Diário da Região
ONDA DE VIOLÊNCIA

‘Guerra das gangues’ eleva taxa de homicídios em Rio Preto

Impulsionada pela “guerra de gangues”, Rio Preto registrou o primeiro semestre com mais assassinatos dos últimos 20 anos; cidade é a terceira com maior taxa de homicídios do Estado

por Joseane Teixeira
Publicado em 01/07/2022 às 22:19Atualizado em 02/07/2022 às 08:56
Peritos analisam local do assassinato (Johnny Torres 25/4/2022)
Peritos analisam local do assassinato (Johnny Torres 25/4/2022)
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O primeiro semestre de 2022 é o mais violento dos últimos 20 anos em Rio Preto. Em apenas seis meses, 20 pessoas foram assassinadas na cidade. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Estado de São Paulo. A “guerra entre bairros” é apontada pelas autoridades de segurança como principal causa para a explosão de crimes contra a vida registrados na cidade – boa parte cometidos por adolescentes. Quando o critério é a taxa de homicídios por 100 mil habitantes, Rio Preto desponta como a terceira mais violenta do Estado, com 7,11 mortes, entre as maiores cidades. Em primeiro lugar está Campinas (9,06), seguida de Ribeirão Preto (7,69).

Para conter a onda de violência, polícias, juizado da Infância e Juventude, Ministério Público e Prefeitura unem esforços em busca de soluções.

À frente da Vara da Infância e Juventude, o juiz Evandro Pelarin tem contado com o apoio da Polícia Militar em uma ofensiva contra a cooptação de menores para o crime. “Em dois anos e meio, 14 adolescentes foram internados como autores de homicídios e tentativas de homicídio em Rio Preto. É um número muito alto, que demonstra o envolvimento de menores em infracionalidades graves, tendo como motor o tráfico de drogas”, afirma.

Para tentar compreender esse cenário, o juiz colocou agentes da Vara da Infância nas ruas para abordar menores em bairros sensíveis da cidade, com grande incidência de tráfico.

Duas visitas de campo já foram realizadas nesta semana. Na terça-feira, 28, um adolescente de 15 anos foi flagrado com droga e um revólver no bairro Parque da Cidadania.

Pelarin diz que a previsão do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) sobre crimes contra a vida contribui para a participação de menores em homicídios. “Um bom exemplo disso é o adolescente escolhido para ser atirador, em uma tentativa de homicídio ocorrida em maio, no Jardim Nunes. Era o último dia dele com 17 anos. No dia seguinte ao crime, ele completava 18. É um absurdo que um menor, com total consciência da gravidade do ato que ele está cometendo, fique internado por apenas 3 anos. Eles me dizem que vale a pena”.

A circulação de armas ilegais é apontada por todos os entrevistados como o principal desafio a ser combatido no controle da violência em Rio Preto.

Levantamento do Anuário Brasileiro de Segurança Pública aponta a arma de fogo como principal instrumento causador de mortes no País, estando presente em 98,4% das ocorrências de crime contra a vida, o que inclui homicídio e latrocínio (roubo seguido de morte).

Em Rio Preto, o cenário não é diferente. Quase que a totalidade das vítimas de homicídio foram assassinadas a tiros.

Titular da Delegacia de Homicídios, da Divisão Especializada em Investigações Criminais (Deic), o delegado Alceu Lima de Oliveira Júnior critica a legislação branda sobre o porte de arma de fogo.

“Um rapaz de 18 anos, suspeito de envolvimento na guerra entre bairros, foi preso no último sábado (25), no Jardim Nunes, com uma pistola. Ele foi solto na audiência de custódia e cinco dias depois (29) acabou preso novamente, com um revólver”, cita.

Sobre o grande número de tentativas de homicídio (de janeiro a maio foram 44, segundo a SSP), o delegado atribuiu ao revanchismo. “Se um morre de um lado, o amigo vai tentar vingar atacando alguém do grupo rival”.

Contramão

O crescimento dos crimes contra a vida em Rio Preto vai na contramão do que ocorre no País. Levantamento do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta semana, aponta redução de 6,5% nas mortes violentas intencionais no Brasil em 2021.

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Controle de armas

De olho nesse cenário, a Polícia Militar tem voltado o patrulhamento com o objetivo de identificar e prender indivíduos armados.

“No comparativo entre os meses de abril e maio, houve incremento na produtividade policial em Rio Preto na ordem de 6,4% nos flagrantes (de 125 para 133) e de 53,85% nas armas apreendidas (de 13 para 20). Mais criminosos presos e menos armas em circulação significam menos violência na cidade”, respondeu o coronel Carlos Henrique Forner, comandante do CPI-5. Do começo do ano até maio, as polícias Civil e Militar tiraram 73 armas de circulação, uma média de uma a cada dois dias em Rio Preto.

O coronel menciona a Operação Sufoco como mais uma estratégia de segurança pública, à medida que reforça o efetivo de policiais nas ruas, especialmente em locais considerados perigosos.

Especialista em Criminologia, Paulo Sumariva considera eficiente o trabalho de investigação da Polícia Civil de Rio Preto sobre autores de homicídio, e que a prisão dos criminosos contribui para o controle da violência. No entanto, assim como o delegado Alceu e o coronel Forner, ele defende que é preciso mais controle sobre a circulação de armas.

“Todas as armas apreendidas são ilegais. E de onde elas vêm? De fora do país. A fragilidade das fronteiras tem reflexos em todo o Brasil. Nós temos números de mortes superiores à guerra na Ucrânia, por exemplo”, diz. (JT)

Quatro denunciados

O Ministério Público denunciou quatro moradores de rua pelo assassinato do também morador de rua Fabiano Alves, de 44 anos, que foi espancado e teve o corpo incendiado no dia 25 de abril.

Laudo necroscópico apontou presença de fuligem nas vias respiratórias da vítima, o que indica que o homem ainda estava vivo quando foi queimado. O crime aconteceu na linha férrea, próximo ao Clube Palestra. Local que tem registrado grande concentração de dependentes químicos.

Teodoro Cavalcanti Neto, conhecido como Carrasco, e Igor Renan Lima Nora já estão presos. Breno Henrique de Oliveira, conhecido como Cirilo, e Fábio Roberto Silva de Souza, conhecido como Bruxo, estão foragidos. O grupo foi denunciado por homicídio triplamente qualificado por motivação torpe, emprego de fogo e recurso que impediu a defesa da vítima.

Investigação realizada pelo delegado Alceu Lima de Oliveira Júnior, da Divisão Especializada em Investigações Criminais (Deic) aponta que os criminosos mataram Fabiano para vingar uma denúncia de estupro contra uma mulher em situação de rua conhecida como Tati.

A denúncia já foi aceita pela juíza Carolina Marchiori Bueno Cocenzo, da 3ª Vara Criminal, que decretou também a prisão preventiva de Fábio e Breno. (JT)