Diário da Região
TERRA DOS APOSENTADOS

Metade dos municípios da região de Rio Preto tem mais aposentados que trabalhadores na ativa

Na maioria dos municípios, economia é pouco dinâmica e depende da administração pública

por Rone Carvalho
Publicado em 16/10/2021 às 17:57Atualizado em 17/10/2021 às 07:36
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João Reina, 82 anos, na tradicional bocha de Uchoa, cidade que contabiliza mais aposentados do que trabalhadores com carteira assinada (Johnny Torres 14/10/2021)
João Reina, 82 anos, na tradicional bocha de Uchoa, cidade que contabiliza mais aposentados do que trabalhadores com carteira assinada (Johnny Torres 14/10/2021)
Silvana Nespoli, 52 anos, é uma das 499 pensionistas de Uchoa (Johnny Torres 14/10/2021)
Silvana Nespoli, 52 anos, é uma das 499 pensionistas de Uchoa (Johnny Torres 14/10/2021)
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Mais da metade das cidades da região de Rio Preto possui mais aposentados e pensionistas do que trabalhadores na ativa. São cidades com economia pouco dinâmica, dependentes diretamente da administração pública e que ao mesmo tempo que atraem idosos, afugentam jovens. Ou seja, funcionam como “cidades dormitório”.

É o que mostra levantamento feito pelo Diário com base em dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). No total, o Noroeste Paulista – 116 municípios – concentra 367.180 aposentados e pensionistas. O número de trabalhadores formais chega a 501.693. Em 62 municípios, mais da metade do total, são 105.301 pessoas que já pararam de trabalhar, enquanto 73.116 continuam na ativa e mantêm a roda da economia girando.

Terra dos aposentados é o tema da primeira reportagem da nova série especial do Diário da Região: “Uma vida pela frente”, que vai mostrar como vivem os idosos no Noroeste Paulista. Na primeira reportagem, como o interior de São Paulo virou terra dos aposentados e os impactos disso economicamente.

Santa Rita d’Oeste, a 193 quilômetros de Rio Preto, lidera o ranking de aposentados e pensionistas em proporção ao número de habitantes no noroeste do Estado. Lá, 42% da população vivem da aposentadoria ou de pensões por morte. Em contrapartida, apenas 117 santa-ritenses trabalham com carteira-assinada (4,7%), em empregos gerados pela prefeitura ou no comércio.

A tranquilidade e o menor custo de vida são apontados como principais razões para a região de Rio Preto atrair cada vez mais aposentados. Há dez anos, Marli Silva Cordeiro, de 69 anos, escolheu Uchoa para chamar de sua cidade. A proximidade com Rio Preto e o preço baixo dos imóveis atraíram a aposentada. “Antes, morava em São Paulo, mas quando meu marido aposentou resolvemos nos mudar para o interior. A única coisa que é difícil aqui é o calor”.

Quem também resolveu mudar para o interior ao se aposentar foi Maria Aparecida dos Santos, de 65 anos. “Já morei em São Paulo, mas gosto de Uchoa porque é tranquilo. Quando me aposentei não pensei duas vezes a não ser se mudar pra cá”, disse uma das 1.398 aposentadas da cidade.

Uchoa é um dos 62 municípios da região de Rio Preto que tem mais aposentados e pensionistas do que trabalhadores com carteira assinada. A maioria deles está nos menores municípios, como Catiguá, Dolcinópolis, Irapuã, Macedônia e Magda. Em Rio Preto, são 74.161 aposentados e pensionistas, o equivalente a 15,8% dos rio-pretenses. Na contramão, a cidade concentra 140.850 empregos formais, segundo o Caged.

E quem vem normalmente aquecer o mercado de trabalho de Rio Preto são, justamente, os filhos dos aposentados desses pequenos municípios que, normalmente, “fogem” em busca de oportunidades nos maiores municípios. "Tenho um filho e uma filha que trabalham em Rio Preto. Eu não penso em mudar daqui, porque é uma cidade tranquila, mas para eles é melhor. Tem mais oportunidades”, disse o aposentado Rubens Minguetti, 68 anos, morador de Uchoa.

Incentivo

Para especialistas, os números reforçam a necessidade de um maior incentivo estatal para geração de emprego nos pequenos municípios da região. “Nessas cidades, iniciativas do governo como o auxílio emergencial têm um impacto enorme porque mudam a vida econômica. Em Rio Preto, o impacto do auxílio não é tão grande como nessas cidades, pois é onde existem menos vagas de emprego. Sem contar que muitas vezes a aposentadoria, ou seja, o rendimento do idoso, é o único meio para sustentar a família”, apontou o economista da Universidade de São Paulo (USP) Paulo Roberto Feldmann.

Já o economista e sociólogo Ary Ramos diz que a tranquilidade do interior de São Paulo incentiva que muitos moradores da capital procurem o Noroeste Paulista para chamar de novo lar. “O que percebemos de 20 anos pra cá é uma diminuição dos empregos formais. Houve um incremento da informalidade, principalmente, o empreendedorismo. E isso também acontece nas pequenas cidades, contribuindo para termos mais aposentados do que trabalhadores formais”, acrescentou.

Os dados compilados pelo Diário também mostram uma falta do dinamismo econômico das pequenas cidades, que convivem diretamente com a falta de empregos. É como se a “balança” nestas cidades não ficasse equilibrada, mas sim desproporcional para o lado de aposentados e pensionistas.

"Tem uma grande quantidade de pessoas na idade ativa que estão trabalhando, mas que estão no mercado informal, ou seja, não contribuem com a previdência. Essas pessoas mesmo não tendo contribuído acabam conseguindo uma aposentadoria. E isso é preocupante para o futuro econômico do Brasil”, afirmou José Eustáquio Diniz Alves, demógrafo e professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Clique aqui para ver tabela com  número de aposentados