TECNOLOGIA ALIADA, SE USADA COM CUIDADO
Gama de informações disponível a toda a população pode ser uma armadilha e prejudicar saúde do paciente, além de alertá-lo sobre situações que muitas vezes não existem

Antes da inteligência artificial, quando a grande revolução eram os buscadores, os pacientes já usavam a internet para se “consultar”. Com o advento dos chats, não é raro encontrar quem recorra a eles como fonte de informação e até, ainda mais perigoso, de diagnóstico. Os médicos relatam que muitas vezes os pacientes chegam ao consultório já achando que sabem o que têm - muitas vezes, algo grave -, quando, na verdade, trata-se de uma situação corriqueira e de fácil tratamento.
“O maior desafio em usar a tecnologia é saber usá-la de maneira correta e com critérios bem definidos.”, afirma Hamilton Luiz Xavier Funes, especialista em cirurgia geral, gastroenterologia, nutrologia e terapia intensiva e professor da Famerp.
Ele orienta que o uso da inteligência artificial deve ser cauteloso. Buscar informações pode ser mais seguro em sites oficiais de universidades, hospitais e do Ministério da Saúde, por exemplo.
Usar a tecnologia de forma indevida pode ser prejudicial se ela “recomendar” terapias inadequadas e até retardar a busca por ajuda profissional qualificada, agravando um problema que poderia ser simples. Além disso, vale lembrar que buscar informações não confere a ninguém um diploma de medicina.
“A IA está apenas começando e pode haver muita informação incorreta. Felizmente, nunca atendi alguém com problemas por uso indevido de informações dela, mas já tive oportunidade de ouvir muitas sugestões dos meus pacientes querendo interferir no tratamento que eu estava recomendando”, recorda Funes.
A vasta gama de dados e orientações da rede não significa, necessariamente, que todo esse espaço é bem utilizado. “A internet democratizou a informação, mas nem sempre o conhecimento. São três riscos principais: a interpretação fora do contexto, a falsa segurança gerada por respostas simplificadas e a ansiedade ou automedicação inadequada, com efeitos colaterais e interações perigosas”, pontua Pedro Abbes Hueb, oftalmologista de 38 anos, sendo 16 de carreira. Ele também atende no Hospital Beneficência Portuguesa.
Ele dá uma orientação aos pacientes: informação online pode ajudar a formular perguntas melhores para o médico, mas jamais devem servir de base para o cuidado; além disso, alguns sintomas exigem atendimento imediato, como dor súbita intensa, falta de ar, febre alta que não passa, rebaixamento de consciência e rigidez da nuca. Esses e outros sinais indicam doenças graves que podem inclusive levar ao óbito.
O profissional também reforça que os médicos são figuras indispensáveis, uma vez que atendem muito além da parte técnica. “Existem sutilezas na conversa, no olhar, no toque e no silêncio que revelam informações que não aparecem em dados estruturados. O médico integra ciência com contexto de vida, prioridades da família, expectativas e medos do paciente. Assume responsabilidade ética e legal por decisões em ambientes de incerteza, ajusta condutas à beira leito quando a evolução não segue o livro, conduz conversas difíceis com humanidade, especialmente em fim de vida, e coordena equipes multidisciplinares em torno de um propósito de cuidado”, exemplifica.