Com tantas possibilidades de pagamentos digitais - cartão, NFC (pagamento por aproximação), PIX - usar dinheiro físico parece, cada vez mais, uma possibilidade remota. E olha que essas tecnologias são apenas a superfície de um vasto oceano de possibilidades no mundo das transações online. Essas são para transações em real, moeda corrente no Brasil, mas há uma série de moedas virtuais, ou criptomoedas, que revelam uma maneira completamente alternativa de pagar, receber e investir.
A mais conhecida - e que também inaugurou o mundo das criptomoedas - é o bitcoin, que vive uma escalada no valor do câmbio. Para se ter uma ideia, ontem, a unidade do bitcon era negociada a US$ 58,8 mil, ou R$ 334,1 mil. Em 13 de março, atingiu um recorde de US$ 61,2 mil dólares (R$ 340,3 mil). Mas nem sempre foi assim. Em 2010, cada unidade valia menos de um centavo de dólar. Em fevereiro do ano seguinte, a moeda alcançou, pela primeira vez, a marca de US$ 1. Em junho de 2011, chegou a US$ 30, mas, no fim daquele ano, a unidade era negociada a US$ 2. Um investimento para quem tem coração forte.
Em 2013, a cotação da criptomoeda chegou a US$ 200 e, daí em diante, os valores foram se tornando cada vez mais superlativos - até chegar ao valor atual, que daria para comprar um bom apartamento em Rio Preto.
Essa disparada do bitcoin, especialmente do ano passado para cá, tem tudo a ver com a Covid-19. O advogado e economista Alessandro Azzoni explica que o bitcoin vem batendo recordes porque, diante da pandemia e do risco de as nações sofrerem déficits significativos, abalando a economia, com queda de PIB (Produto Interno Bruto), a moeda virtual se mostra uma alternativa de investimento por ser livre de qualquer interferência governamental.
"A criptomoeda tem sua quantidade, suas normativas e seu sistema de venda e compra. Então, muitos investidores usam como reserva de valor. Seria a mesma coisa que comprar ouro ou prata para garantir o seu valor monetário, se protegendo das incertezas que nós temos hoje na economia mundial, tendo em vista que todas as nações estão sendo atingidas por déficit na sua economia", explica o especialista, que é conselheiro do Sindicato das Sociedades de Fomento Mercantil Factoring do Estado de São Paulo (Sinfac/SP). "Você não pode se basear num dólar, numa libra, num euro, porque todas as economias ficam fragilizadas e todo mundo busca outra alternativa para pôr o seu recurso. O bitcoin se torna um atrativo porque ele é uma moeda cotada dentro de uma plataforma fechada, com oferta e demanda", completa.
A regra da oferta e demanda, como Azzoni citou, é o que determina o valor da unidade de bitcoin. Apesar de virtual, a moeda não é infinita. Pelo contrário, os códigos usados para sua criação limitam o bitcoin em aproximadamente 21 milhões de unidades. Assim, por se tratar de um recurso escasso, quanto maior a procura, maior o valor da moeda. E, como não há nenhum governo ou banco central que a controle, sua cotação varia conforme a demanda. "Se as economias mundiais começarem a se normalizar, pode ser que nós tenhamos um momento de queda dessas moedas, porque as pessoas vão começar a vender esses ativos", avalia o especialista.
Volatilidade
A volatilidade da criptomoeda também está sujeita a especulações. Exemplo disso foi a alta de 20% que a cotação sofreu, em janeiro deste ano, depois que o bilionário Elon Musk, dono da Tesla e da SpaceX, simplesmente mudou a descrição de seu perfil no Twitter para "#bitcoin". Antes, em dezembro, o empresário já havia provocado um aumento de 25% no valor da criptomoeda com um tweet: "Bitcoin é minha palavra secreta", escreveu. Declarações assim podem indicar uma intenção de compra milionária de moedas o que, por si só, já aumentaria o valor. Esta possibilidade atrai mais investidores e, assim, em função do aumento da procura, eleva-se ainda mais a cotação.
Mas, justamente por conta dessa volatilidade, o bitcoin divide opiniões de investidores. Recentemente, o Bank of America, um dos principais bancos de investimentos dos Estados Unidos, publicou em um relatório que o bitcoin é "excepcionalmente volátil" e "impraticável". Alguns especialistas falam em uma "bolha" - o que, no mercado financeiro, se refere a uma situação que a qualquer momento pode "estourar", causando prejuízos aos seus investidores.
"Por ser uma reserva de valor, o bitcoin acaba sendo uma moeda segura neste exato momento, porque ela independe de situações governamentais. É um ativo internacional, cotado internacionalmente, sem qualquer interferência. Então, ela se torna um atrativo interessante para guardar capital nesse momento de crise mundial. A bolha pode ser, nesse sentido, quando as economias começarem a se estabilizar e a ter resultados positivos no seu PIB", explica Azzoni. Segundo ele, quando o PIB mundial se tornar positivo e as economias começarem a apresentar resultados positivos, é possível que grande parte desses atuais investidores voltem para o mercado de ações, derivativos e até renda fixa.
O economista lembra que, no Brasil, crescimento do bitcoin se deu muito pelo fato da variável cambial, já que, no mercado, o bitcoin é cotado, principalmente, em dólar. "As pessoas que compraram no ano passado, quando o dólar estava em R$ 3,80, tiveram, além da valorização do bitcoin, a valorização cambial em cima. Então, elas tiveram um ganho duplo. Por isso que a procura se torna muito grande", explica.
Apesar disso, Azzoni aconselha a não analisar o que aconteceu no passado como se isso fosse replicado no futuro e exemplifica citando a Petrobras, cujas ações foram a R$ 6 quando estourou o escândalo de corrupção, e, atualmente, na casa dos R$ 20. "A pessoa que comprou a R$ 6 teve um ganho absurdo. Não significa que quem comprar agora, a R$ 20, terá também um ganho absurdo", conclui.