Compromisso com a vida: a trajetória da ‘Comunidade Só Por Hoje’

Criada em 1994, a “Comunidade Só Por Hoje” (CSPH) é uma das instituições mais atuantes de Rio Preto quando o assunto é acolhimento e assistência a pessoas em situação de vulnerabilidade social, especialmente aquelas impactadas pelo uso de substâncias psicoativas. À frente da entidade está Edna Thomé de Souza, fundadora e coordenadora de projetos, especialista em Saúde Mental com ênfase em dependência química e atual segunda-presidente da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (Febract).
Com três décadas de história, a CSPH nasceu da união de pessoas engajadas em temas que ainda estavam à margem do debate público. “A instituição surgiu no início da década de 90, quando no Brasil as antigas ONGs (organizações não governamentais) começaram a ter um papel relevante no cenário político mundial, com bandeiras sobre temas e assuntos que não estavam na pauta da imprensa e da política. Também estávamos vivendo a época da progressiva epidemia de Aids. Aqui em Rio Preto, um grupo de pessoas, se juntou para levantar essa bandeira e junto com a temática da Aids, tinha a então chamada dependência química, devido ao uso intensivo de drogas injetáveis (o crack estava chegando no Brasil) e a transmissão da Aids também era por seringas, que envolvia o uso abusivo de drogas”, afirma Edna.
A história da fundação da CSPH também é profundamente pessoal. “Diante da complexidade do tema invisível na época, um grupo decidiu, formado por mim, meu falecido marido Alexandre Thomé de Souza, com outras pessoas abnegadas, criamos a 'Comunidade Só Por Hoje' em 1994. A militância da causa foi uma orientação de uma renomada profissional, pois meu marido era portador do transtorno por uso de substâncias (TUS), popularmente chamada de dependência química. Ela entendia que a militância ia fortalecer o processo de recuperação, o ato de solidariedade e compromisso com outras pessoas traria mais segurança e firmeza na busca pela recuperação”.
Desde então, a entidade expandiu suas frentes de atuação, firmando parcerias com o poder público e ampliando seus serviços. “No início deste século, com a missão de atuar na causa da prevenção às drogas, tivemos as primeiras parcerias públicas com a prefeitura de São José do Rio Preto e com o governo estadual com adolescentes infratores na Fundação Casa”, explica Edna.
Missão e atuação

A missão institucional é promover acolhimento e assistir pessoas usuárias de substâncias psicoativas e com condutas adictivas a encontrar um sentido para a vida. “Nossos valores e princípios são: acolhimento, serviço, superação, responsabilidade e opção pela vida. Nossa visão é ser reconhecida nacional e internacionalmente na liderança de programas de impacto na área de prevenção e tratamento de condutas adictivas e problemáticas correlatas. A questão de atuar com excelência e neste sentido valorizamos as evidências científicas e a formação constante dos coordenadores e colaboradores”.
Hoje, a CSPH acolhe adultos, crianças e adolescentes em diferentes contextos de vulnerabilidade. “A ‘Comunidade Só Por Hoje’ atua em várias frentes na área da assistência social até o momento. Atuamos com acolhimentos de adultos com transtorno por uso de substâncias em parceria com a Política sobre Drogas com o governo estadual com 45 vagas em Potirendaba e São José do Rio Preto. Tem três casas de acolhimentos de crianças e adolescentes com vínculos familiares rompidos e temos a capacidade de dez vagas cada uma, sendo duas aqui e uma em Tanabi. Todas financiadas pelas respectivas prefeituras. Com a prefeitura de Rio Preto, temos ainda o serviço especializado de abordagem social desde 2005 e até junho de 2025. As duas casas de acolhimento não tiveram contrato renovado em 2025. Recentemente, firmamos parceria para atendimento jurídico com a Defensoria Pública do estado de São Paulo com 90 atendimentos por mês. E temos projetos de fortalecimento de vínculos com oficinas culturais em Rio Preto e Tanabi, atendendo mais de 70 crianças e adultos por mês”, revela Edna.
Acolhimento e metodologia

O processo de acolhimento varia conforme o perfil do público atendido. As modalidades de acolhimento têm portas de entrada distintas. Enquanto os adultos são atendidos primeiro pelo médico na UBS ou CAPS, as crianças e adolescentes são encaminhadas pelo Conselho Tutelar ou Vara da Infância e Juventude.
O trabalho terapêutico é baseado em metodologias consolidadas, com foco no desenvolvimento integral dos acolhidos. “Ao longo das três décadas de atuação, a CSPH com base na ciência e experiência prática construiu uma metodologia baseada na terapia cognitiva comportamental, Programa de 12 passos das irmandades anônimas, além de teóricos com Paulo Freire, Karel Kosik, entre outros”, afirma a coordenadora.
Edna explica que a articulação com a rede sócio assistencial e a espiritualidade são eixos importantes (sem proselitismo religioso). “A instituição não tem atuação partidária, vedada em seu estatuto, mas participa crítica e ativamente de conselhos de controle de direitos como Conselho da Criança e sobre drogas (tantos nos respectivos municipais e estaduais) e Conselho da Assistência Social (CMAS) no aperfeiçoamento e proposição de políticas públicas”.
Equipe
O corpo técnico é multidisciplinar “formada por assistentes sociais, advogados, psicólogos, professores de educação física, oficineiros e educadores sociais e voluntários. A instituição é aberta ao trabalho voluntário e adequa ao perfil, vocação, competência técnica e disponibilidade de tempo do voluntário”, afirma Edna.
Transparência e futuro
A CSPH mantém suas contas com responsabilidade e presta contas regularmente. “A CSPH administra os recursos com extremo rigor e de acordo com as normas da contabilidade brasileira para o terceiro setor. Somos auditadas externamente há 13 anos, por auditoria externa e independente. Na página da internet temos uma aba transparência. Os recursos são do poder público municipal, estadual e doações.”
Ao longo dos anos, a comunidade acumulou inúmeras histórias de transformação. “São muitas histórias de superação. Como atuamos com seres humanos no extremo risco e situações de vulnerabilidades, cada vida importa e impacta positivamente na sociedade. Nestas três décadas temos centenas de pessoas que são cidadãos que contribuem para a harmonia e cidadania no desenvolvimento da sociedade. Devido às suas histórias de vulnerabilidades, podemos afirmar que o impacto foi positivo para muitas famílias.”
Os sonhos continuam vivos e com novos projetos. “A instituição tem planos e sonhos para o presente. Recentemente, lancei o livro ‘Com licença, codependência, estou na luta!’, sobre a importância do empoderamento das pessoas que sofrem com filhos e maridos envolvidos com drogas, e também queremos fortalecer os laços com projetos na América Latina. Hoje estamos empenhados na divulgação da Declaração de Olviedo, um conjunto de propostas aos governos e à sociedade mundial para a prevenção às drogas aprovado pelo escritório sobre drogas da ONU, em Viena, em 2025”, afirma Edna.
Serviço
Para quem quiser conhecer mais, contribuir ou doar:
Endereço: Rua João Teixeira, 263 – Bairro Santa Cruz
Site: www.csph.org.br
Telefones: (17) 99233-2290 e (17) 99208-9113
Pix para doações:
00734543000132 (Banco do Brasil)