"As aventuras de Pinóquio" (Le avventure di Pinocchio), clássico da literatura infantil escrito pelo italiano Carlo Collodi (1826-1890) em 1883, está na lista daquelas obras que foram adaptadas à exaustão no cinema, no teatro e até na dança. Foram tantas adaptações que até parece que não há mais nada de novo que possa ser tirado desse conto que ensina às crianças a importância do trabalho, do estudo e de valores morais básicos, apesar de seu verniz um tanto conservador.
Eis que esse popular boneco de madeira que sonha em ser um garoto ressurge em 2021 por um viés, digamos, mais sombrio, que acentua a crueldade humana que também está presente na obra de Collodi, e que, de certa forma, exerceu influência na leitura feita por Walt Disney (1901-1966) na animação de 1940, que se desponta até hoje como a mais popular adaptação do cinema.
Concluído em 2019, "Pinóquio", do diretor italiano Matteo Garrone, chega aos cinemas de Rio Preto nesta quinta-feira, 21, depois de ter seu lançamento suspenso por conta da pandemia da covid-19. E o ano ainda será marcado pela adaptação que está sendo produzida pelo mexicano Guillermo del Toro para a Netflix, que, dado seu histórico em criar climas fantásticos e sombrios - vide "Labirinto do Fauno" (2006) -, também deve explorar essa pegada mais aterrorizante, embora a sua adaptação recorra à técnica do stop motion.
Com um visual extremamente realista, a live action de Garrone, que conta com a presença mais que brilhante do ator Roberto Benigni ("A Vida é Bela") no papel de Gepeto, explora uma perspectiva obscura do conto de fadas italiano. Entre tantas leituras possíveis, a que mais se encaixa a essa metáfora é a materialização do imaginário infantil diante das "ameaças" feitas pelos adultos - quantos já não ouviram, quando criança, algum adulto dizer que "se você não se comportar, papai do céu vai te castigar"? Ser ameaçado com o crescimento exagerado do nariz para não contar uma mentira é algo um tanto cruel para uma criança, e talvez justamente seja esse o diferencial da nova adaptação de "As aventuras de Pinóquio".
O filme é bastante fiel ao conto original, mas, como toda adaptação, valoriza determinados aspectos em detrimento de outros. O Grilo Falante, por exemplo, não é aquele fiel escudeiro que acompanha o boneco de madeira a toda parte. Mas todos os motes importantes da história estão lá, e o diretor italiano escolheu uma narrativa seriada, com episódios bem definidos, para contar a sua versão da história.
Mas uma coisa é certa, o "Pinóquio" de Garrone é, sem dúvida, a adaptação mais sombria, comovente e visualmente bela desse clássico conto de fadas italiano.