A grande bolha imobiliária
Encher zonas inteiras de produtos pensados para curta temporada deixa dúvidas sobre o impacto

Nos últimos anos, vimos uma verdadeira corrida em torno dos apartamentos compactos voltados para plataformas como o Airbnb. Em muitos lançamentos, o argumento era simples e sedutor: alta ocupação, diária atrativa, retorno rápido e um novo “produto estrela” para o investidor.
Parte do mercado embarcou nisso quase no modo automático. Porém, como sempre acontece quando uma tese é inflada mais pelo entusiasmo do que pelos fundamentos, os números começam a contar uma história diferente.
Matéria recente do Estadão mostra esse movimento na capital. Em São José do Rio Preto, onde atuamos com intensidade, os dados do Secovi/SP reforçam o sinal amarelo: hoje, a cidade registra 478 anúncios ativos em plataformas digitais, com crescimento de 28% em três anos. À primeira vista, esse aumento pode parecer promissor. Mas, quando se olha para a base real de desempenho, o cenário muda de figura. A taxa média de ocupação é de apenas 49%, ou seja, esses imóveis ficam vazios praticamente metade do tempo.
O RevPAR, que mede a receita por unidade disponível, está em torno de R$ 112,64. Na prática, isso alonga o payback para mais de 10 anos em muitos casos. Para o investidor que entrou acreditando em retorno acelerado, essa conta não fecha. Para quem projeta, financia e carrega o risco de longo prazo da incorporação, fecha menos ainda.
Mesmo sabendo que venderíamos muitos estúdios desse tipo em Rio Preto, no Grupo Impper tomamos uma decisão clara: não entrar nesse nicho. E essa escolha não tem nada a ver com falta de demanda imediata. Tem a ver com responsabilidade. A primeira responsabilidade é com o investidor.
Quando a oferta cresce rápido demais em um mesmo tipo de produto, com ocupação baixa e tarifas pressionadas, aumenta o risco de frustração e de arrependimento. Não considero saudável construir um portfólio inteiro em cima de uma lógica que já dá sinais de saturação. A segunda responsabilidade é com a cidade. Incorporação não pode ser guiada apenas pelo “hype” do momento. Cada projeto interfere na dinâmica urbana, no uso do solo, no trânsito, na vizinhança, na vocação de uma região.
Encher zonas inteiras de produtos pensados prioritariamente para curta temporada pode atender a uma onda de curto prazo, mas deixa dúvidas sobre o impacto estrutural no médio e longo prazo.
A terceira responsabilidade é com o morador, que muitas vezes passa a conviver em edifícios com grande rotatividade, uso desencontrado e pouca identidade de comunidade. Por isso, escolhemos concentrar energia em produtos residenciais com uso mais estável, demanda consolidada e melhor equilíbrio entre liquidez, ticket e qualidade de vida.
Acreditamos que tipologias familiares bem localizadas, com projeto consistente e aderentes à realidade de cada cidade, seguem entregando desempenho mais saudável ao longo do tempo, tanto para quem mora quanto para quem investe.
Não se trata de demonizar o Airbnb ou o aluguel de curta temporada, que têm seu espaço e sua função. O ponto é outro: exceção não pode virar regra, tendência passageira não pode ditar, sozinha, a estratégia de um setor que trabalha com horizontes de 10, 15, 20 anos.
Seguimos atentos a todos os movimentos do mercado, mas com uma premissa que, para nós, é inegociável: crescer, sim; a qualquer custo, não. E, em um momento em que muitos ainda enxergam apenas o brilho de curto prazo, talvez a verdadeira inovação esteja justamente em dizer “não” para aquilo que não faz sentido no longo prazo – mesmo quando seria fácil vender.
Bruno Malvezi
CEO do Grupo Impper.