio-pretense gasta quase o dobro para fazer churrasco

O valor médio dos cortes de carnes mais populares na churrasqueira acumula alta de 98% desde outubro de 2016 em Rio Preto; no mesmo período, o salário mínimo subiu apenas 25%

por Felipe Nunes
Publicado em 23/11/2021 às 22:10Atualizado em 24/11/2021 às 10:09
Atual preço da carne bovina ocorre pela baixa oferta no campo (Guilherme Baffi 23/11/2021)
Atual preço da carne bovina ocorre pela baixa oferta no campo (Guilherme Baffi 23/11/2021)
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Uma das paixões do brasileiro, o churrasco está mais caro e isso não é novidade. O que é perceptível aos olhos e sentido no bolso se confirma em números. Com o aumento no preço das carnes bovina, suína e de frango, o rio-pretense passou a gastar quase o dobro para assar a mesma quantidade de carne que em outubro de 2016. Nos últimos cinco anos, o preço médio das carnes preferidas para ir à churrasqueira subiu 98%. Enquanto isso, o salário-mínimo aumentou 25% no mesmo período. Há cinco anos, o mínimo era R$ 880 e atualmente é de R$ 1,1 mil.

Para se ter uma ideia, há cinco anos, o preço médio de um quilo de contrafilé era R$ 24,49 nos açougues de Rio Preto, de acordo com levantamento da coluna Economize, do Diário. Na última pesquisa, realizada em outubro deste ano, o preço médio do mesmo corte saia por R$ 47,95 – alta de 95%.

Carne mais nobre, a picanha apresentou variação ainda maior. Atualmente, o preço médio pago pelo quilo da carne é de R$ 68,95. Há cinco anos, era possível comprar o mesmo produto pelo preço médio de R$ 33,95 – uma alta acumulada de 103%.

O mesmo ocorreu com carnes suínas e de frango. No período, a panceta suína teve variação de 123% e a linguiça toscana apresentou uma alta acumulada de 70%. Já a asa de frango e a coxa temperada tiveram altas de 65% e 58%, respectivamente.

Pesquisador de pecuária do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP, Thiago Bernardino de Carvalho afirma que o atual preço da carne bovina ocorre pela baixa oferta no campo. Ele explica que isso é um reflexo da crise econômica de 2016, que fez o preço da arroba do boi gordo cair após um período de altos investimentos no campo. Esse movimento acabou motivando um abatimento grande de fêmeas nos anos seguintes. “Como o ciclo produtivo do boi é de quatro anos, isso causou uma baixa oferta no campo”.

No entanto, a partir do fim de 2019 a China passou a importar grande volume de carne brasileira, o que continuou mesmo com a chegada da pandemia. “Houve um abate muito grande de fêmeas que provocou uma baixa na produção, momento que coincidiu com um grande comprador entrando. Houve uma corrida de investimentos e elevação de custos para produção por causa da falta de chuvas. Tudo isso é um quebra-cabeça para entendermos o preço elevado da carne”.

Mesmo com a suspensão do envio da carne para a China, o preço da proteína continua em alta, pressionada pelos custos na produção e pela alta demanda. Isso porque cerca de 70% do que é produzido no País é consumido internamente.

Por consequência, o aumento no preço da carne bovina acaba refletindo nos valores das outras carnes, argumenta o pesquisador. Isso ocorre porque elas passam a ser alternativas no prato. “O brasileiro tem preferência pelo consumo de carne bovina, mas, por outro lado, ele vê no frango uma alternativa de uma carne mais barata e de maior facilidade de preparo”. Maior consumo de frango pressiona os preços. Além disso, o milho, que representa metade dos custos de produção do frango, subiu devido à cotação do dólar.

“Já a carne suína depende muito da precificação da carne bovina e da carne de frango. Se as outras duas sobem, ela passa a entrar mais na dieta do brasileiro. É um mercado que não está muito na preferência do brasileiro, então ele depende do movimento das exportações e do preço das demais carnes”.

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Churrasco agora, só na sacolinha

Estudante José Luis Tofanin Neto não abre mão de fazer churrasco com os amigos (Arquivo Pessoal)
Estudante José Luis Tofanin Neto não abre mão de fazer churrasco com os amigos (Arquivo Pessoal)

Parece improvável, mas houve um tempo em que o anfitrião fazia questão de bancar o churrasco como forma de agradar os convidados durante uma ocasião especial. Mas já há algum tempo, a nova convenção social dita que cada um deve levar sua porção de carne para contribuir com o churrasco e assim pesar menos no bolso.

O que houve foi uma mudança no comportamento dos consumidores, afirma o empresário José Carlos Viale, proprietário do Frigorífico JC. Há 18 anos no ramo de açougue, ele conta que a procura por tipos de carne para churrasco continua, apesar de ter apresentado queda durante a pandemia (média de 30%). A diferença é que agora a porção levada por cliente diminuiu.

“Antigamente se fazia churrasco em casa e uma ou duas pessoas ficavam responsáveis em comprar a carne para a festa. Agora, isso foi dividido. Cada um vem e busca meio quilo de um tipo para dar uma diversificada”, conta.

No balcão, a preferência dos clientes também mudou. Segundo o empresário, por causa da alta de preços, os cortes mais em conta são os mais buscados. “Acontece muito de os clientes chegarem no balcão e começarem a discutir qual carne levar. Ninguém quer comprar carne boa e chegar no churrasco e comer as mais baratas”.

Para que o churrasco seja democrático, o estudante José Luis Tofanin Neto, 24 anos, e os amigos adotaram uma estratégia. Em vez de pedir para que cada leve sua porção, eles juntam o dinheiro para que a compra seja feita de uma vez só. “É um tipo de sacolinha diferente, desse jeito a gente decide em conjunto e consegue dividir tudo”, conta.

É que se cada um não contribuir, dificilmente o churrasco sai. E como assar carne acaba sendo um pretexto para a reunião, o esforço acaba valendo a pena. “O churrasco nem é só pela carne. É uma questão de se reunir para interagir com o pessoal. Por isso, a gente até diminui a quantidade, mas não fica sem”, comenta. (FN)