Prefeitura 'despeja' morador de rua de área pública para inaugurar projeto social em Rio Preto
Para inaugurar novo prédio do Centro Pop, órgão que acolhe moradores de rua, a Prefeitura de Rio Preto vai “despejar” dez pessoas que vivem no local; secretária disse que foi oferecido aluguel social


A Prefeitura de Rio Preto vai “despejar” até sexta-feira, 8, dez pessoas em situação de rua que residem em barracas nas imediações do novo prédio do Centro Pop, obra planejada justamente para o acolhimento e atendimento de moradores de rua. O imóvel fica na avenida Philadelpho Gouveia, ao lado da antiga sede do Palestra, abaixo do viaduto Jordão Reis.
Em nome do interesse dos atingidos pela medida, o defensor público Julio Tanone enviou nesta quarta-feira, 6, um ofício para a Prefeitura para saber quais medidas serão adotadas para auxiliar na retirada das dez pessoas. A Secretaria de Assistência Social informou que, inicialmente, esses moradores terão dois meses de aluguel social pagos pela pasta.
Os moradores dizem que sobrevivem há seis anos dentro do espaço público de 2,8 mil metros quadrados (m²), que pertence ao novo Centro Pop. A obra ocupa 550 m² de área construída, onde serão desenvolvidos projetos sociais da pasta. É a maior aposta da Prefeitura para acabar com a concentração de moradores de rua no Centro da cidade – atualmente, o Pop fica na rua Antônio de Godoy.
A iminência de despejo das dez pessoas da área existe desde julho de 2021, quando foi anunciado pela Prefeitura o início das obras do Centro Pop. A permanência temporária dos moradores de rua no espaço foi obtida após a mediação da Defensoria Pública junto à Prefeitura.
Os moradores de rua perceberam que o prazo tinha terminado na manhã desta quarta-feira, quando chegaram máquinas e caminhões da Secretaria de Serviços Gerais para a retirada de entulhos da construção e de lixo das imediações.
“Fomos chamados para fazer essa operação limpeza, porque a obra do novo Centro Pop já foi entregue e vai ser inaugurada nas próximas semanas”, explica Ulisses Ramalho, secretário de Serviços Gerais. A data de inauguração não foi divulgada pela Prefeitura.
Funcionários e máquinas foram escoltados no local por duas equipes da Guarda Civil Municipal (GCM), mas não houve conflito com os moradores de rua.
Quem ficou assustado com a movimentação foi o morador de rua Leopoldo da Silva Resende, que está no local desde 2017. Cada um deles sobrevive de venda de material de reciclagem e mora em barracas improvisadas.
“Precisam ajudar a gente com auxílio aluguel por pelo menos um ano. Não dá para ser apenas um mês, e depois jogar a gente na rua. Falaram que vão tirar a gente daqui de qualquer jeito.”
Para José Eduardo Miglim, 53 anos, catador de reciclagem, a saída será morar debaixo de uma das pontes de Rio Preto, porque não tem emprego fixo para bancar um aluguel residencial.
“Não tenho para onde ir. Vou ficar debaixo de outra ponte. Pra mim está difícil. Sou desempregado, vivo de reciclagem, não recebo benefício social. Deveriam fazer igual na Vila Itália (favela), dar um lugar digno para a gente morar, para a gente pagar os impostos em dia”, diz o catador de reciclagem.
Uma das moradoras ameaçadas de despejo, Miriam Nogueira lamenta que a única alternativa apresentada pela Prefeitura seja o pagamento de aluguel social apenas por 30 dias.
“Estamos nos sentindo mal, porque fizeram uma proposta de nos colocar em uma pensão até a gente arrumar uma moradia, num prazo de um mês. Quem vive de catar papelão vai conseguir?”, questiona.
Aluguel por até um ano
A secretária de Assistência Social Helena Maragoni confirmou a saída das pessoas em situação de rua do local onde vai funcionar o novo Centro Pop e disse que há intenção de aumentar o aluguel social para um ano.
“Só prometemos inicialmente 60 dias por conta do nosso orçamento. Está sendo feita uma licitação para podermos oferecer no total 12 meses de aluguel social para essas pessoas”, diz. Helena diz que a pasta irá dialogar com os moradores para estudar a necessidade de cada uma das pessoas.
Com a inauguração da obra, a Prefeitura vai retirar o Centro Pop da rua Antonio de Godoy, uma antiga reivindicação dos comerciantes e moradores da rua.
O projeto também prevê a construção de uma nova sede para o Albergue Noturno, numa área de 2,7 mil m² e, posteriormente, a sede de uma cooperativa de catadores de reciclagem em uma área de 1,6 mil m², tudo próximo do viaduto Jordão Reis.
Helena diz que a Prefeitura não vai mexer nas instalações do centro de lavagem de roupa e banho, mantidas por integrantes da Pastoral das Pessoas em Situação de Rua da Paróquia de Nossa Senhora do Brasil. (MAS)
Vai e vem de vagas
A Prefeitura anunciou no começo da semana a suspensão da parceria com a Associação e Fraternidade São Francisco de Assis para abrigamento emergencial das pessoas em situação de rua na Casa de Cirineu.
A parceria surgiu em maio deste ano, as vésperas das maiores ondas de frio deste ano. No local, os moradores tomavam banho, tinham alimentação e dormiam em camas. No auge do frio, cem pessoas foram acolhidas.
Com o fim da parceria, o frei Lucas, um dos organizadores da Casa de Cirineu, afirma que os religiosos só tem condições de abrigar 50 moradores de rua, com recursos próprios. “Ficamos sem entender a razão para acabar o acolhimento, porque estamos em pleno inverno”, afirma o religioso.
Questionada pelo Diário, a Secretaria de Assistência Social informou por meio de nota que, diante do aumento das temperaturas e por falta de procura pelo acolhimento, reordenou a oferta das vagas. “Desde terça feira as ações das frentes frias permanecerão através do Albergue Noturno. Havendo queda na temperatura, será reavaliada a abertura de novas vagas.”
Nesta quarta-feira, por telefone, a secretária de Assistência Social, Helena Marangoni, anunciou nova mudança de postura da pasta, dizendo que a parceria com a Casa de Cirineu será retomada nesta quinta-feira. (MAS)