Os ventos do Norte não movem moinhos, mas assobiam por entre as frestas tal e qual a imensidão da Floresta Amazônica, que não tem outro verbo senão impressionar.
A bordo de um hotel flutuante - uma maneira confortável, não menos emocionante -, é possível conhecer de perto o pulmão verde do Brasil, como faz a maior parte dos turistas durante as duas maiores festas da região: o Festival Folclórico de Parintins, na pequena ilha que lhe dá o nome, a 420km de Manaus (AM), e que acontece todos os anos no último fim de semana de junho; e o Círio de Nazaré, em Belém (PA), no segundo domingo de outubro.
Patrimônio Imaterial registrado pelo Iphan, o Círio mistura fé, tradição e dor. De acordo com a Secretaria de Turismo do Pará (Setur), o evento injeta R$ 92 milhões na economia local.
"O Círio é mágico, porque ali a Virgem de Nazaré é a senhora de todos os destinos. Encanta fiel, filósofo, ateu e comunista. Tudo isso em razão de um atributo que transcende: sua história. Não é religião, é fé", diz Fafá de Belém, que dirige o projeto Varanda de Nazaré, iniciativa que participa da divulgação do Círio de Nazaré.
Agito, boemia, carimbó e boa comida fazem de Belém a cidade mais desejada da região. Açaí, tacacá, Cerpa gelada e banho-de-cheiro, marés, rios, palafitas, canoas e ilhas, Dona Onete... Dá vontade de mergulhar com vontade no paraensismo.
Parintins
Além da Basílica Santuário, os fiéis visitam pontos prestigiosos de Belém, como o mercado Ver-o-Peso, e restaurantes como o Remanso do Bosque, do chef Thiago Castanho, incluído na lista dos 50 melhores da América Latina em 2016.
Na amazonense Parintins, por três noites, os bois Garantido (vermelho) e Caprichoso (azul) se enfrentam na arena do Bumbódromo num desafio de música (toadas), alegorias, lendas e ritos indígenas e dos demais povos que formam a região. Na arena, cabem 40 mil pessoas, 20 mil (cravados) de cada lado. Este ano, o Caprichoso levou a melhor e sagrou-se campeão.
O Festival Folclórico de Parintins bebe em uma rivalidade iniciada há quase cem anos, quando dois grandes grupos - os 'bois' - começaram a representar nas ruas o folclore do boi-bumbá, variação do bumba-meu-boi nordestino. Seja ele Garantido ou Caprichoso, o morador de Parintins tem em comum uma alma leve que passa por um eterno estado de brincadeira, que no Festival Folclórico é levada a sério. Todos têm a mesma alma, coabitam com a natureza e só se diferenciam quanto à difícil escolha entre Garantido e Caprichoso.
Há 52 anos, a festa dos bumbás, uma ópera a céu aberto no centro da Ilha Tupinambarana, com o auto do boi ressuscitado pelo pajé, acontece diante de uma multidão. A obra-prima do caboclo amazonense é vista por moradores e turistas. O investimento na festa, por parte do Estado do Amazonas, é de R$ 1 milhão em cada boi e de R$ 2 milhões no evento. São injetados cerca de R$ 60 milhões na economia da pequena cidade.
"É a festa do dois pra lá e dois pra cá. O ritmo do grito das galeras (torcidas) toma conta da alma do visitante, que se encanta pelo festival", diz o guia de turismo e parintinense de coração vermelho Inaldo Albuquerque.
Para a festa, turistas chegam a Parintins, em sua maioria, de barco. Por via fluvial, os 420km entre a capital amazonense e a ilha podem ser vencidos de sete a dez horas (no barco rápido) ou em 24 horas (nas 'gaiolas'). Nessas, cada um leva sua rede. A capacidade é para 537 pessoas, e o preço vai de R$ 160 a R$ 200 (três noites). O camarote para até três pessoas sai por R$ 2,5 mil. A volta demora mais, devido à corrente. Há voos de Manaus para Parintins (duração: uma hora).
Navegar pelo imenso Amazonas quer dizer silêncio absoluto e em companhia de animais perigosos, os donos do pedaço. Você vai cansar de ver jacaré com o topo da cabeça para fora da água. O pôr do sol é um espetáculo à parte, e o luar não fica atrás.
"A paisagem varia conforme a época do ano. De dezembro a maio, na cheia, os alagamentos permitem navegar perto das árvores, mais próximo dos pássaros", diz o capitão.
Nas lanchas rápidas, a viagem é mais curta, e a capacidade é para até 90 pessoas, mas não dá para pernoitar. A opção é se hospedar num barco hotel, atracado no Rio Amazonas, alguns com pensão completa e acomodações em suítes para duas pessoas.
Sabores da Amazônia
Num lugar onde o azul e o vermelho estão em disputa constante, a cor barrenta do Rio Amazonas é o que menos importa, a não ser pela diversidade de espécies de peixes que brotam dali para a mesa. E já ouviu falar no bodó? Assado na brasa ou na caldeirada de tucupi, o peixe é encontrado em restaurantes da ilha, em ruas e feiras a partir de R$ 4. O sabor é consistente, lembra carne de caça. O tucupi garante o agridoce, com ervas, chicória e alho para perfumar.
E em Parintins, o Mercado Municipal à beira do Amazonas é o local certo para experimentar o café regional, que não dispensa a tapioquinha e o X-caboquinho (pão recheado com tucumã e queijo coalho). Uma viagem que agrada a todos os sentidos.