Conheça a muvuca, técnica usada para restaurar áreas degradadas
Técnica que reúne sementes de árvores nativas, chamada de muvuca por comunidades de povos originários, vem sendo aplicada na região para restauração de áreas degradadas ou de reflorestamento
Expedição formada por pesquisadores, técnicos em agricultura, coletores de sementes, entre mais de 80 pessoas interessadas no plantio da semeadura direta passou pela região Noroeste paulista nesta semana para observar os resultados com esses plantios em áreas de reflorestamento. Na região de Rio Preto, a técnica da muvuca - uma mistura de sementes nativas e adubação verde - foi adotada em áreas de cultivo da cana-de-açúcar.
A iniciativa integra uma rede de pessoas e organizações denominada Caminhos da Semente, que no período de 2019 a 2022 cultivou 2,2 mil hectares com mais de 21 toneladas de sementes para a semeadura direta em áreas de restauração vegetativa, no estado de São Paulo. “A expedição, com três rotas em São Paulo, sendo no Noroeste, Vale do Ribeira e Vale do Paraíba, tem uma proposta de contribuir nas restaurações de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de Reserva Legal na rota do Noroeste Paulista”, explica a agrônoma Laura Antoniazzi, uma das organizadoras da expedição.
Em propriedades de canaviais, nos municípios de Olímpia e Adolfo, 39 hectares estão sendo restaurados com a técnica da muvuca. As áreas de cana-de-açúcar pertencem às usinas Cruz Alta, do grupo Tereos (Olímpia) e Santa Isabel (Mendonça). “Após o plantio que se iniciou nos últimos dois anos, fomos vistoriar essas áreas na região de Rio Preto e vimos um resultado muito positivo com o desenvolvimento das árvores nativas”, conta Laura.
Além das áreas próximas aos canaviais na região de Rio Preto, Laura e os integrantes da expedição visitaram o assentamento de agricultura familiar do município de Promissão e áreas de preservação ambiental de uma empresa de energia elétrica, em Borborema. “Toda a recomendação técnica, do plantio até o fornecimento das sementes, nós fazemos para os parceiros do projeto. Temos mais de 80 espécies de sementes de árvores nativas, como jatobá, urucum, paineira, que são cultivadas nestas áreas e suficientes para a formação de uma floresta”.
Integração
O manejo com o plantio de semeadura direta, uma combinação de sementes de árvores nativas e de adubação verde, integra as parcerias com os produtores rurais e a rede de pessoas interessadas em preservar o meio ambiente. “Com as boas práticas de plantio que muitos produtores já fazem e com uso de máquinas que eles já possuem, o trabalho é muito eficiente. Tivemos também, nesta semana, os profissionais da Secretaria estadual de Agricultura, que vão orientar os agricultores de cada região com áreas degradadas ou de recuperação de vegetação”, diz Laura.
Outro aspecto importante do projeto, segundo a agrônoma, é a coleta de sementes de árvores nativas, realizada por pequenos produtores rurais ou de comunidades agrícolas, que são os fornecedores das sementes, o que resulta em mais renda para muitas dessas famílias.
Lucratividade com a coleta
A família Silva começou a coletar sementes de espécies nativas há duas décadas e conta que está feliz com a lucratividade do negócio. Produtor rural e depois funcionário de viveiro, José Severino da Silva explica que tem bastante experiência com a colheita de sementes em várias propriedades na região do município paulista de Piracicaba.
Incentivado por um pesquisador da Escola Superior de Agricultura (Esalq/USP), de Piracicaba, José se credenciou para a colheita das sementes de espécies nativas e comercializa para a rede que integra o projeto Caminhos da Sementes, além de vender para os viveiros. “O negócio cresceu bastante e rende bons lucros. Hoje tenho a minha chácara, veículo próprio e oito coletores de sementes que trabalham comigo”.
A filha, Gisele Silva Santos, trabalha com o pai e outros integrantes da família, e ajudou a instalar a empresa Zé da Lena Sementes. Gisele conta que são mais de 70 sementes de árvores nativas, todas coletadas com a autorização para a entrada nos locais. Os preços das sementes, segundo os coletores, variam entre R$ 60 e R$ 500, cada quilo. (CC)
Técnica tem uma série de vantagens
A técnica da muvuca de sementes, tradicionalmente desenvolvida por povos indígenas, possui uma série de vantagens, segundo Carolina Matos, diretora do departamento de Sustentabilidade Agroambiental da Secretaria de Agricultura do estado de São Paulo. “O objetivo da iniciativa Caminhos da Semente é difundir a técnica que utiliza as sementes de árvores de espécies nativas para proporcionar a recomposição da vegetação, ao invés de usar as mudas”, afirma.
Carolina diz ainda que o custo com as sementes é menor comparado ao custo das mudas, além de o produtor usar o recurso próprio, com maquinário, e acompanhar o desenvolvimento dessas árvores, semelhante ao que ele faz com as culturas agrícolas. Ela ainda destacou que pesquisadores e técnicos da Secretaria participam do projeto desde 2019 com o plantio de sementes em fazenda que pertence ao estado, na Apta de Pindorama (região de Catanduva).
“Plantamos uma área demonstrativa para acompanharmos o desenvolvimento do cultivo de vegetação dentro de um projeto chamado Etanol mais verde, com usinas e produtores de cana-de-açúcar. Tudo para mostrar a técnica da muvuca das sementes, desde a mistura ao preparo do solo e plantio”, acrescenta Carolina. Neste ano, a diretora destaca que a expedição foi importante para que técnicos de diferentes instituições conhecessem os plantios, além das redes de coleta de sementes.
Para o engenheiro ambiental da Usina Santa Isabel Samuel Campoy, a técnica da semeadura direta em áreas próximas a canaviais da empresa está sendo importante recurso para a recomposição de vegetação nativa. “É uma técnica muito interessante, pois é fácil de plantar, exigindo menos mão-de-obra, com um custo inferior ao das mudas e trabalho de plantio mais rápido”, ressalta. Ele diz ainda que a recuperação de Área de Preservação Permanente (APP) faz parte dos projetos ambientais da usina, neste caso, realizado pela unidade de Mendonça. (CC)