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Safra 2023 da borracha gera preocupação no setor no Noroeste Paulista

Impactada por vários fatores, como rentabilidade e condições climáticas, a safra da borracha natural de 2023 gera preocupação no setor

por Cristina Cais
Publicado em 08/04/2023 às 16:59Atualizado em 09/04/2023 às 07:18
Seringal na região de Rio Preto; múltiplos impactos geram preocupação ao setor (Divulgação)
Seringal na região de Rio Preto; múltiplos impactos geram preocupação ao setor (Divulgação)
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Produtores rurais e toda a cadeia produtiva da borracha natural estão atribuindo uma maior pressão no campo com a safra deste ano, no Noroeste Paulista. Neste cenário, os produtores afirmam que estão os baixos preços pagos pelo produto, o alto volume da matéria-prima nas usinas de beneficiamento e as chuvas, que afetaram o pico da colheita do coágulo da borracha nos seringais.

“A questão é muito séria, porque além de preços baixos que não estão cobrindo os custos da fazenda, o produtor não consegue colocar essa colheita da borracha nas usinas de beneficiamento”, afirma o produtor Jason Passos.

Entre a produção de 50 mil árvores de seringueiras em Nhandeara, a preocupação maior de Jason é com a elevada oferta da borracha no campo, o que tem pressionado as usinas a manterem os estoques altos do produto.

Ele diz que 80% da produção brasileira da borracha natural são beneficiadas nas empresas da região de Rio Preto, o que impacta na demanda de alto volume da matéria-prima. “Até agora não tive problema com essa negociação, mas para a próxima coleta dos seringais não tenho uma certeza que vou conseguir escoar a borracha”, diz.

Para o produtor Marcelo Franzine, uma série de fatores, especialmente os de mercado, impactou a safra de seringueiras neste ano. “No ano passado, quando o governo federal reduziu a alíquota de importação dos pneus de carga, começou o problema, com as indústrias pneumáticas que pararam de fabricar e passaram a importar esse produto, e começou a sobrar borracha no campo”, diz o produtor.

No campo, Marcelo avalia ainda as condições climáticas que provocaram atraso no início da colheita do coágulo da borracha. Durante os meses de janeiro e fevereiro, na produção de 70 mil seringueiras da propriedade em Tanabi, Marcelo conta que as chuvas prejudicaram o trabalho da sangria das árvores. “Além de a árvore ficar molhada, impedindo o trabalho do sangrador, as canecas ficam cheias de água da chuva que diluem a borracha, impactando na qualidade do produto”, afirma.

Usina

As indústrias de pneus instaladas no País estão entre os principais consumidores da borracha natural brasileira, sendo grande parte do beneficiamento e da venda de matéria-prima realizado por usinas da região do Noroeste Paulista. De acordo com Antônio Carlos de Souza, supervisor de compras da Braslátex, os estoques de borracha estão altos e com a demanda menor para os produtores que são clientes da empresa.

“Quando o governo decidiu não taxar mais a importação dos pneus, as indústrias compraram o produto, em maior quantidade, de países da Ásia, por exemplo, que são os grandes produtores da borracha natural”, ressalta.

A empresa localizada em Bálsamo e com capacidade para processar 3 mil toneladas de matéria-prima por mês, segundo o supervisor, está com estoque de borracha suficiente para os próximos dois meses. Ele afirma ainda que a situação da demanda do produto deverá se normalizar apenas no segundo semestre, ou seja, quando se encerra a safra de borracha de 2023.

Crise na cadeia produtiva

Coágulo de borracha tem preço baixo no mercado (Divulgação)
Coágulo de borracha tem preço baixo no mercado (Divulgação)

A preocupação da cadeia produtiva da borracha natural tem mobilizado entidades, associações e integrantes do setor a movimentarem esforços para minimizar os efeitos negativos da safra deste ano.

“O setor da borracha natural está passando por uma crise e a situação precisa ser endereçada ao governo federal, para que seja estabelecida uma política de preço mínimo da borracha”, afirma Diogo Esperante, diretor-executivo da Associação Paulista dos Produtores e Beneficiadores da Borracha Natural (Apabor).

Diogo pontua que, hoje, o valor pago pelo coágulo da borracha ao produtor vem despencando e impactando as usinas, com estoque acima do previsto nesta safra.

“Assim como outras associações, a diretoria da Apabor tem alertado o governo sobre a crise na cadeia produtiva da borracha. A taxação da importação do pneu de carga foi restabelecida, e agora precisamos de um preço mínimo, de R$ 4,46 (o quilo), previsto pela Conab”, destaca Diogo.

Na opinião do produtor André Seixas, o preço pago no campo, atualmente cotado em R$ 2,50 pelo quilo da borracha, não vem cobrindo os custos de produção das seringueiras.

“Eu defendo uma política de preço mínimo, acionando a Conab, para estabelecer o preço de R$ 4,46. A diferença, se olharmos para a política de preços do governo, é muito grande ao que está sendo pago ao produtor nesta safra”. (CC)

Prejuízos aos trabalhadores

Há 28 anos atuando no trabalho do seringal, Dinalva Salgado diz que as famílias estão passando por dificuldades para manter a renda na produção de borracha. “A nossa renda caiu muito, porque dependemos dos preços pagos pela borracha. Nesta safra tenho visto muitos trabalhadores deixando o setor por não conseguirem pagar as contas”.

Ela lembra ainda a importância da cultura da seringueira, uma planta que possui longevidade e que proporciona a matéria-prima, em uma mesma árvore, por muitas décadas. “Muitas famílias de sangradores, como a minha que sou mãe de quatro filhos, conseguiu renda para criar filhos e netos com esse trabalho”, afirma.

Dinalva diz ainda que resolveu levar um documento para a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo, reivindicando melhores condições de trabalho para os seringueiros. Em grupos de discussão, que reúne 800 seringueiros, Dinalva elaborou as reivindicações para melhores condições no trabalho do campo.

Entre os pedidos, ela destaca o reconhecimento da profissão de seringueiro pelo Ministério do Trabalho e um projeto de lei que implante o Seguro Defeso, para garantir renda ao trabalhador durante a entressafra da produção de borracha. “Este seguro ajudaria muito as famílias, tanto na entressafra como na época das chuvas”, finaliza Dinalva. (CC)