Diário da Região
APURAÇÃO

Corregedoria da Polícia Civil de Rio Preto mira atraso em investigações

Reportagem identificou 19 casos com hiato entre data do crime e inquérito

por Joseane Teixeira
Publicado em 13/01/2022 às 22:18Atualizado em 14/01/2022 às 08:27
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Prédio da Deic de Rio Preto, que abriga a Delegacia de Homicídios (Arquivo)
Prédio da Deic de Rio Preto, que abriga a Delegacia de Homicídios (Arquivo)
Edes Attilio foi morto em julho de 2020, e o inquérito foi instaurado apenas em novembro de 2021 (Reprodução)
Edes Attilio foi morto em julho de 2020, e o inquérito foi instaurado apenas em novembro de 2021 (Reprodução)
Ronaldo Elias, que morreu em janeiro de 2021, teve o inquérito instaurado nove meses depois (Reprodução)
Ronaldo Elias, que morreu em janeiro de 2021, teve o inquérito instaurado nove meses depois (Reprodução)
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A pedido do Ministério Público, a Corregedoria da Polícia Civil de Rio Preto oficiou a Delegacia de Homicídios, vinculada à Divisão Especializada em Investigação Criminal (Deic), para que apresente o relatório de assassinatos e tentativas de homicídio ocorridos nos últimos dois anos na cidade. O pente-fino tem como objetivo investigar denúncia de atraso na instauração de inquéritos. Relatório elaborado pela reportagem ide ntificou 19 casos, entre homicídios e tentativas, com demora na instauração – o tempo varia de cinco meses a um ano e nove meses.

Após tomar conhecimento do procedimento administrativo, o delegado responsável pela investigação de crimes dolosos contra a vida, Alceu Lima de Oliveira Júnior, instaurou, de uma só vez, dez inquéritos sobre tentativas de homicídio ocorridas em 2020. Os procedimentos datam de 29 de novembro.

Em outubro, o promotor José Márcio Rossetto Leite, que atua como fiscalizador externo das polícias, foi informado sobre cinco homicídios ocorridos no primeiro semestre de 2021 e que tiveram os inquéritos instaurados somente no dia 14 de outubro.

Entre os casos citados está o de Ronaldo Elias Ramos, executado em janeiro aos 41 anos, com tiros no rosto, no momento em que estacionou a caminhonete em frente de casa, no Jardim do Bosque. Entre a data do crime e da instauração do inquérito há um intervalo de nove meses. Surpresa para os familiares da vítima.

“Fomos à Deic várias vezes e a informação que recebemos é que os investigadores tinham muitas pistas desencontradas, mas que estavam empenhados no esclarecimento. Eles estão com o celular do Ronaldo e na rua havia câmeras. Desde a morte dele vivemos com medo, porque não sabemos quem foi o autor, nem o motivo. Eu não lavo a calçada de casa, porque entro em pânico cada vez que passa um motoqueiro”, revelou uma pessoa da família.

Após o vazamento da informação sobre a fiscalização da Corregedoria, outros casos ainda mais antigos tiveram o inquérito instaurado. Como o do soldador Edes Attílio Neto, 21, morto a tiros em uma chácara do bairro Jardim Nunes em julho de 2020. Consta que o documento de investigação só foi formalizado em 16 de novembro de 2021, ou seja, com 1 ano e 4 meses de atraso.

“Decepção é a palavra. Quando tentei alguma informação sobre o porquê de ele ter sido morto, me disseram que o caso estava sob segredo de justiça. Durante todo esse tempo alimentamos a esperança de que, um dia, o assassino fosse identificado e pagasse pelo que fez”, disse outro familiar. Nas duas entrevistas, as pessoas ouvidas pediram para não serem identificadas por medo de represálias.

Corregedor aguarda relatório

O delegado corregedor da Polícia Civil, Fernando Frei, afirmou que a investigação administrativa está sendo presidida pelo assistente, Paulo de Tarso Amaral Marcondes. “Recebemos algumas indicações de diligências, sugeridas pelo promotor, para não fugir do foco da apuração. Estamos aguardando o relatório dos homicídios e temos oitivas já agendadas. É um procedimento minucioso. O mais demorado será compilar os documentos e analisá-los para saber se houve alguma irregularidade.”

O corregedor disse que as consequências para o delegado, caso sejam identificadas falhas de procedimento, vão de sindicância a processo administrativo, que pode resultar de advertência a demissão.

O promotor Rossetto disse que vai aguardar o fim da apuração para se manifestar. “Recebi a informação e despachei para a Corregedoria porque entendi que cabia uma apuração”, disse.

Entre os casos identificados pela reportagem, apenas um não está sob responsabilidade do delegado Alceu Lima de Oliveira Júnior. E é justamente o mais atrasado. Trata-se do homicídio de Jerre Adriano de Paiva, cujo corpo foi encontrado em estado de decomposição, mas com sinais de violência, em um pasto do bairro Nova Esperança em fevereiro de 2020. Consta que o inquérito foi instaurado um ano e nove meses depois, pelo delegado Paulo Buchala Júnior.

“Como o autor tinha suposto envolvimento com o tráfico, as eventuais testemunhas tinham temor por suas vidas. Somente agora, depois que o autor foi morto, uma testemunha teve coragem falar. O inquérito, eu já relatei, só não encaminhei para o Fórum ainda”, disse Buchala.

O delegado Alceu foi procurado, mas não quis comentar o assunto.

A Ouvidoria da Polícia foi notificada do ocorrido e aguardará as investigações. “O delegado de polícia deve sempre buscar a justa causa para a instauração de inquérito policial, podendo adotar providências prévias. Cabe, diante do caso, a verificação do motivo da alegada morosidade para a instauração do inquérito, respeitada a discricionariedade da autoridade policial”, escreveu em nota o ouvidor Elizeu Lopes. (Colaborou Marco Antonio dos Santos)