Seu celular é a nova arma dos bandidos para limpar sua conta bancária
Quadrilhas que limpam contas bancárias após furtar celulares acendem sinal de alerta na polícia da região de Rio Preto. Por dia, oito celulares são furtados ou roubados no Noroeste Paulista. Saiba o que fazer para bloquear o Pix e proteger seu aparelho

Um furto de celular pode causar um prejuízo muito maior do que o preço do aparelho. Isso porque criminosos estão se especializando em limpar as contas bancárias das vítimas logo após os crimes. A prática, que tornou-se corriqueira na capital de São Paulo, acendeu o sinal de alerta na polícia da região de Rio Preto.
Em média, por dia, oito celulares são furtados ou roubados no Noroeste Paulista, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP). Atualmente, na maioria dos casos de furto ou roubo de celulares na região de Rio Preto, o aparelho é trocado por droga ou vendido para receptadores, mas o crescimento das transações bancárias via Pix mudou o alvo dos criminosos. Se antes, eles apenas se preocupavam com os aparelhos, agora o alvo são os dados fornecidos pelos celulares.
Segundo o delegado assistente da Seccional de Rio Preto, Alexandre Arid, o avanço da tecnologia e o aumento do uso de aplicativos para fazer transações bancárias fez com que os criminosos migrassem para esse tipo de crime. “O criminoso vai migrando de delito. Pela facilidade, o furto é mais comum”, destacou.
Em Rio Preto, é fácil flagrar pessoas usando o aparelho celular nas ruas. O resultado é que elas ficam mais vulneráveis de serem assaltadas e terem seus dados levados. “São dicas simples que podem evitar o pior. Por exemplo, não deixar o aparelho no bolso de trás ou, no caso de mulher, evitar deixar a bolsa aberta”, disse o tenente da Polícia Militar de Rio Preto, Claudio Luciano Ziroldo.
Kalinka Castelo Branco, especialista em segurança digital e professora do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMS) da USP, de São Carlos, destaca que, atualmente, o celular é praticamente a carteira das pessoas. “O celular possui todas as nossas informações. Além dos próprios aplicativos financeiros, temos que ter um cuidado maior com os aplicativos que usamos para pedir comida e até o da carteira nacional de habilitação digital, porque são aplicativos que armazenam nossas informações pessoais, como o CPF, RG e endereço”.
Para quem foi alvo dos criminosos, como Maria (nome fictício), todo cuidado é importante. A idosa estava no terminal de Rio Preto esperando o ônibus para ir até a sua casa quando aconteceu o crime. “Quando entrei no ônibus e fui pegar o celular pra mexer nele, percebi que tinha sido furtado".
De acordo com a Polícia Militar e Civil, diferente do passado, quando existiam pontos específicos da ocorrência desse tipo de crime, atualmente, furtos e roubos de celulares ocorrem em todas as partes da cidade. “O que a gente tem é uma prevalência maior em locais de grande circulação de pessoas, como Terminal Urbano, Rodoviária e Calçadão”, acrescentou Ziroldo.
Especialista em crimes cibernéticos, o delegado Higor Vinicius Nogueira Jorge, diz que, geralmente, quem comete o crime de furto e roubo de celular visando acessar a conta bancária das vítimas são quadrilhas especializadas em crimes cibernéticos.
“Geralmente são organizações compostas por várias pessoas, com atribuições definidas de modo que existem criminosos com a incumbência de promover a subtração e outros que acessam o dispositivo e realizam as transações. Além disso, existem os meliantes que recebem o dinheiro transferido. A todos eles é imputado o crime. E tem sido comum a identificação destes criminosos”, falou.
Na região, o delegado Arid diz que até o momento não houve casos parecidos com os que estão acontecendo em São Paulo, em que as quadrilhas furtam e roubam aparelhos para limpar as contas bancárias. “No entanto, já temos muitos casos de crimes cibernéticos na região, cujo as vítimas acabam tendo os dados violados no próprio ambiente virtual. Por isso, a recomendação de proteção do aparelho”.
Proteção
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) diz que acompanha permanentemente todos os temas relacionados à segurança e está atenta aos problemas de segurança pública e seus reflexos nas transações bancárias e na segurança de seus clientes, especialmente com o uso do Pix.
“Os aplicativos de bancos são seguros e dados de uso não ficam armazenados nos aparelhos. No caso de o cliente ter seu celular roubado, ele deve notificar imediatamente seu banco para que medidas adicionais de segurança sejam adotadas, como bloqueio do aplicativo e senha de acesso”, diz a nota.
A entidade também afirma que os bancos possuem funcionalidades em seus aplicativos que permitem que o cliente ajuste os limites transacionais no celular para valores de sua conveniência, seguindo à risca as instruções normativas do Banco Central. “A Febraban incentiva que os clientes utilizem esta funcionalidade em seus aplicativos para ajustar os limites de acordo com suas necessidades e segurança”.
Como se proteger?
Especialistas em segurança ouvidos pelo Diário dizem que, ao ter o celular furtado ou roubado, o primeiro passo é acionar o banco para bloquear transações bancárias. “A primeira coisa é acionar o banco e informar o crime. Se tiver com o cartão vinculado ao aplicativo, pedir que seja cancelado. É importante também ligar na sua operadora e pedir que sua linha seja bloqueada”, afirma a especialista em segurança digital Kalinka.
No caso de pessoas que possuem um prévio conhecimento em tecnologia, o recomendado é também apagar os dados remotamente do aparelho. Essa ferramenta está disponível nas páginas que a Apple (no caso de IPhone) e o Google (celulares com sistema Android) possuem.
Maior punição no Brasil
Crime comum nas cidades de médio e grande parte do Brasil, o furto e roubo de celulares aumentou ao decorrer dos últimos anos. O novo alvo dos ladrões e o crescimento dos crimes cibernéticos provocou alterações na legislação penal com objetivo de aumentar a punição aos envolvidos neste tipo de delito.
Atualmente, o criminoso que furta um aparelho em busca dos dados da vítima pode responder pelo crime de estelionato eletrônico. “Ele pune aquelas pessoas que furtam mediante fraude por intermédio de dispositivo eletrônico ou informático, e também pune aqueles que utilizam programas maliciosos ou meios fraudulentos semelhantes para perpetrar seus delitos. O crime tem uma pena de reclusão de 4 a 8 anos e multa”, explicou o delegado Higor Jorge. No caso, do roubo essa pena pode ser maior, visto que o autor ameaça a vítima.
Luciano Macri Neto, advogado criminalística da comissão de direito penal da OAB de Rio Preto, lembra que, normalmente, o furto costuma ser o primeiro delito do criminoso. “Ele é o mais próximo da sociedade e não é somente quem comete o furto ou roubo, mas também os receptadores. Esse tipo de crime acontece porque tem gente que compra esses aparelhos”, alertou.
O delegado assistente da Seccional de Rio Preto, Alexandre Arid, explica que uma série de fatores pode ensejar uma pena maior aos envolvidos. “O crime de furto em si, por exemplo, contra um cidadão que está perambulando e subtraem o objeto dele, esse tem uma pena pequena. O que a gente verifica é a possibilidade de qualificar o crime de furto. Então, se tem um arrombamento ou foi cometido no período da noite, essa pena pode ser aumentada”.
No entanto, apesar da maior punição, em muitos casos, nem o celular e nem o criminoso acusado de ter cometido os furtos são identificados. Foi o que aconteceu com dona Maria que teve o celular furtado no Terminal Urbano de Rio Preto. Até hoje, o seu celular não foi encontrado. “Já até tenho outro e estou evitando andar com ele em locais abertos”, afirma a vítima. (RC)
COMO EVITAR
Use sempre uma configuração de bloqueio da tela de início do celular e opte pela opção de bloqueio automático mais rápida (30 segundos, por exemplo)
Mantenha o sistema operacional do celular atualizado e verifique sempre se há atualizações de aplicativos pendentes
Nunca utilize o recurso de “lembrar/salvar senha” em navegadores e sites
Jamais anote senhas em blocos de notas, e-mails, mensagens de WhatsApp ou outros locais do celular
Apague senhas registradas no aparelho celular, como no bloco de notas
Caso seja possível, utilize um celular reserva para transações bancária, via aplicativo, apenas em casa
Procure usar senhas fortes e não repetir o código de acesso ao seu banco para uso em outros aplicativos, e-mail ou sites de compras
Utilize ferramentas de segurança adicionais como biometria, reconhecimento facial e dupla autenticação (a segunda senha) em apps e também no e-mail
Nas configurações do aparelho, desative as notificações e funções que são exibidas independentemente do bloqueio de tela inicial
Coloque um PIN também no chip do celular. Dessa forma, se o aparelho for reiniciado, será necessário inserir o código pessoal para uso da linha e envio e recebimento de SMS
Fui roubado. O que faço?
A primeira providência a tomar é apagar os dados remotamente. Assim, importante é encontrar o mais rápido possível um outro aparelho celular ou computador que esteja disponível no momento
Se a sua plataforma for android, acesse o android.com/find, insira login e senha e clique em “apagar dispositivo”
Se for IOS, acesse o icloud.com, insira login e senha, localizar iphone e clique em “apagar dispositivo”
Desta forma, você apagará todos os dados de seu celular
Em seguida, entre em contato com o canal de atendimento de seu banco para informar o roubo e efetuar o bloqueio de todas as suas contas e cartões
Avise a operadora de telefonia para o bloqueio imediato do chip e do Imei (Identidade Internacional de Equipamento Móvel). A partir do bloqueio, o aparelho ficará impedido de conectar a redes móveis
Também é importante trocar as senhas, não só de aplicativos bancários, mas também das redes sociais e e-mail
Quais informações são solicitadas pela operadora para bloqueio do celular?
Para fazer o bloqueio completo do celular, podem ser solicitadas pela operadora informações como dados pessoais, número do boletim de ocorrência e o IMEI, sigla utilizada para International Mobile Equipment Identity. Este último é um registro de identificação próprio de cada aparelho, que possibilita que o procedimento de bloqueio seja feito de forma mais ágil.
Caso o usuário não tenha o IMEI do aparelho registrado, é possível se precaver e obtê-lo discando o comando *#06# no telefone. O número é informado logo em seguida. Em casos de celulares com dois chips, inclusive, podem até ser mais de um. A recomendação é anotá-los em um lugar seguro e que possa ser acessado caso o celular seja roubado.
Usar a senha do banco no celular em outros aplicativos gera riscos?
A senha do aplicativo de banco deve ser exclusivamente usada para acessar os dados da instituição financeira, recomendam especialistas. Até para facilitar a memorização, alguns usuários costumam repetir a senha em outros aplicativos, mas isso pode facilitar a ação de criminosos, principalmente em casos em que o recurso de “lembrar/salvar senha” é utilizado em navegadores e sites.
Para além dos recursos de “lembrar/salvar senha”, outra prática frequente é a de anotar senhas em aplicativos do celular, como bloco de notas, para acessá-los sempre que houver esquecimento. Mas a prática também não é indicada. Se for necessário, mantenha o registro em algum lugar de segurança em casa.
Quais são os riscos de clicar em links desconhecidos?
Por mais que as técnicas para efetuar transferências por Pix, depois que os celulares são roubados sejam diversas, algumas delas ainda são bastante rudimentares. Ou seja, em vez de softwares, utilizam-se apenas da chamada “engenharia social” para ludibriar as vítimas – que normalmente estão abaladas emocionalmente após os furtos e roubos.
Como exemplo, o modus operandi de um suspeito seria tirar o chip do celular da vítima, colocar em um outro iPhone dele – que aí não seria necessário senha para desbloqueio – e mandar mensagem para a vítima, tentando enganá-la para clicar em algum link para desbloquear o iCloud. Partindo de situações como essa, uma dica importante seria evitar clicar em links suspeitos ou cuja origem parece incerta, o que permitiria às quadrilhas avançar nos crimes.
Onde registrar boletim de ocorrência de forma rápida?
Como se sabe, é imprescindível registrar boletim de ocorrência junto às autoridades policiais, ação que dá visibilidade ao crime, ajuda nas investigações policiais e permite, posteriormente, a identificação e as prisões de quadrilhas de criminosos. No Estado de São Paulo, é possível registrar ocorrência de forma online para parte dos crimes, como roubo e furto, por meio do site da Secretaria de Segurança Pública.
Vítima pode pedir ressarcimento do banco?
Depende. Especialistas em defesa do consumidor dizem ser de responsabilidade dos bancos garantir a segurança dos aplicativos e afirmam que as vítimas que tiverem suas contas limpas por esse tipo de golpe têm direito a pedir ressarcimento de um eventual prejuízo. No entanto, cabe ao banco comprovar que não existiu falha de segurança e que a culpa teria sido apenas do consumidor.
Fonte: Febraban, Polícia Civil, Polícia Militar, Higor Vinicius Nogueira Jorge, Kalinka Castelo Branco e Agência Estado.