Diário da Região
PROIBIDO E PERIGOSO

Cigarro eletrônico é vendido livremente e vira febre entre jovens de Rio Preto

Com venda proibida pela Anvisa devido aos riscos à saúde, cigarro eletrônico é encontrado facilmente em Rio Preto. Colégio emitiu alerta aos pais após encontrar alunos com dispositivos

por Rodrigo Lima
Publicado em 17/12/2021 às 21:22Atualizado em 18/12/2021 às 08:23
Comerciante mostra como funciona o dispositivo: modelos são de diferentes tipos (Rodrigo Lima 17/12/2021)
Comerciante mostra como funciona o dispositivo: modelos são de diferentes tipos (Rodrigo Lima 17/12/2021)
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Mesmo com venda proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), os cigarros eletrônicos são vendidos livremente e viraram “febre” entre os jovens. Um colégio de Rio Preto chegou a até emitir um alerta aos pais com pedido para coibir o uso dos dispositivos, apontando diversos estudos com os riscos causados pelos dispositivos – a maior parte deles tem nicotina, substância que causa dependência.

A reportagem do Diário constatou a venda dos cigarros eletrônicos em bares, tabacarias, lojas na região central e pelas redes sociais. Eles possuem diferentes cores, aromas e sabores – com nicotina ou não. Com nomes modernos como vape e pod, possuem diferentes versões, sendo recarregáveis ou descartáveis – e os preços variam de R$ 30 a R$ 1,5 mil.

O Diário apurou que esse mercado ilegal é abastecido em Rio Preto por fornecedores de São Paulo e do Paraguai. Quem vende afirma que a procura está alta entre os jovens, com a argumentação de que não faz mal a saúde. O aviso em inglês nos produtos passa outra mensagem: “este produto contém nicotina sintética. A nicotina é uma substância química viciante”.

No colégio Intelectus, o uso foi proibido e o descumprimento poder resultar na suspensão e eventual transferência compulsória do aluno. “Aqui não tivemos casos de alunos utilizando, apenas posse. Mas temos escutado muito do uso em festinhas e encontros de amigos”, afirmou o professor e coordenador pedagógico da escola, Francis Augusto Alvaceta, 38 anos.

Estudo do Instituto Nacional de Câncer (INCA) aponta para os riscos de iniciar o consumo de cigarros comuns a partir do uso dos eletrônicos. De acordo com o levantamento, o uso de cigarro eletrônico aumenta em mais de três vezes o risco de experimentação de cigarro convencional e mais de quatro vezes o risco de uso do cigarro.

A motorista Andrea - nome fictício - disse que parou de fumar cigarros convencionais há 11 anos. “Eu voltei fumando o cigarro eletrônico, com a essência sem nicotina. Só para fazer uma graça”, afirmou a mulher. “Optei pelo cigarro eletrônico porque não fica cheiro, por causa do sabor, e não incomoda ninguém. Como não tem nicotina é menos viciante”, disse. Não há evidência de que o uso ajude a parar de fumar. Os valores das essências líquidas variam de R$ 20 a R$ 45.

A ambulante T.D. possui dois cigarros eletrônicos, um recarregável e outro descartável. Ela disse que há dois anos já utiliza os equipamentos. “Agora virou moda, mas já uso há dois anos. Nunca fumei o cigarro comum", afirmou. “Me acostumei. Não sei porque a venda é proibida e o cigarro comum não é proibido”, disse.

Proibição

A Anvisa afirma que a comercialização, importação e propaganda de todos os tipos de dispositivos eletrônicos para fumar são proibidas no Brasil, por meio da Resolução de Diretoria Colegiada da Anvisa - RDC nº 46, de 28 de agosto de 2009. “Essa decisão se baseou no princípio da precaução, devido à inexistência de dados científicos que comprovassem as alegações atribuídas a esses produtos”, consta na nota.

Com base no posicionamento da Anvisa, a Secretaria de Saúde de Rio Preto reiterou que o comércio deste produto é proibido no país. “A orientação é que o produto não seja consumido. É um produto fumígeno, portanto os malefícios são os mesmos que qualquer outro tipo de fumo”, afirmou.

De acordo com a Prefeitura, a fiscalização sobre a importação é feita pelos órgãos federais. “As tabacarias que solicitam licença na Vigilância Sanitária são orientadas sobre a proibição. Se houver denúncias, procederemos a inspeção, eventual interdição e comunicação ao órgão federal responsável por fiscalizar a importação para a apreensão”, afirmou em nota.

Porta de entrada para tabagismo

O pneumologista Leandro Salviano considera que o cigarro eletrônico é mais uma estratégia para viciar as pessoas. “É porta de entrada para o tabagismo. Tem desculpa de que não é tão grave, que não provoca malefícios. Isso não é verdade. Tem vários estudos que demonstram que o cigarro eletrônico provoca dependência e pode causar doenças pulmonares do mesmo jeito que os outros cigarros. Risco de asma, de câncer e doenças cardíacas”, afirmou.

Salviano disse que, além da nicotina, há diversas substâncias que quando aquecidas podem provocar muito mal para o pulmão. Ele alerta para uma inflamação no pulmão, nas pessoas mais jovens, muito grave e semelhante à Covid-19. “Nos Estados Unidos tivemos uma pandemia de pacientes por causa disso que precisaram ir para a UTI”, afirmou.

Para o médico, a maioria dos cigarros eletrônicos possui nicotina que provoca dependência do mesmo jeito. “Não tem dose tolerável. Não existe indicação médica para uso do cigarro eletrônico. Não serve para o tratamento do tabagismo. Não se sabe os efeitos a longo prazo por conta das substâncias. Portanto, não deve ser usado”.

Segundo o médico urologista Júlio Martins, há estudos que mostram aumento de doenças cardíacas e o uso dos cigarros eletrônicos seria a causa. “Artigo no mês de dezembro em revista mostrou o risco da disfunção erétil em jovens e adultos. Mais um problema relacionado ao uso. Não é algo seguro e livre de risco. Temos problemas pulmonares, cardíacos e problemas de ereção”, afirmou. (RL)

O dispositivo

Cigarro eletrônico

Os dispositivos eletrônicos para fumar (DEF), também conhecidos como cigarros eletrônicos,são constituídos, em sua maioria, por um equipamento com bateria recarregável e refis para utilização.

Há diversos tipos disponíveis no mercado, desde os recarregáveis aos descartáveis (uso único)

A comercialização, importação e propaganda de todosos tipos de dispositivos eletrônicos para fumar são proibidas no Brasil, por meio de resolução da Anvisa de 2009

A decisão se baseou no princípio da precaução, devido à inexistência de dados científicos de que os produtos não causam mal à saúde

Em 2019, a Anvisa divulgou alerta aos médicos sobre doenças pulmonares causadas por esses produtos nos Estados Unidos.

Atualmente, a Anvisa elabora uma Análise de Impacto Regulatório (AIR) - que pode manter a proibição ou fazer a liberação impondo regras

É alternativa para parar de fumar? Mito

Não há comprovação científica de que os cigarros eletrônicos sejam eficazes para isso. Os estudos científicos são limitados e de baixa certeza de evidência. O cigarro eletrônico pode, inclusive, levar as pessoas a fumarem mais, para compensar a falta do cigarro comum. Muitas das substâncias utilizadas nos dispositivos contêm nicotina, que causa dependência

O uso de cigarro eletrônico aumenta em mais de três vezes o risco de experimentação de cigarro convencional e mais de quatro vezes o risco de uso do cigarro, segundo pesquisa do Instituto Nacional de Câncer (Inca)

Fonte: Anvisa e Ministério da Saúde