Diário da Região
ARTIGO

Plásticos e Saúde

por Milton Artur Ruiz
Publicado em 31/07/2025 às 15:02Atualizado em 31/07/2025 às 18:24
MILTON ARTUR RUIZ (Divulgação)
MILTON ARTUR RUIZ (Divulgação)
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O editorial de julho da revista Nature, uma das mais respeitadas publicações científicas do mundo, chama atenção para um problema urgente e crescente: a poluição global causada pelos plásticos. A previsão é alarmante — se nada for feito, a produção de plásticos deverá dobrar nos próximos 20 anos. Isso significa que o volume já imenso de resíduos plásticos no planeta tende a se multiplicar rapidamente.

O alerta da revista acompanha a publicação de dois estudos científicos de grande impacto. O primeiro mostra que micropartículas de plástico — os chamados nanoplásticos, invisíveis a olho nu — estão presentes em todas as amostras de água coletadas no Oceano Atlântico, desde áreas costeiras até o alto-mar e em diversas profundidades. Os pesquisadores estimam que só na camada mais superficial do Atlântico Norte existam cerca de 27 milhões de toneladas dessas partículas.

O segundo estudo, realizado por cientistas da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, identificou mais de 16 mil substâncias químicas ligadas à produção ou à composição dos plásticos. Destas, mais de 4.200 são classificadas como “substâncias químicas preocupantes” — ou seja, compostos que não se degradam naturalmente, que podem ser tóxicos para o corpo humano e que causam sérios danos ao meio ambiente.

Hoje já existe um consenso entre os cientistas de que os microplásticos (com menos de 1 milímetro) e os nanoplásticos representam riscos reais à saúde humana. Eles podem ser ingeridos com alimentos ou água, inalados com o ar ou até absorvidos pela pele. Uma vez no corpo, essas partículas podem se acumular e causar diferentes tipos de danos.

Estudos feitos em laboratório e em modelos animais mostram que esses materiais podem provocar inflamação, estresse celular, danos ao DNA, morte de células, alterações nos genes e efeitos negativos nos sistemas respiratório, digestivo, imunológico e reprodutivo. Há indícios de que essas partículas conseguem atravessar barreiras naturais do corpo, como a parede do intestino, e alcançar o sistema nervoso. Em experimentos com animais, isso levou ao agravamento de sintomas parecidos com os observados na doença de Parkinson.

Além das partículas plásticas, os aditivos químicos presentes nos produtos — como o bisfenol A (BPA), os ftalatos e os retardantes de chama bromados (PBDEs) — também preocupam os especialistas. Esses compostos estão ligados a problemas cardiovasculares, alterações hormonais, déficit cognitivo, maior risco de morte e distúrbios do sistema endócrino. A contaminação pode acontecer tanto pelo contato direto com produtos plásticos como pela ingestão de alimentos ou água contaminados.

Há ainda evidências de que esses produtos químicos podem interferir no funcionamento do sistema imunológico e aumentar o risco de doenças autoimunes — especialmente em pessoas mais vulneráveis ou com predisposição genética. Os cientistas reforçam que ainda são necessários mais estudos, especialmente de longo prazo, para compreender com precisão como essas substâncias afetam o corpo humano.

Outra área de preocupação é o câncer. Estudos experimentais apontam que os plásticos e seus aditivos podem causar inflamações persistentes, alterações genéticas e danos celulares — todos fatores envolvidos no desenvolvimento de tumores. Ainda que a ligação direta entre a poluição plástica e o câncer em seres humanos não tenha sido definitivamente comprovada, a possibilidade é considerada biologicamente plausível e vem sendo intensamente investigada.

O plástico, que revolucionou o mundo moderno, tornou-se também um dos maiores vilões ambientais e uma ameaça silenciosa à saúde humana. Invisíveis, os micros e nanoplásticos estão nos oceanos, no solo, no ar que respiramos, na água que bebemos e agora, cada vez mais, no nosso próprio corpo. É urgente que governos, empresas e cidadãos se unam. A crise do plástico é mais do que ambiental, é também uma crise de saúde pública.