Dos 115 pacientes com Covid-19 da região de Rio Preto que aguardam por um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), 73 estão em situação de urgência ou emergência. Ou seja, com alto risco de morte. Outros 42 pacientes que também estão esperando transferência via Central de Regulação e Oferta de Serviços de Saúde (Cross) estão em estado estável, mas com risco de complicações caso os leitos não apareçam.
"Esses pacientes possuem risco de intubação ou já estão intubados. Eles têm insuficiência respiratória grave por bronco-pneumonia causada pela Covid", explicou a médica no Hospital de Base e diretora da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), Suzana Lobo, sobre os pacientes classificados com maior gravidade que precisam de leitos de UTI.
O desespero atrás de uma vaga inclusive tem feito com que muitas famílias procurem ajuda na Justiça. O que não é garantido, já que o colapso no sistema de saúde acontece em todo o Estado e as vagas são ofertadas mediante disponibilidade. "Notamos que as pessoas não se revoltam com a falta do fornecimento do atendimento, muitas sabem da dificuldade que estamos passando, mas se revoltam com a falta de informação do estado de saúde do familiar", disse o defensor público Julio Tanone.
É o caso do porteiro Luiz Carlos Ribeiro, de 57 anos, que desde quarta-feira, 24, está desesperado junto com a esposa à espera por uma vaga de enfermaria para o filho Luiz Fernando Damasceno, 33 anos, que está internado com sintomas da Covid-19 na UBS do Estoril. "Como somos do grupo de risco, não podemos ir lá. Eu, por exemplo, sou hipertenso. Meu outro filho que está indo. Ficamos angustiados com essa dificuldade de leito e, principalmente, pela condição que ele está lá. Ficou em uma cadeira 24 horas. É desumano", disse o pai.
Até a tarde dessa sexta-feira, 26, Luiz ainda não havia conseguido um leito. Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde afirmou que vem utilizando de todos os meios materiais e de recursos humanos para garantir o atendimento a todos os pacientes que procuram suas unidades de atendimento.
A situação de espera se repete em outras cidades da região e, de forma mais grave, com pacientes morrendo. Foi o que aconteceu na última quinta-feira, 25, quando um idoso de 73 anos morreu no pronto-socorro de Cedral. "O paciente deu entrada na terça-feira e já inserimos na Cross. Dois dias depois, ele não resistiu. Ele teve uma parada cardiorrespiratória", contou a coordenadora de saúde de Cedral, Maria Silvia Zuin Scavazza.
Diante da falta de vagas, algumas prefeituras já estão utilizando a "vaga zero", recurso de situações extremamente graves. Ocorre quando o médico vai junto com o paciente na viatura do Samu esperar por uma vaga na porta do hospital.
Ao todo, segundo levantamento feito pelo Diário na região de Rio Preto, 58 pacientes já morreram à espera por uma vaga de UTI. As mortes aconteceram em: América de Campos, Bady Bassitt, Cedral, General Salgado, Ibirá, Irapuã, Itajobi, Jales, José Bonifácio, Magda, Meridiano, Mirassol, Monte Aprazível, Neves Paulista, Nhandeara, Nova Granada, Novais, Ouroeste, Parisi, Paulo de Faria, Pereira Barreto, Riolândia, Santa Adélia, Tabapuã, Ubarana, Urânia e Votuporanga.
"Estamos tendo muitos sepultamentos sem nenhum familiar. Situação que não estava acontecendo no ano passado. Isso porque o paciente morre com Covid-19 e os familiares estão com a doença, não podendo sair de casa ou do hospital para sepultar o ente. É muito triste", afirmou o gerente da funerária Rosa Mística de Jales, Carlos José Maschio.
Cross
Corrida contra o tempo, atenção e experiência médica. Esses são apenas alguns dos requisitos para médicos reguladores responsáveis pela distribuição de leitos nos hospitais públicos de São Paulo. Eles estão na linha de frente e ganharam repercussão no momento mais difícil da pandemia na País. São eles os responsáveis por tentar uma vaga de enfermaria e UTI nos hospitais para os 115 pacientes da região de Rio Preto que estão aguardando por vagas.
Funcionando 24 horas, de segunda a segunda, a central autoriza transferências quando um leito é liberado. Os médicos reguladores também acompanham a classificação da gravidade de cada paciente. O objetivo é fazer com que os casos mais graves sejam atendidos a tempo.
No Estado de São Paulo, o trabalho da Central de Regulação de Leitos começa quando o paciente chega ao pronto-socorro e o médico diagnostica que ele necessita de um leito. Automaticamente, um pedido é feito via Cross. Quando não há leito disponível, entra o trabalho das equipes médicas dos próprios prontos-socorros municipais, que improvisam atendimentos para manter os pacientes estáveis até um leito ser liberado pelo sistema. Em alguns casos, essa espera pode chegar a até cinco dias, como já ocorreu na região.
"A demanda de transferências para casos de Covid-19 registradas na Cross cresceu 117% em comparação ao pico da pandemia. Atualmente, são cerca de 1,5 mil pedidos por dia, contra 690 em junho de 2020, quando foi o auge da primeira onda. Já houve cerca de 190 mil regulações desde março do ano passado. Cerca de 35% das solicitações diárias referem-se a leitos de UTI", disse a Secretaria Estadual de Saúde (SES).
Sobre a morte de pacientes sem leitos, a SES disse que regulação e transferência dos pacientes dependem da condição clínica adequada para que o paciente seja deslocado com segurança até o hospital de destino. "O papel da Cross não é criar leitos, mas auxiliar na identificação de uma vaga no hospital mais próximo e apto a cuidar do caso. Nenhuma negativa parte deste serviço, que é apenas intermediário. Cada solicitação é avaliada por médicos reguladores, sendo crucial a atualização do quadro clínico", completou a Saúde Estadual.
Atualmente, a região tem 552 leitos de UTI, segundo sistema do governo Estado. Desse total, 518 estavam ocupados nesta sexta, o que representa taxa de ocupação de 93,3%.