Profissionais cansados, sobrecarregados, com medo e enfrentando há dez meses uma pandemia que vai durar, pelo menos, até o meio do ano, conforme as perspectivas mais otimistas em Rio Preto. Pesa na balança o fato de que, enquanto eles se isolam de familiares para não contaminá-los, vivem com medo e dobram plantões, parte da população age como se a pandemia não existisse e promove aglomerações e não segue as recomendações sanitárias, o que está fazendo os casos graves (que demandam hospitalização) e mortes subirem novamente em uma velocidade assustadora.
São alguns dos sentimentos de quem trabalha com saúde, alguns motivos pelos quais os hospitais estão tendo dificuldade para encontrar médicos, enfermeiros e técnicos para atuar na área de Covid-19. Isso ocorre nos setores público e privado e preocupa, já que o colapso do sistema de saúde não envolve apenas falta de vagas, mas também de insumos e, claro, de recursos humanos. Para driblar o problema, centros aumentaram salários, estão pagando plantões à vista e pedindo para funcionários ficarem mais horas.
Em Rio Preto, um a cada seis dos 18 mil profissionais que atuam em todas as redes de assistência foram contaminados pela Covid-19. No total, foram 3.171 deles que ficaram doentes - isso sem contar os que trabalham aqui, mas vivem em outros municípios e, portanto, as estatísticas de Covid-19 foram contabilizadas pelas cidades da região.
Jorge Fares, diretor-executivo da Funfarme, que administra o Hospital de Base e o Hospital da Criança e Maternidade (HCM), é uma das pessoas que atuaram na linha de frente desde o início. Contaminado no meio do ano passado, ele ficou 40 dias internado e chegou a ficar intubado na UTI. Já de volta ao trabalho e recuperado, relata que está encontrando dificuldade para contratar profissionais - desde o começo, cerca de mil profissionais atuaram na ala de Covid na instituição, que é referência de atendimento para 102 municípios.
A demanda por trabalho é em todos os setores, desde a emergência até a UTI. Estão sendo contratadas cerca de 80 pessoas de diferentes especialidades. "Estamos reativando tudo e algumas pessoas trabalharam demais e não querem mais atuar. Estão cansadas, deixaram a vida privada, querem voltar para a vida que tinham. Não querem manter mais um ano disso e eu acho que todos têm razão. É um negócio de risco, que coloca em risco ele, a família. Dá para fazer por um período, mas não o tempo todo", afirma Fares.
Para atrair mais médicos, os salários das alas de Covid na Funfarme foram reajustados em 25%. Fares acredita que vai conseguir fechar o quadro com o edital que está sendo lançado, mas, caso isso não aconteça, não descarta convocar os residentes que estão se formando na Famerp, porém espera não ter de fazer isso - já que o paciente com Covid é altamente complexo e demanda um atendimento especializado, de gente com experiência em UTI.
E não é só os profissionais de saúde que são necessários. A Funfarme está contratando cerca de 40 funcionários para atuar na lavanderia. Se antes eram lavados de 3 a 4 mil quilos de roupas por dia, agora essa quantidade saltou para pelo menos 10 mil quilos, com a necessidade de troca constante nas alas Covid. Um plantonista em seis horas chega a usar 40 aventais, por exemplo. Um dos maiores riscos de contaminação está justamente na hora de retirar o equipamento, por isso é preciso muito treinamento.
Na Santa Casa, o hospital público referência para os pacientes rio-pretenses, o problema é o mesmo. Segundo Nadim Cury, provedor da instituição, a dificuldade é encontrar recursos humanos para todos os setores. "Quando a Covid deu uma trégua, muita gente dispensou. Agora todos os hospitais estão contratando. A gente tem pedido para algumas pessoas da enfermagem e até médicos dobrarem o plantão. A gente tem conseguido fechar, mas num aperto daquele", relata ele, que precisaria contratar de 20 a 30 profissionais da enfermagem.
Embora não saiba o que as próximas semanas reservam, o médico está apreensivo, já que muitos dos pacientes que foram contaminados no fim do ano ainda vão desenvolver a doença de forma grave. Além disso, tem o fato de que os profissionais se contaminam. "Tem que afastar, começa a faltar mão de obra, não acha para repor."
Em nota, a Secretaria de Saúde de Rio Preto informou que existe há alguns meses a dificuldade na contratação de recursos humanos para os setores de coronavírus, tanto de médicos quanto de enfermeiros e técnicos, e que isso não é exclusividade de Rio Preto. "Quando foi necessário, a Secretaria reorganizou o serviço para intensificar os atendimentos às síndromes respiratórias e assim garantiu que a população não ficasse desassistida. Reafirmamos que o município está preparado para atender as demandas que devem chegar nos próximos dias", disse em nota.