Quem tem criança pequena em casa ou convive com alguma deve estar acostumado com uma prática comum usada por elas para conseguir se comunicar: balbuciar palavras sem sentido e apontar. "Esta é a 'receita' que algumas crianças usam para se fazer entender nos primeiros anos de vida. Entretanto, embora emitir sons como 'hum, hum' seja muito mais comum do que se imagina, é preciso ampliar o repertório da criança", explica a fonoaudióloga Juliana Trentini, do Canal Fala Fono.
Um dos principais erros que os pais cometem é achar que a fala vai brotar espontaneamente. Isto acontece em um ambiente estimulador, com conversas, brincadeiras e bebê incluído nas atividades da família. Entretanto, o estilo de vida moderno, segundo os especialistas, não favorece este ambiente. "São crianças em apartamento que ficam em frente a uma TV ou tablet, com chupeta na boca. Não tem como essa criança aprender a falar. Ela não está inserida em contexto social, em conversa, em diálogo. Não tem um adulto que está ali mostrando as coisas para ela e falando o nome das coisas", diz a fonoaudióloga.
Entenda melhor
A partir dos seis meses, o bebê balbucia bastante, faz contato visual e reage aos gracejos dos pais. Entre os nove e 12 meses, ele está na fase de lalação e fica fazendo sons duplicados de cvcv (c=consoante e v=vogal) como, "mamamama", "papapapapa" e "dadadada". "Por volta dos 12 meses inicia as primeiras palavrinhas, geralmente 'mamã' ou 'papa'. E, a partir de então, a criança começa a 'pegar o ritmo', chegando aos 18 meses com um vocabulário que inclui, em média, 30 palavras - mal pronunciadas e imprecisas, mas ainda assim estáveis e recheadas de sentido", explica Juliana Trentini.
Ao completar dois anos, a criança terá um vocabulário médio de 150 palavras e começará a formar frases simples, como "qué ága" (quero água) ou "dá bó" (dá bola). Inicia-se uma fase de fala telegráfica, em que o bebê seleciona os elementos mais importantes das sentenças e os seleciona para se expressar oralmente, ainda com palavras mal pronunciadas. Entre os dois e três anos a criança trabalha muito na construção dos processos motores de fala e suas transições. Com isto, as palavras vão ficando de melhor compreensão e as frases mais completas, já que ela se dedica a construir seus conhecimentos de gramática e a usá-los.
"Aos três anos, uma criança pode ser compreendida por um adulto fora de seu convívio sem 'tradução' dos pais e suas frases contém praticamente todos os elementos", diz ainda Juliana. Erros com pronomes e conjugação verbal e flexão ainda ocorrem e são não apenas esperados, como parte importante do processo de reflexão sobre a língua. Aos cinco anos, a criança conclui a aquisição de todos os fonemas da língua portuguesa, tem grande poder de comunicação, persuasão, inferência e consegue contar uma história ou um fato ocorrido com detalhes. O aprendizado, é claro, não para por aí. Mas basicamente este é o processo de aquisição da linguagem e desenvolvimento da fala trazido de maneira resumida e simplificada. O que fugir disso em cada etapa deve ser avaliado por um profissional.
A fonoaudióloga Christiane Benevides explica que nem todo atraso na fala tem ligação com transtornos do neurodesenvolvimento. O atraso na fala pode estar ligado a diversos fatores, além do autismo. "Algumas condições como problemas auditivos, apraxia da fala e o transtorno do desenvolvimento da linguagem (DEL) são bastante prevalentes quando o assunto é atraso na aquisição da fala", explica. Para a especialista, outros fatores também devem entrar na avaliação clínica, como estímulos não adequados, seja na escola ou em casa.