Talvez você ainda não tenha se dado conta, mas emoções como a culpa, o egoísmo, a ganância, a inveja, a mentira, a raiva e a vaidade podem fazer tanto mal para a sua saúde quando a falta de exercícios físicos e os maus hábitos como fumar e estão diretamente ligados a doenças como diabetes e as cardiovasculares como o infarto e até mesmo o acidente vascular cerebral (AVC). Algumas virtudes, tem tentado provar a ciência, poderiam prevenir o adoecimento e adiar a data da nossa morte, entre elas o perdão, a gratidão e a tolerância.
No Brasil, 300 mil pessoas têm infarto todos os anos, sendo que em 30% dos casos o ataque cardíaco é fatal, segundo o Ministério da Saúde. Já a doença cerebral mata mais de 100 mil pessoas por ano no País.
A preocupação das autoridades da área de saúde de lidar com o assunto tem crescido. A Sociedade Brasileira de Cardiologia mantém o Grupo de Estudos em Espiritualidade e Medicina Cardiovascular (Gemca), "por uma questão de saúde, estamos usando a ciência para avaliar assuntos do ser humano com os quais as religiões se ocupam há milhares de anos - perdoar, ser paciente, fazer o bem", diz Álvaro Avezum, diretor de promoção e pesquisa da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) e vice-presidente do Gemca.
Só a Publimed, ferramenta de publicação de artigos médicos e base de dados da Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos, tem quase 10 mil citações sobre espiritualidade e adoecimento.
O Gemca é composto por 900 cardiologistas e tem por objetivo buscar informações científicas dentro da área de espiritualidade e cardiologia, disseminar informações no âmbito científico e conduzir pesquisas na área. "Avaliamos também o enfrentamento e as emoções que as pessoas usam no dia a dia para tentar entender o motivo do adoecimento da sociedade", explica Avezum.
Os médicos já sabem que estresse e depressão aumentam o risco de infarto e AVC. "O que tem surgido agora é que indivíduos que têm maior disposição ao perdão e que têm mais gratidão tendam a ter menor chance de ocorrência de doença cardiovascular", diz o especialista.
Esse tipo de emoção negativa e de sentimentos não edificantes se associam com uma maior descarga de adrenalina e de produção de cortisol e esses hormônios, quando liberados em situação de estresse ou raiva aumentam a frequência cardíaca, a pressão arterial, as chances de coagulação do sangue nas artérias e de arritmias cardíacas.
"Temos de confirmar o que estamos observando e os estudos são preliminares. Há ainda a necessidade de confirmar por meio de estudos bem conduzidos, mas o que podemos dizer na área de relacionamentos da pessoa entre ela mesma e com os outros é uma boa hipótese que vem sendo investigada", complementa o médico.
Há tempos se ouve dizer que as emoções influenciam a saúde, mas agora isso está sendo demonstrado pela ciência. "Já é possível mensurar esse impacto por meio de questionários validados internacionalmente", diz o cardiologista.
A forma como as emoções afetam a saúde também levou o médico Luiz Fernando Sella a escrever o livro "Os Sete Inimigos do Coração" (ed. Ritualli). A ideia é ajudar os seus pacientes a viverem mais e melhor, indo além do tratamento dos sintomas das doenças com os medicamentos tradicionais. Sella defende que todos os nossos estados mentais têm repercussão nos nossos processos fisiológicos, assim como a cura.
Os cientistas pretendem elucidar como esses sentimentos contribuem para prevenir doenças e favorecer a recuperação. Novas pesquisas procuram desvendar aspectos da subjetividade e se voltam para a área ignorada pela ciência durante séculos: o impacto da espiritualidade na saúde. Os achados têm sido tão contundentes que investir no bem-estar psicológico e na busca da paz interior desponta nos Estados Unidos como estratégia para reduzir em 20% a incidência de infartos e derrames até 2020.
Os especialistas querem dar um passo além, propondo formas inovadoras de intervenção assentadas na espiritualidade. Essa característica não é abordada como sinônimo de religião ou de religiosidade e, sim, um conjunto de sentimentos, pensamentos e atitudes que norteiam nossas reações no enfrentamento de situações cotidianas e no relacionamento com os outros e com nós mesmos.
Para o médico Luiz Cuschinir, coordenador do Gender Group do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, os profissionais estão aí para ajudar a olhar para isso. "Quando se aceita a espiritualidade como integrante desses processos, a base amorosa serve como a guia para todos outros parâmetros como honestidade, respeito, ética ou confiança. Isso tudo vai tratar esse mundo que ao mesmo tempo adoece mas também evolui para uma maior consciência para todos", diz.
O processo começa com a identificação do problema e a discriminação em saber onde está a doença. "Além do remédio ministrado depois do diagnóstico, abarcar e incluir a visão psicoespiritual dá a chance de integrar mais aspectos da doença, relacionando-a com o que está identificado com ela. O quanto somos a doença é um bom começo", diz.
Raiva- As pesquisas hoje mostram que as pessoas que têm dificuldade em expressar os sentimentos adoecem. Muitas pessoas que ficam engasgadas, entaladas com alguma situação e não conseguem colocar pra fora, seja para Deus, para um amigo, para um psicólogo, acabam adoecendo. Por que isso acontece? A raiva ativa dentro de nós um sistema de estresse que produz adrenalina, que produz o cortisol, esses hormônios associados ao estresse. E isso faz aumentar a pressão arterial, acelerar nossa frequência cardíaca e aumentar a produção de ácido no estômago, o que pode levar a uma gastrite.
Inveja- A inveja nasce da comparação. Você vê alguém que tem uma qualidade ou uma posse que você gostaria de ter e ao perceber que não tem aquilo, isso causa um sofrimento. A inveja é muito mais do que querer ter aquilo que é do outro, isso seria uma definição melhor para cobiça. É quando você quer que o outro perca aquilo que ele tem. Quando uma pessoa sente inveja, ela ativa no cérebro as mesmas áreas responsáveis por processar a sensação de dor.
Mentira- Quando a pessoa mente, ela produz alguns hormônios - embora em escala mais sutil do que na raiva - que fazem o coração e a respiração acelerarem. Também ocorre alteração na temperatura. Há, sim, uma produção de hormônios ligados ao estresse porque a pessoa sabe que está indo contra a própria consciência e tem um desconforto emocional.
Culpa- A culpa pode ter um impacto muito negativo na saúde. Isso é uma pré-disposição para o surgimento de uma depressão. A queda da autoestima e essa vergonha pessoal levam à tristeza, à depressão e ao isolamento social e também aos vícios e compulsões: álcool, cigarro, comida, jogo, sexo, compras e até mesmo trabalho.
Egoísmo- O egoísmo tem uma dinâmica diferente. O egoísta enxerga somente a si mesmo, crê que é o centro do universo, ele não consegue enxergar os outros e nada mais importa; quer ter vantagens, busca sempre uma satisfação unilateral. Como nunca faz nada para ninguém, acaba ficando sozinho e tem de enfrentar sozinho todos os seus problemas. A falta de amparo e apoio afeta negativamente a nossa saúde, principalmente quando enfrentamos problemas e estresse, uma dificuldade ou uma doença.
Ganância- O coração ganancioso nunca está satisfeito. O dinheiro não resolve o problema da ganância, porque ela é uma questão de coração. O bem material, a posse, o dinheiro e a riqueza acabam sendo o alvo da vida, o foco dos esforços. Então, tem uma raiz de egoísmo na ganância, de você querer para você e não querer para os outros. E o tratamento para essa doença chamada ganância é a generosidade, você descobrir o prazer de compartilhar.
Vaidade- Vaidade em latim é vanitas ou vanum, que significa vão, um espaço vazio, oco, sem consistência. Vaidade, na origem mais primitiva da palavra, é um vazio. Então, o vaidoso não necessariamente é a pessoa que quer aparecer, mas é aquele que está com um vazio existencial dentro do coração. E pode ser que a pessoa vaidosa, que está vazia, tenha a necessidade de aparecer. Porque como internamente ela está vazia, externamente ela busca um reconhecimento.
Fonte: Luiz Fernando Sella
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