Projeto da Infância com a Polícia Ambiental transforma escola problema em modelo de esperança
No foco da Diretoria de Ensino por baixo desempenho e atos de vandalismo, alunos da escola estadual Nova Esperança 'viraram o jogo', alcançaram nota 10 em avaliação do estado e são citados como exemplos de comprometimento







Voar num limite improvável, tocar o inacessível chão. O verso escrito por Chico Buarque parece traduzir a transformação social promovida na Escola Estadual Parque Nova Esperança, localizada no extremo da região Norte de Rio Preto, desde que foi acolhida pela Polícia Militar Ambiental e Vara da Infância e Juventude por meio do projeto Ratione Ambiental. Voar num limite improvável é deixar no passado o status de “escola problema” para se tornar “escola modelo”. Tocar o inacessível chão é apresentar a jovens de periferia um mundo de oportunidades por meio de visitas a um batalhão.
“Enfrentávamos problemas de indisciplina, vandalismo e baixo rendimento. Hoje temos alunos que são parceiros dos professores nos projetos e que se sentem parte da escola. Saímos da nota média 3 para alcançar 10 no Painel Escola Total. Deixamos as páginas policiais para merecermos uma reportagem especial de domingo”, emociona-se o diretor da unidade, Denis Vander Berti Rocha.
Idealizado pela psicóloga judiciária Priscila Silveira Duarte Pasqual, o projeto Ratione (razão, em latim) é um esforço coletivo que une Justiça, poder público, universidades e comunidade com o objetivo de conhecer os problemas sociais enfrentados pelas escolas e estabelecer estratégias para proteger as crianças e afastá-las da criminalidade.
O sucesso do projeto fez brotar uma nova semente, o Ratione Ambiental. De iniciativa do coronel Alessandro Daleck, o Programa de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável para a Infância e Juventude surgiu como uma estratégia para transformar o cenário do bairro Nova Esperança com a ajuda dos estudantes.
“Trata-se de uma área distante do centro, carente de equipamentos públicos de esporte e lazer e que sofre com o impacto ambiental do descarte irregular de lixo, que expõe a população ao risco de pragas, além de transformar negativamente a paisagem. O Nova Esperança sempre esteve no foco da Polícia Ambiental. Por meio deste projeto, nos aproximamos da comunidade e somamos esforços para mudar a realidade, mostrando primeiro aos jovens uma polícia que eles não conhecem”, diz o capitão Luiz Otávio Cavalheiro.
A escola Nova Esperança conta com 650 alunos e oferece turmas a partir do 6º ano do ensino fundamental até o 3º ano do ensino médio.
Visitas
Graças a parceria com a empresa Expresso Itamarati, duas vezes ao mês, quatro salas visitam o 4º Batalhão da Polícia Ambiental, no bairro Vila Diniz, onde os estudantes assistem a palestras sobre a atuação da corporação na proteção da fauna e flora, conhecem os equipamentos utilizados pela polícia e aprendem a cultivar mudas que serão plantadas na escola e em uma área do bairro doada pela Prefeitura, que será transformada em praça – um presente contemplado no projeto.
“Tem sido uma experiência muito gratificante. No primeiro contato, é possível perceber o distanciamento de alguns jovens, em razão da referência que eles têm da polícia. É para eles que voltamos nossa atenção e o nosso carinho. Essa resistência é quebrada e um elo de confiança é estabelecido. Eles passam a interagir com a gente e a querer conhecer mais sobre o nosso trabalho, inclusive como faz para ingressar na polícia”, completa o capitão.
Nesse contexto, o diretor Denis cita o exemplo de uma adolescente que, tempos atrás, havia sido flagrada com droga na escola e conduzida à delegacia. “Ela não queria ir à visita no batalhão. Nós insistimos e, na última hora, ela pegou o termo de autorização para a mãe assinar. A experiência foi tão envolvente que ela foi a aluna que mais participou das atividades. A visita refletiu dentro da sala de aula. Ela se tornou uma aluna mais interessada e engajada nos trabalhos”, diz.
DADOS
O que é
Criado e coordenado pelo Núcleo de Avaliação Psicológica da Vara da Infância e Juventude de Rio Preto
O projeto é composto por um grupo de profissionais e estudantes das áreas de psicologia, direito e medicina
Conta com a participação de instituições e entidades da sociedade civil, como Universidade Paulista (UNIP), por meio de alunos de psicologia autorizados a realizar estágio no projeto, Faculdade de Medicina Faceres, Polícia Ambiental, Cooperlagos, Expresso Itamaraty, Prefeitura de Rio Preto, Secretaria Estadual de Educação e Senac
Tem como principal missão o estudo das causas dos atos infracionais cometidos por crianças e adolescentes, auxiliando estes jovens para que compreendam a gravidade do ato cometido
O projeto também atua na busca pela prevenção de reincidências e novas infrações
Objetivos
- Redução de danos na adolescência
- Desenvolvimento humano para a criança e o adolescente
- Pleno desenvolvimento das Instituições Sociais na formação do indivíduo
- Apoiar o desenvolvimento do ambiente escolar, o corpo docente e seus alunos
Local
- Escola Municipal Darcy Ribeiro, no Santo Antônio
- Escola Estadual Parque Nova Esperança
- Escola Estadual José Felício Miziara, Chácara Municipal
- Escola Estadual Victor Brito Bastos, Vila Maceno
- Escola Estadual Alberto Andaló, Vila Maceno
Uma nova esperança
"Havia muitos registros de comportamento transgressor e atos infracionais envolvendo alunos da escola Nova Esperança. Quando a unidade foi inaugurada, os alunos foram transferidos de outras escolas e isso gerou revolta, que refletia em atos de vandalismo. Então a Vara da Infância e Juventude começou a olhar com mais atenção para esses estudantes. Ao iniciar os plantões psicológicos, por meio de parceria com a Unip, descobrimos que a indisciplina também era resultado da violência física, psicológica e até mesmo sexual enfrentada por muitas crianças", diz a psicóloga judiciária Priscila Silveira.
Conhecer a origem da dor foi só o primeiro passo. Reconhecer a escola como porto seguro foi essencial para atuação da Justiça e das secretarias de Saúde e Assistência Social na proteção dos jovens e realização de ações preventivas no núcleo familiar.
A grade curricular ganhou atividades como empreendedorismo feminino e "biblioterapia", que incentiva o hábito da leitura por meio de temas que interessam aos estudantes e contribui com a escrita e a oratória.
"Tenho 49 escolas e 32 mil alunos sob minha responsabilidade. A escola Nova Esperança estava sempre entre as que demandavam apoio pedagógico e psicológico. Após o projeto Ratione, houve melhorias impressionantes, tanto na convivência quanto nas avaliações internas e externas. O que demonstra a importância do engajamento da comunidade e mostra que precisamos de escolas que façam sentido para os estudantes", afirma Luana Garcia, dirigente regional de ensino.
Segundo a psicóloga Priscila, não foram mais registrados atos infracionais na escola.
"Solução é acreditar na criança", comemora o juiz Evandro Pelarin.
Graças a diversos parceiros como Prefeitura, Secretaria Estadual de Educação, Unip, Faceres, Cooperlagos, Itamarati, Senac e Polícia Ambiental, o projeto Ratione já passou pelas escolas estaduais Miziara e Victor Brito Bastos e escola municipal Darcy Ribeiro. Em breve, a escola estadual Alberto Andaló vai receber o projeto Ratione Cultural. (JT)
A praça que eu quero
“No começo do projeto, o coronel Alessandro Daleck levou os estudantes em uma grande área verde no limite do bairro e perguntou o que eles gostariam que aquele terreno se tornasse. Aquilo abriu uma janela de sonhos. Os alunos falaram que queriam uma praça, cheia de árvores, com quadras. Cada um disse como idealizava o espaço. Logo em seguida, Daleck anunciou que a Prefeitura cedeu o terreno ao projeto Ratione Ambiental. Foi uma festa”, conta o diretor Denis Rocha.
Ele explica que projetar uma praça que represente a realidade das crianças, a partir das brincadeiras que elas gostam e dos esportes que praticam, faz parte do esforço de pertencimento que o projeto quer estabelecer no bairro Nova Esperança.
“Vamos organizar um concurso de desenho chamado ‘A praça que eu quero’. Os melhores trabalhos serão encaminhados à Secretaria de Obras como sugestão para o projeto”, diz.
Parceira
A Cooperlagos é parceira do projeto e já realizou ações na escola para ensinar os estudantes sobre a importância da reciclagem do lixo, tanto para a saúde e bem-estar da população quanto para a economia. Os voluntários conquistaram a atenção dos alunos ensinando como produzir brinquedos e instrumentos musicais com materiais reaproveitados.
"São conhecimentos que atravessam as disciplinas de ciências e biologia, o que contribuiu no interesse dos alunos pelas aulas, especialmente quando o assunto é impacto ambiental. Realizamos uma atividade sobre pilhas e baterias, a composição desses materiais, o dano que eles causam aos lençóis freáticos e o tempo de decomposição na natureza. Isso resultou na recolha de um número surpreendente de pilhas e na produção de vídeos, pelos próprios alunos, que atuam como multiplicadores de conhecimento", diz a professora Fernanda Silva. (JT)