O escritor e poeta Guimarães Ortega, de Rio Preto, não conhecia profundamente o sobrinho, Thiago S. Ortega, quando o jovem partiu após lutar contra um câncer, em 2005, aos 23 anos de idade. No entanto, tornaram-se mais íntimos nos últimos 15 anos, período em que o tio mergulhou na obra literária do sobrinho para cumprir uma promessa feita em seus últimos dias de vida: a publicação de um livro de poemas. "Admirável Mundo Tosco" (THS Editora), cuja tiragem é voltada exclusivamente à família, eterniza a memória de Thiago de uma forma muito especial, resgatando poemas e prosas escritos por ele ao longo de sua juventude.
O livro traz poemas que traduzem a revolta e rebeldia típica da juventude. Integrante de uma banda de punk rock em Marília, Thiago se compadecia das desigualdades sociais do Brasil e recorria aos versos para aplacar as angústias e inquietações de um jovem que, assim como na letra de Cazuza, queria mudar o mundo. Ideias de uma mente que só se revelaram após sua morte, o que exigiu do tio um meticuloso trabalho de pesquisa e investigação.
"O meu sobrinho escrevia usando pseudônimos e heterônimos. Isso foi um dos aspectos que acabou atrasando a publicação do livro, pois eu precisa atestar a autoria daqueles poemas. Poderia ter sido escrito por um amigo ou amiga. Poderia ter sido escrito a quatro, oito mãos", conta. "Identifiquei seis nomes diferentes, além de seu próprio nome. Ele escrevia inclusive no feminino."
Por morar em cidades diferentes, Guimarães não convivia cotidianamente com o sobrinho. "Eu sabia que ele tinha o sonho de lançar um livro. Um dia, no hospital, eu disse a ele que faríamos o lançamento de seu livro depois que aquilo tudo passasse. Mas ele veio a falecer logo depois. Foi quando comecei a levantar seu material literário, em pastas, papeis e no computador", explica.
Hoje com 67 anos, o escritor e poeta vislumbrou sua própria juventude ao mergulhar nos escritos do sobrinho. "Eu já escrevia na idade em que ele estava quando partiu. Era também um jovem que queria mudar o mundo, mas, diferentemente dele, já entendia que essa mudança só poderia ser feita comigo fazendo parte desse mundo", reflete. "Eu fui um jovem rebelde, lutei contra a ditadura militar, apanhei da polícia, fui preso e, assim como meu sobrinho, também tive uma banda, participando de 17 festivais."
Agnóstico, Guimarães não acredita na vida após a morte, mas com "Admirável Mundo Tosco" reafirma a memória de um dos seus, contribuindo no fortalecimento de vínculos familiares e ajudando a aplacar a saudade daqueles que ainda ficaram após a partida do sobrinho.